
Amigo pipa ou amigo tatu? A essência de suas relações
"Se você percebe que está rodeado por amizades que te adoecem, saiba que é possível agradecer o passado, honrar o que houve e ainda assim escolher seguir outro
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Com quem você tem dividido sua vida? Essa pergunta, aparentemente simples, tem um poder transformador quando olhamos com honestidade para as nossas relações. Como terapeuta e mentora de vida e carreira, costumo utilizar uma metáfora simples para iniciar uma reflexão: você tem convivido com amigos pipa ou amigos tatu?
O amigo pipa é aquele que te eleva. Ele reconhece seu potencial mesmo quando você esquece. Vibra com suas conquistas, mas também te dá suporte nos dias difíceis. Não compete, não sabota, não menospreza. Te vê com verdade, mas sem julgamento. São esses amigos que nos lembram quem somos, que nos inspiram a crescer e que celebram conosco, não por conveniência, mas por conexão.
Já o amigo tatu... você provavelmente já conviveu com algum. São aquelas amizades que puxam para baixo. Nem sempre por maldade, às vezes por dor, medo ou carências não resolvidas. São relações que nos drenam, nos limitam ou nos aprisionam em padrões antigos de nós mesmos. Amizades que operam na lógica da comparação, da crítica, do controle, da dependência. Que parecem torcer por nós, mas se ressentem quando florescemos.
Essas metáforas são apenas imagens para te convidar a pensar: quem são as pessoas que mais convivem com você hoje? Elas te ajudam a voar ou te puxam para o fundo?
O empresário Jim Rohn afirma: “Você é a média das cinco pessoas com quem mais convive.” Isso não significa que somos apenas reflexo do outro, mas que somos profundamente influenciados pelos vínculos que cultivamos. A neurociência relacional também confirma esse impacto. Pesquisadores como Nicholas Christakis e James Fowler, por exemplo, realizaram estudos extensos, apresentados no livro Connected, que mostram como fenômenos como a felicidade, a obesidade e até o abandono do tabagismo podem se “espalhar” por meio das conexões sociais. Eles observaram que essa influência pode se estender por até três graus de separação, ou seja, os amigos dos amigos dos nossos amigos.
O convívio frequente com pessoas negativas, críticas ou emocionalmente instáveis pode aumentar nossos níveis de estresse e ansiedade, impactando diretamente nossa saúde física e emocional. Por outro lado, relacionamentos saudáveis ativam o sistema de recompensa do cérebro, aumentam a produção de oxitocina, o chamado “hormônio do vínculo”, e estão associados a maior resiliência, bem-estar e autorrealização.
Um estudo de Harvard, iniciado em 1938 e ainda em andamento, acompanhou centenas de pessoas ao longo de suas vidas e revelou um dado poderoso: a qualidade dos nossos relacionamentos é o maior fator preditivo de felicidade e longevidade. Mais do que sucesso, dinheiro ou status. Ou seja: as relações que cultivamos não são apenas parte do caminho, elas moldam o caminho.
Como terapeuta sistêmica, vejo diariamente como laços tóxicos ou negligenciados afetam a autoestima, a motivação e até as escolhas profissionais das pessoas. Muitas vezes, nos mantemos em relações por lealdade ao passado, por medo de ficarmos sós ou pelo conforto de não nos confrontarmos com o crescimento. Mas crescer, muitas vezes, exige rever vínculos. E isso não significa cortar tudo, mas ressignificar, colocar limites, escolher a distância saudável ou, em alguns casos, encerrar relações.
É importante compreender que vínculos saudáveis não significam pessoas perfeitas. Significam pessoas que te respeitam, te inspiram, te acolhem, e também te confrontam com amor, quando necessário. Relações verdadeiras não te prendem. Te expandem. Pare por um momento hoje e se pergunte:
• Quem são as pessoas que mais influenciam meus pensamentos e decisões?
• Eu me sinto mais leve ou mais pesado depois de estar com elas?
• Tenho espaço para crescer nessas relações ou me sinto encolhendo para caber?
• Estou rodeado de pessoas que celebram minhas conquistas ou que competem com elas?
• Que tipo de amigo(a) eu tenho sido para os outros? Sou pipa ou sou tatu?
Relações saudáveis são um solo fértil onde sonhos germinam, ideias florescem e feridas cicatrizam. Já relações desgastadas ou disfuncionais podem nos manter presos em um terreno árido de escassez emocional. E ninguém floresce em solo seco.
É claro que, ao longo da vida, nossos vínculos vão se transformando. Amizades se reconfiguram, algumas se perdem, outras se ganham, e há aquelas que se fortalecem. O que não muda é a necessidade de estarmos atentos à qualidade dessas conexões. Assim como escolhemos com cuidado o que colocamos no nosso corpo, é preciso zelar por quem permitimos habitar nosso mundo interior.
Se você percebe que está rodeado por amizades que te adoecem, saiba que é possível agradecer o passado, honrar o que houve e ainda assim escolher seguir outro caminho. Não por egoísmo, mas por responsabilidade com sua saúde emocional e com seu processo de crescimento. Às vezes, o que mais precisamos para voar mais alto não é um novo plano. É uma nova companhia.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.