ALESSANDRA ARAGÃO
Alessandra Aragão
Comunicadora, trabalha com desenvolvimento humano, atuando em terapia sistêmica, mentoria positiva e coaching de vida e carreira
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Frustração, paciência e escolhas: como aprender a lidar com o tempo?

Para lidar com o impulso da pressa, uma pergunta simples pode ser transformadora: isso é urgente ou é importante?

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Vivemos em uma sociedade que transformou o “agora” em palavra de ordem. Responder mensagens no mesmo minuto, resolver problemas na hora, decidir sem pausa. Essa pressa constante cria um estado de alerta contínuo que desgasta o corpo e confunde a mente, levando-nos a acreditar que tudo é urgente, quando, na verdade, poucas coisas realmente são.

Estudos em neurociência mostram que a exposição prolongada a esse estado de urgência continuamente libera a produção de cortisol, o hormônio do estresse. Segundo a American Psychological Association, níveis elevados de cortisol reduzem nossa clareza mental, prejudicam o sono e aumentam o risco de doenças cardíacas. Ou seja, viver em aceleração permanente tem um preço alto: adoecemos física e emocionalmente.


O senso de urgência não é apenas uma pressão externa; ele se instala internamente, como um hábito silencioso. Muitas vezes, não percebemos que esse ritmo acelerado nos afasta do que realmente importa. É como estar sempre correndo sem ter certeza para onde.


Em meu consultório, recebo pessoas que, ao se aproximarem de idades que costumo chamar de “cheias”, como 40, 50, 70 anos, dentre outras, entram em crise de senso de urgência existencial. Sentem-se em dívida com a vida, como se estivessem atrasadas, devendo algo a si mesmas ou ao mundo. Nesse processo, revisitam sua trajetória, mas com um olhar ansioso e punitivo. A lista do “a fazer” parece sempre maior que a do “já feito”, e o que foi conquistado soa insuficiente, sem real valor.


Esse movimento gera paralisia: em vez de traçar os próximos passos, muitos invalidam sua própria história, comparando-se a ideais inalcançáveis e se cobrando sem cessar. Poucos celebram conquistas ou reconhecem a própria história como valiosa. O que prevalece é a sensação de baixa autoestima, arrependimentos e auto cobrança constante. Nesse ponto, me lembro da frase do psicólogo canadense Jordan Peterson: “Compare-se com quem você foi ontem, não com quem os outros são hoje”.


Afinal, como cobrar de nós mesmos o que ainda não fizemos sem reconhecer o que já realizamos? Só é possível avaliar a rota depois de termos caminhado. A vida é feita de processos, de esperas, de silêncios que amadurecem. Nenhuma semente dá fruto no mesmo dia em que é plantada.


Pesquisas da Universidade de Stanford mostram que pessoas que cultivam a paciência e conseguem postergar recompensas tendem a ter níveis mais altos de satisfação e saúde mental ao longo da vida. Isso reforça que viver não é apenas correr, mas aprender a esperar o tempo certo das coisas.


O grande desafio é que o imediatismo é sedutor. O “agora” promete alívio, prazer e controle, mas quase sempre se revela passageiro. Já o que é construído com paciência, disciplina e persistência se sustenta no tempo. Em geral, como dizia o filósofo estoico Epicteto: “Nada de grandioso surge de repente”.


Nesse cenário, aprender a suportar a frustração se torna essencial. Vivemos em uma cultura que valoriza respostas rápidas, prazos curtos e resultados imediatos. Porém, é justamente a capacidade de lidar com o incômodo do tempo que abre caminho para conquistas mais profundas.


A clássica pesquisa de Walter Mischel, conhecida como o ‘Teste do Marshmallow’, comprovou isso. Crianças que adiaram a recompensa imediata de comer um doce em troca de algo maior apresentaram, anos mais tarde, melhor desempenho acadêmico, mais equilíbrio emocional e relações sociais mais saudáveis. A lição atravessa a vida adulta: suportar frustrações momentâneas fortalece a capacidade de realizar sonhos maiores.


Esse princípio se reflete no profissional que investe anos em estudo antes de colher reconhecimento, no casal que atravessa fases difíceis para manter uma relação sólida ou na pessoa que se dedica ao autocuidado mesmo sem resultados imediatos, mas que, no longo prazo, conquista saúde e equilíbrio.


Para lidar com o impulso da pressa, uma pergunta simples pode ser transformadora: isso é urgente ou é importante? A urgência costuma ter prazo curto e pouco impacto no futuro. Já a importância, muitas vezes silenciosa, constrói sentido e não cabe em cronômetros. Outra forma prática é perguntar: que importância isso terá amanhã? Daqui a uma semana? Um mês? Um ano? O que hoje parece inadiável pode revelar-se irrelevante com o distanciamento do tempo.


Confiar no tempo é também aceitar que há sementes que precisam repousar no solo antes de brotar. Quantas vezes abandonamos algo significativo apenas porque não suportamos esperar? Por achar que não há mais tempo? Ou por não acreditarmos que, pelo fato de ainda não termos feito, já não seríamos capazes? Quantas vezes deixamos de reconhecer o que já construímos porque estamos presos à cobrança do que ainda falta?


Muitas vezes, não é a vida que nos limita, mas a forma como a interpretamos. Entre a pressa de querer tudo agora e o peso de invalidar o que já vivemos, acabamos por nos afastar da nossa própria história.
No fim, o grande antídoto para o senso de urgência é o alinhamento com o que realmente importa. Às vezes, o que mais precisa de atenção não é a tarefa pendente, mas a nossa própria paz. É aprender a valorizar o que já foi trilhado, reconhecer o que já fizemos e confiar que o que ainda está em construção encontrará o tempo certo para acontecer.

Afinal, viver não é correr contra o tempo, mas caminhar com ele, com paciência, confiança e consciência de que nossa história já tem muito valor.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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