Inteligência artificial vai escrever 90% dos códigos até 2030
Estudo do GitHub mostra que IA aumenta produtividade e satisfação de desenvolvedores no Brasil e no mundo
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Siga noA programação caminha para sua maior reinvenção e, até 2030, 90% do código poderá ser escrito por inteligência artificial, segundo o GitHub. Essa mudança, no entanto, não significa substituir profissionais, mas redefinir a forma como eles trabalham e se relacionam com a tecnologia.
Em entrevista exclusiva ao podcast de tecnologia Glitch Clube, do Estado de Minas, Martin Woodward, vice-presidente de Relações com Desenvolvedores do GitHub, afirma que o impacto já é visível. Ferramentas como o Copilot vêm transformando o cotidiano dos programadores ao assumir tarefas burocráticas, repetitivas e administrativas, abrindo espaço para que os profissionais concentrem energia em atividades criativas e estratégicas. “Eles passam menos tempo em burocracias, em tarefas repetitivas e administrativas, e mais tempo está sendo investido em desenvolver suas habilidades, ser mais criativos, criar novos recursos e revisar código”, explica.
O estudo realizado pelo GitHub indica que a tendência é clara: nos próximos cinco anos, a integração entre programadores e agentes de IA será cada vez mais complexa, abrangendo todas as etapas do ciclo de vida do desenvolvimento de software. E esse movimento já repercute na motivação da categoria. Mesmo diante do ceticismo inicial, muitos desenvolvedores relatam maior satisfação no trabalho e sensação de produtividade ampliada.
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Educação de programadores evolui
A inteligência artificial também está mudando a forma como novos talentos aprendem programação. Antes, o domínio do inglês era considerado um pré-requisito para atuar em escala global. Hoje, a barreira linguística começa a desaparecer.
Com o Copilot, qualquer estudante pode selecionar um trecho de código e receber explicações detalhadas em português, ampliando o acesso ao conhecimento. “Como uma criança aprendendo a programar, eu teria adorado isso. Eu poderia aprender, ir fundo e entender código antes mesmo de ter que aprender uma língua estrangeira”, diz Woodward.
Atualmente, mais de 180 mil estudantes brasileiros utilizam gratuitamente o GitHub Copilot, em uma versão especialmente desenhada para alunos e professores. A medida reforça o caráter democrático da ferramenta, permitindo que jovens tenham contato com conceitos avançados de programação sem a necessidade imediata de intermediários técnicos ou de fluência em inglês.
Ainda assim, Woodward alerta para a importância de uma base sólida em ciência da computação. Para ele, a IA deve ser encarada como ferramenta de apoio, assim como a calculadora no ensino de matemática. A compreensão da sintaxe, da lógica de programação e do funcionamento dos sistemas continua essencial para que os futuros profissionais desenvolvam também habilidades socioemocionais, como pensamento crítico, criatividade e resolução de problemas.
Empresas aceleram com IA
Se no ensino a IA já é uma revolução, no mundo corporativo ela redefine práticas consolidadas. Organizações em diferentes setores começam a redesenhar seus fluxos de trabalho para integrar a inteligência artificial como parte estratégica do desenvolvimento de software.
No Brasil, o Grupo Boticário é um exemplo. A companhia utiliza o Copilot para acelerar tarefas como escrita, documentação, explicação e correção de código. O resultado é visível: implantações mais rápidas, menor acúmulo de “dívida técnica” e equipes com mais tempo para pensar em soluções inovadoras.
Dados da pesquisa do GitHub reforçam essa percepção: 94% dos desenvolvedores relatam se sentir mais produtivos ao trabalhar com IA, e 90% afirmam gastar menos tempo em tarefas repetitivas. Mas, para Woodward, não basta apenas adotar a tecnologia. É preciso incentivar o uso responsável e estabelecer políticas organizacionais que definam como a IA será aplicada, quais modelos são adequados e como garantir a proteção de dados sensíveis.
“Esse cuidado cria um ecossistema mais ágil e criativo, alinhado às expectativas dos clientes e capaz de entregar valor com mais rapidez”, afirma.
Novos talentos ganham espaço
Uma das principais dúvidas sobre o avanço da IA é se haverá espaço para quem está começando na carreira. Woodward garante que sim. Para ele, a tecnologia não reduz vagas de entrada, mas acelera o processo de aprendizado e torna os iniciantes mais estratégicos desde o primeiro dia.
“O medo em torno da substituição de cargos juniores não está se confirmando, nem nos dados nem na prática”, afirma. “Os recém-chegados estão em uma posição privilegiada, porque entram em um mercado já compreendendo como usar ferramentas de IA.”
Na prática, esses jovens profissionais encontram um ambiente em que códigos são frequentemente herdados de outras pessoas ou gerados por sistemas automáticos. Isso exige habilidades de leitura, análise crítica e correção, além de capacidade de criar novas funcionalidades em estruturas já existentes.
Com isso, muda também o peso das competências exigidas. Se antes dominar uma linguagem ou framework específico era o mais relevante, hoje o destaque recai sobre habilidades de comunicação, resolução de problemas complexos, liderança e trabalho em equipe. A curiosidade e a disposição para aprender novas ferramentas se tornam diferenciais.
Democratização da programação
Para Woodward, a missão da plataforma é clara: capacitar até um bilhão de pessoas a aprender a programar. Ele afirma que isso rompe a bolha do desenvolvimento tradicional e cria espaço para novos talentos.
Essa democratização acontece com iniciativas como o GitHub Copilot, ferramenta que já é gratuita para estudantes e professores. No Brasil, mais de 180 mil estudantes utilizam a plataforma, que explica código em português e auxilia na implementação de soluções.
O país é um dos exemplos mais fortes desse potencial. São mais de 6 milhões de desenvolvedores no GitHub e cerca de 290 mil organizações ativas na plataforma. Woodward destaca: “O Brasil é cheio de pessoas inteligentes, empreendedoras, com bons sistemas de ensino e uma população diversa. Isso fortalece toda a indústria.”
Segundo o executivo, programar é antes de tudo um ato criativo. E é nesse ponto que os humanos se destacam sobre as máquinas. A IA não substitui profissionais, mas muda como problemas são descritos e solucionados. Ter clareza sobre restrições técnicas e objetivos de negócio torna-se tão importante quanto dominar linguagens de programação. Woodward reforça: “Para obter os melhores resultados com a IA, é essencial ter uma descrição clara e precisa do problema que se deseja resolver.”
Essa combinação entre habilidades humanas e inteligência artificial aumenta a produtividade e cria oportunidades inéditas. A programação deixa de ser apenas técnica e se torna uma prática mais criativa, colaborativa e inclusiva. O impacto é profundo: mais pessoas podem aprender, contribuir e inovar, mesmo sem fluência em inglês.
Ética e segurança em IA
Com a adoção crescente da IA no desenvolvimento de software, surgem novos desafios relacionados à ética e à proteção de dados. Woodward destaca que não basta apenas implementar ferramentas: é preciso definir políticas claras sobre como elas serão utilizadas, quais modelos são apropriados e como garantir a confidencialidade de informações sensíveis.
“O uso responsável da IA cria um ecossistema mais seguro e confiável, capaz de entregar valor com mais rapidez sem comprometer dados de clientes ou de empresas”, explica.
Além disso, programadores precisam desenvolver uma consciência crítica sobre os limites da tecnologia, reconhecendo vieses nos algoritmos e prevenindo decisões automatizadas que possam gerar impactos negativos. A combinação de habilidades técnicas com senso ético será um diferencial estratégico para os profissionais da próxima década.
IA impulsiona produtos e serviços
A inteligência artificial não transforma apenas a rotina de quem programa: ela também acelera a criação de produtos e serviços mais inteligentes. Empresas que integram IA aos fluxos de desenvolvimento conseguem testar ideias com mais rapidez, reduzir erros e antecipar soluções que atendam às necessidades dos clientes de forma personalizada.
Segundo Woodward, o Brasil se destaca nesse cenário por sua diversidade de talentos e pelo crescimento de desenvolvedores engajados com novas tecnologias. “A IA permite que ideias que antes levariam meses para serem implementadas agora ganhem vida em semanas. Isso transforma o mercado, abre espaço para prototipagem rápida e fortalece a competitividade das empresas”, afirma.
Com a colaboração entre humanos e máquinas, a inovação deixa de ser um processo exclusivo de especialistas e se torna uma prática mais acessível e ágil, aproximando o desenvolvimento de software da solução real de problemas do dia a dia das pessoas.
Programação se reinventa
Diante de todas essas mudanças, uma coisa é certa: a programação está se reinventando completamente. Ela deixa de ser um trabalho focado apenas em escrever código e se torna uma área mais estratégica, onde habilidades como pensar de forma crítica, colaborar com outras pessoas e usar a criatividade para resolver problemas são cada vez mais importantes.
Nesse cenário, Woodward destaca a necessidade de equilibrar o uso da tecnologia com a responsabilidade. "Manter uma base sólida de conhecimento em ciência da computação é fundamental", diz ele. "Assim como saber matemática é essencial para usar uma calculadora da maneira certa, entender os fundamentos da programação é necessário para usar a IA de forma eficiente e responsável. O importante é dominar a ferramenta, e não depender totalmente dela."
Sobre a democratização do acesso à programação, Woodward acredita que a IA traz mais oportunidades do que ameaças. "Queremos que um bilhão de pessoas aprendam a programar. Estamos quebrando as barreiras do desenvolvimento tradicional", afirma. Ele explica que "programar é, acima de tudo, um ato criativo, e é nisso que os humanos se destacam. A inteligência artificial exige que os profissionais tenham ainda mais clareza na hora de definir um problema, suas limitações e objetivos, habilidades que são marcas de um bom engenheiro."
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Por isso, em vez de reduzir a importância do programador, a IA amplia seu valor. O profissional ganha um papel central em um ambiente de inovação, onde sua capacidade de organizar soluções, conectar diferentes sistemas e garantir a segurança e a qualidade do que é produzido em parceria com a IA se torna indispensável. A colaboração entre pessoas e máquinas é, assim, o grande motor da evolução no desenvolvimento de software para os próximos anos.