Mulher que bateu boca e ameaçou deputada na ALMG é assessora de vereador
Assessora de vereador Pedro Patrus (PT) e militante dos direitos humanos, Dona Tereza reagiu ao discurso antiaborto de Chiara Biondini (PP)
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Siga noO episódio de bate-boca e ameaça envolvendo a deputada estadual Chiara Biondini (PP) durante uma reunião da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), ganhou novos desdobramentos nesta quarta-feira (28/5). A mulher que confrontou a parlamentar foi identificada como Dona Tereza, assessora do vereador de Belo Horizonte Pedro Patrus (PT).
A confusão ocorreu na tarde de terça-feira (27/5), durante uma audiência pública que discutia dignidade e saúde menstrual. Na ocasião, Chiara usou seu tempo de fala, autorizado pela presidente da comissão, Ana Paula Siqueira (Rede), para discursar contra o aborto e defender uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em tramitação na Casa. De autoria do deputado Bruno Engler (PL), a proposta busca incluir na Constituição Estadual dispositivos que garantem ao nascituro direitos como "à vida, à honra e até à possibilidade de ouvir seus próprios batimentos cardíacos pela mãe".
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O discurso de Chiara gerou revolta em Dona Tereza, que acompanhava a audiência e é militante dos direitos humanos e das mulheres. Segundo relato da deputada, a assessora a interrompeu, fez ameaças e xingamentos e chegou a dizer que “se você entrar aqui, eu vou te dar um tapa na cara”. A parlamentar acionou a segurança da Casa e o episódio virou assunto nos corredores da Assembleia.
Procurado pelo Estado de Minas, o gabinete do vereador Pedro Patrus se manifestou em nota, na qual contextualiza a trajetória de Dona Tereza e defende sua reação como legítima diante do que classificou como um discurso que desconsiderava a realidade das mulheres negras e periféricas.
Confira a íntegra da nota do gabinete de Pedro Patrus:
“Na tarde de ontem, durante a audiência pública sobre dignidade menstrual realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, houve um desentendimento entre a deputada estadual Chiara Biondini e Dona Tereza, assessora do nosso mandato.
Dona Tereza, mulher negra de 65 anos, é uma referência na luta pelos direitos das mulheres, contra o encarceramento em massa e pela juventude negra periférica. Ela se sentiu profundamente ofendida pela fala da deputada, que fugia ao escopo da audiência e desconsiderava a realidade vivida por muitas mulheres negras no Brasil, além de ignorar o debate público atual sobre a saúde reprodutiva das mulheres. Diante de todo o repertório de Dona Tereza junto a mulheres que enfrentam a dura realidade do encarceramento, da falta de oportunidades e da violência cotidiana, o pronunciamento da deputada surtiu uma grande revolta.
Tereza pediu a palavra, mas não pôde se pronunciar. Após esse momento, a deputada fez questão de provocá-la com escárnio antes de deixar o espaço. A reação enérgica de Dona Tereza foi uma expressão legítima de quem há décadas luta para ser ouvida. Seu ímpeto, no momento, foi o de se posicionar de maneira firme contra uma retórica conservadora que mina os direitos da população mais vulnerável. Sua reação pode ser lida como um esgotamento frente a um discurso que insiste em excluir a realidade das mulheres negras e periféricas em decisões que impactam diretamente suas vidas.
Mulheres negras são constantemente silenciadas e violentadas tanto simbólica como fisicamente. A reação a essas opressões diárias é confundida com violência, quando sabemos que muitas dessas mulheres enfrentam a exaustão frente a tantos ataques que desconsideram as desigualdades sociais, de gênero e de raça. Lamentamos o ocorrido, mas reafirmamos que garantir voz a quem historicamente foi marginalizado é uma prioridade do nosso mandato.
O nosso compromisso é sempre com o diálogo e, sobretudo, com a escuta das pessoas que quase nunca têm vez nos espaços de poder.”
Também em conversa com o EM, a deputada Chiara Biondini afirmou que não se sente intimidada após o episódio. “Eu estava usando meu tempo de fala, autorizado pela presidente da comissão, para tratar da pauta mais cara do meu mandato, que é a defesa da vida desde a fecundação. Isso não me amedronta nem me constrange. Só reafirma que eu seguirei firme naquilo que acredito”, declarou.
A presidente da comissão, deputada Ana Paula Siqueira (Rede), se manifestou sobre o episódio, classificando o ocorrido como lamentável e destacando que o parlamento deve ser espaço para o embate de ideias, e não de agressões pessoais.
Veja a nota da deputada Ana Paula Siqueira na íntegra:
“Na tarde de hoje, enquanto presidia a audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher sobre dignidade e saúde menstrual, ocorreu no corredor externo um tumulto ocasionado pelo enfrentamento entre uma manifestante e a deputada Chiara Biondini. Por ocasião deste episódio, suspendi a sessão e acompanhei o desenrolar dos acontecimentos.
O relato do incidente foi encaminhado internamente e as medidas cabíveis foram tomadas. O parlamento é ambiente de permanente disputa de pontos de vista e posições ideológicas, mas a discussão das ideias nunca deveria caminhar para enfrentamentos entre pessoas.
Lamentamos o ocorrido e continuamos atuando para que a promoção das políticas públicas em favor das mulheres continue a avançar na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.”
A repercussão chegou também à presidência da ALMG. O presidente da Casa, deputado Tadeu Martins Leite (MDB), afirmou que está acompanhando o caso e que tomará as providências cabíveis para garantir o livre exercício do mandato parlamentar, independentemente da linha ideológica.
“Sobre o episódio de violência contra a deputada Chiara, desde ontem a presidência da Assembleia Legislativa de Minas Gerais está levantando informações e tomará as providências necessárias. É preciso deixar claro que, como sempre aconteceu em nossa gestão, todas as deputadas e deputados devem ter pleno direito à informação e à livre expressão. Não aceitaremos que ninguém, independente da linha ideológica, tente oprimir parlamentares dentro dessa Casa no dia a dia do seu trabalho em defesa do povo mineiro.”
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O episódio ocorre em meio a uma crescente polarização nos debates da Assembleia, especialmente em pautas que envolvem costumes, direitos reprodutivos e saúde da mulher. A PEC defendida pela deputada Chiara e de autoria de Bruno Engler causou também desconforto na tarde de ontem.