O legado do desembargador José Fernandes Filho
Homem público ímpar e magistrado exemplar, Fernandes Filho influenciou gerações de profissionais do direito
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De: RODRIGO LOTT MONT’ALVERNE - Assessor técnico especializado da Presidência do TJMG
Nascido em Bambuí, no dia 31 de outubro de 1929, José Fernandes Filho mudou-se cedo para Divinópolis, aos 11 anos, tendo ali exercido a função de faxineiro para poder estudar no ginásio local e, após muita dedicação ao trabalho, alcançado o cargo de chefe de disciplina daquele educandário, ainda aos quinze anos de idade.
A partir dos 15 anos, já em Belo Horizonte, cursou o ensino médio no Colégio Estadual Central, onde ingressou após lograr aprovação, em primeiro lugar, em disputado concurso.
Na capital mineira, sobreviveu, inicialmente, trabalhando no Sindicato dos Ferroviários, como auxiliar de escritório.
Foi servidor do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, onde ingressou após obter o 1º lugar no primeiro concurso público realizado por aquela Corte.
Formou-se em direito pela Faculdade Mineira de Direito da Universidade Católica de Minas Gerais, no ano de 1957. Pós-graduado em direito público, administrativo, tributário e constitucional, exerceu diversas funções: foi professor universitário, assistente e delegado do Tribunal de Contas da União em Minas Gerais, secretário de Estado da Educação no Governo de Aureliano Chaves, juiz suplente da Junta de Conciliação e Julgamento de São João del-Rei do TRT da 3ª Região, juiz substituto e juiz efetivo do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, onde também ocupou os cargos de vice-presidente e corregedor.
Tomou posse como desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais no mês de agosto de 1978, em vaga destinada ao quinto constitucional dos advogados. Presidiu o TJMG de 1990 a 1992, bem assim o Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça do Brasil, entre 1992 e 2008, instituição que fundou juntamente com amigos desembargadores de outros estados da Federação, atualmente intitulada Conselho de Presidentes de Tribunais de Justiça.
Ainda no Tribunal de Justiça, José Fernandes Filho exerceu os cargos de primeiro e segundo vice-presidente e corregedor-geral de Justiça, este em substituição.
Presidiu também o Conselho de Supervisão e Gestão dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Minas Gerais, no período de 1995 a 2015, sendo que, nessa condição, lutou e obteve êxito, a “fórceps”, como costumava dizer, perante o Congresso Nacional, na criação e promulgação da Lei nº 9.099/95, a qual dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Em sua gestão como presidente do TJMG, idealizou o “Mutirão Judiciário”, programa pioneiro que agilizou a prestação jurisdicional no Estado, consolidando-se também como uma das vozes mais atuantes na criação dos Juizados Especiais, em 1995. Recebeu diversas honrarias, como o Colar do Mérito Judiciário, concedido por quase todos os tribunais do país, além das Medalhas da Inconfidência e do Mérito Legislativo e inúmeros títulos de cidadania honorária Brasil afora.
No magistério, José Fernandes Filho lecionou na UFMG de abril de 1962 a março de 1988. Foi vice-diretor executivo do Conselho de Planejamento e Desenvolvimento da Universidade e ocupou o cargo de secretário geral da instituição, equivalente ao atualmente nominado pró-reitor de administração.
Fernandes Filho foi também escritor. Publicou várias obras jurídicas e literárias, como “Funções do Estado”, “Os municípios mineiros e os casos de dispensa de licitação” e “Minha candeia”, livro de memórias, bem como crônicas e artigos na Revista MagisCultura, da Associação dos Magistrados Mineiros (AMAGIS).
Eleito membro da Academia Mineira de Letras, tomou posse em 24 de junho de 2022, sucedendo o acadêmico Afonso Arinos de Melo Franco Filho na cadeira nº 29.
Uma vez questionado sobre o que fizeste da vida, Fernandes Filho respondeu: “Da vida fiz o que pude, com altos e baixos, dentro das minhas humanas limitações. Sofri, cresci, caminhei muito. Nem santo nem herói, apenas humano, não me vejo maior ou menor”.
No âmbito familiar, teve três irmãos, dois filhos, José Arnaldo e José Ricardo, e dois casamentos, sendo que a segunda união foi com Mayre Fernandes, aqui presente, por quarenta anos.
Sobre seu casamento com Mayre, disse, em feliz oportunidade: “Cresci e amadureci com a nova experiência afetiva. Companheira de eternidade, espírito jovem, ajudou-me na penosa travessia da orfandade, à perda, até hoje inconsolável, do primogênito. Quase 40 anos de convivência, aprendizado e rico companheirismo”.
Nonagenário, caminhando para a travessia final, fez a síntese de uma vida quase centenária de virtudes: “Valeu, até agora. Em parte justificado, lamento não ter podido fazer mais. Sou o que posso ser, não o que deveria ou queria ser. Cavaleiro do possível, constrange-me o julgamento, que sei sincero, de quantos me apontam como exemplo. Exemplo de humanidade, sim. Além disso, é juízo equivocado ou generoso, a aumentar-me a responsabilidade”.
Esse é o legado de José Fernandes Filho, que deverá sempre ser lembrado por sua trajetória inspiradora e sua inestimável contribuição às áreas jurídica, educacional e cultural de Minas Gerais e do Brasil.
A história escrita pelo desembargador José Fernandes Filho ficará sempre marcada pelo estudo, pelo exemplo ético e pelo efetivo contributo ao fortalecimento das instituições.
Homem público ímpar e magistrado exemplar, Fernandes Filho influenciou gerações de profissionais do direito não apenas em sua terra natal, mas em todo o país.