Conheça as principais dores que afetam nove em cada dez brasileiros
92% dos brasileiros sofrem com dor, segundo pesquisa global. Dois em cada três pacientes com dor relatam ser menos sociáveis quando estão com dor
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Siga noLidar com a dor parece uma tarefa difícil. E, no Brasil, 92% da população sofreu com algum tipo de dor no último ano, segundo o Haleon Pain Index, pesquisa global feita pela farmacêutica Haleon. A dor de cabeça e a dor muscular são as que têm maior prevalência. Dores na articulação, ligamento do tendão, no estômago e enxaqueca também estão na lista.
“A dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a um dano real ou potencial aos tecidos, ou descrita em termos de tal dano. Essa definição vem da Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP), e é importante porque mostra que a dor não é apenas física (sensorial), mas também emocional. Ela não depende exclusivamente de uma lesão visível, mas pode existir mesmo sem um dano detectável no corpo. Além disso, ela é subjetiva, ou seja, depende da percepção e da interpretação de cada pessoa”, explica o médico ortopedista, especialista em intervenção em dor (Hospital Albert Einstein) e em medicina intervencionista em dor (Faculdade de Medicina da USP), Fernando Jorge.
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O médico explica que o corpo tem mecanismos fisiológicos que comunicam a dor ao cérebro – e então o paciente sente dor. “Vamos imaginar que o paciente tenha uma lesão no pé. Primeiro, as células receptoras chamadas nociceptores (em terminações nervosas livres) detectam estímulos lesivos (mecânicos, térmicos ou químicos). O estímulo é transformado em um sinal elétrico (potencial de ação). Em um segundo momento, ocorre a transmissão desse sinal de dor, que percorre os nervos periféricos até a medula espinal. Na medula (corno dorsal), ocorre uma sinapse (local de contato entre os neurônios onde ocorre a transmissão do impulso nervoso) com o neurônio de segunda ordem. Esse sinal chega ao tálamo e, depois, ao córtex somatossensorial. É nesse momento, então, que ocorre a percepção. O cérebro interpreta esse sinal como ‘dor no pé’ e outras áreas também são ativadas: sistema límbico (emoções), córtex pré-frontal (atenção, significado), hipotálamo (resposta autonômica). E, depois disso, ocorre a modulação, momento em que o cérebro pode inibir ou amplificar esse sinal por vias descendentes (ex: liberação de endorfinas, serotonina, noradrenalina). Isso explica por que fatores emocionais ou contextuais (como medo ou distração) afetam a intensidade da dor”, explica Fernando.
O grande problema é que, segundo a pesquisa, quase dois em cada três (65% dos brasileiros) se dizem menos sociáveis quando estão com dor e 63% dizem que se afastam de situações sociais quando estão com dor. “Além disso, 29% experimentam solidão grave quando estão com dor. Isso reforça que os sintomas de dor aguda ou crônica podem afetar a qualidade de vida”, diz o médico ortopedista.
No topo da lista está a dor de cabeça, mas a enxaqueca (muitas vezes encarada como um sinônimo) aparece em oitavo. Segundo o neurologista Tiago de Paula, especialista em cefaleia pela Escola Paulista de Medicina (EPM/UNIFESP), membro da International Headache Society (IHS) e da Sociedade Brasileira de Cefaleia (SBC), dores de cabeça são sintomas e são muito frequentes na população, mas a enxaqueca é uma doença, que entre os seus sintomas está a dor de cabeça.
“A enxaqueca é uma doença neurológica do cérebro e de origem genética, no qual o paciente tem um cérebro hiperexcitado e apresenta vários sintomas neurológicos e no corpo. Além da dor forte, o paciente com enxaqueca pode ter fotofobia, fonofobia, osmofobia, que é quando, respectivamente a luz incomoda, o barulho e o cheiro incomodam. Pode ter sintomas de tontura e outros sintomas. Já a dor de cabeça é um sintoma. Ela pode acontecer em diversas situações. Por exemplo, um quadro infeccioso, após uma infecção viral, bacteriana. Ou ter dor de cabeça porque bateu a cabeça em algum lugar. Ou porque trabalhou em excesso e não dormiu direito”, diferencia o neurologista.
“Mas é preciso entender que dor é sinal de alarme. Então se o paciente está tendo dor com frequência é porque uma parte do corpo está em sofrimento. E se essa parte é a cabeça, o paciente precisa de tratamento. Não é normal sentir dor”, acrescenta Tiago de Paula.
Outro tipo é a dor muscular. “A dor muscular (ou mialgia) é uma dor localizada ou difusa que afeta os músculos, geralmente relacionada a esforço físico, trauma, infecção, inflamação ou disfunção metabólica. Ela pode ser aguda ou crônica, e estar associada a processos fisiológicos normais (como após o exercício) ou a condições patológicas”, diz Fernando.
Um dos grandes vilões para esse tipo de dor é a inatividade. “O sedentarismo aumenta significativamente o risco de dor muscular por uma combinação de fatores fisiológicos, mecânicos e até emocionais. Quando o corpo permanece inativo por longos períodos, os músculos deixam de receber os estímulos necessários para manter sua força, elasticidade e resistência. Isso leva à atrofia muscular, um processo de enfraquecimento que torna o sistema musculoesquelético menos eficiente e mais vulnerável a sobrecargas, mesmo em atividades simples do dia a dia. Além disso, o hábito de passar horas sentado, especialmente em posições inadequadas, favorece o aparecimento de contraturas musculares, que são tensões localizadas e sustentadas, geralmente associadas à má postura e à imobilidade. Essas contraturas podem gerar dor persistente, especialmente em regiões como pescoço, ombros e lombar, que são as mais afetadas por posturas estáticas”, comenta Fernando.
Mas os médicos fazem um alerta: nada de se automedicar. Isso pode ser desastroso na verdade. “Pacientes com condições dolorosas crônicas, como a osteoartrite, muitas vezes acabam usando medicamentos de venda livre como paracetamol e anti-inflamatórios para alívio dos sintomas, o que é duplamente perigoso já que adia a visita ao médico para o real tratamento e, também, porque o uso repetido desses medicamentos causa complicações renais e cardiovasculares”, esclarece Fernando Jorge.
O uso de analgésicos também não é ideal para a enxaqueca, pois está ligado à cronificação da doença. “O uso excessivo de medicações é o cronificador mais frequente, responsável por alterar a resposta dos receptores de dor no cérebro e gerar um ciclo de dependência e piora progressiva da condição, causando um efeito rebote”, explica Tiago de Paula.
“Esse efeito funciona dessa forma: a pessoa toma a medicação para a crise, tem um alivio momentâneo, pouco tempo depois, a dor volta (reaparece mais cedo e com mais frequência) e ela toma outro comprimido e, quando percebe, já está tomando comprimido quase todos os dias. O paciente toma remédio para dor achando que está tratando a enxaqueca, mas o uso contínuo dela faz com que os receptores fiquem ‘menos sensíveis’ e, com o tempo, o cérebro precisa de doses maiores para obter o mesmo efeito, aumentando assim a quantidade de remédios consumidos e a frequência das crises.O acompanhamento multidisciplinar, com neurologistas, psicólogos e nutricionistas, traz excelentes resultados”, reforça o neurologista.
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