Por que o planejamento urbano é essencial na prevenção de desastres
É essencial que prefeituras e governo estadual trabalhem em conjunto na criação de políticas oportunas e efetivas para garantir moradias seguras
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Siga noMarcos Venícius Gervásio
Engenheiro civil e de segurança do trabalho, presidente do Crea-MG
Casas destruídas, pessoas desabrigadas e vidas perdidas em Minas Gerais, no início de 2025, mostram o quanto as chuvas podem ser devastadoras. Segundo a Defesa Civil do estado, até janeiro, as precipitações haviam causado 26 mortes, deixando 421 pessoas desabrigadas e 3.580 desalojadas. Ao todo, 139 municípios já declararam situação de emergência ou estado de calamidade. Ipatinga, no Vale do Aço, uma das cidades mais atingidas, registrou 10 mortes.
Os deslizamentos de encostas que ocorreram em alguns desses municípios mostram como as características do terreno influenciam diretamente esses eventos. Em áreas onde a ocupação acontece de forma irregular e o terreno não é favorável, como em encostas muito inclinadas, com solos frágeis e rochas desgastadas, o risco de deslizamentos é muito alto.
Nesses locais, é comum os moradores fazerem cortes verticais e horizontais nas encostas para ajustar a construção de suas casas, de modo a ficarem em terreno plano. Além disso, aproveitam o corte na vertical como suporte para as paredes do fundo, contíguas a esse corte. Isso acarreta grande remoção de solo que é jogado ladeira abaixo. Posteriormente, novas construções surgem sobre esse material jogado (e que está solto), aumentando ainda mais os riscos, pois, a cada nova escavação, o solo vai ficando mais frágil e sujeito a erosões. Assim, em pouco tempo, a encosta fica instável e tomada por moradias apoiadas em terrenos sujeitos a deslizamentos de grandes proporções.
Esse cenário representa um grande desafio para o poder público, que precisa garantir moradias seguras e acessíveis para todos. É nesse ponto que a engenharia desempenha um papel essencial, pois, com a atuação de profissionais capacitados e legalmente habilitados, é possível planejar e executar soluções que reduzam esses riscos e garantam a segurança da população.
Nós, do Crea-MG, temos atuado de forma ativa para minimizar os danos e auxiliar os municípios neste enfrentamento emergencial. Até o momento, entre engenheiros e geólogos voluntários, já enviamos uma equipe de cinco profissionais para avaliar a segurança dos imóveis afetados em Ipatinga e região. Além disso, mantemos contato direto com a Defesa Civil para sabermos onde nosso esforço é mais necessário.
Essa ação não é inédita. Em 2022, enviamos 12 profissionais para sete municípios mineiros e, em 2023, mobilizamos cinco engenheiros e geólogos para apoiar Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul.
No entanto, é muito importante termos consciência de que essas medidas emergenciais auxiliam no curto prazo, mas não resolvem o problema. Para uma solução eficaz e definitiva é preciso investir na prevenção. Isso é muito mais econômico do que arcar com os custos da recuperação após um desastre. É essencial que prefeituras e governo estadual trabalhem em conjunto na criação de políticas oportunas e efetivas para garantir moradias seguras, tendo em vista a crescente demanda pelo espaço urbano.
Os engenheiros, os agrônomos e os geocientistas podem contribuir ativamente na elaboração de estratégias, apresentar soluções técnicas e economicamente viáveis para prevenção ou mitigação de problemas, atuando no processo de planejamento urbano, na concepção da ocupação nas cidades, bem como na elaboração dos planos diretores municipais. Essas ações são fundamentais para garantir um planejamento urbano eficaz e evitar a ocupação das áreas de risco.
O nosso compromisso é contribuir, transformando o conhecimento técnico em ações concretas que salvem vidas e evitem tragédias como as que estamos testemunhando. Somente com ações conjuntas do governo, da sociedade e dos profissionais de engenharia, agronomia e geociências será possível construir cidades mais seguras e preparadas para enfrentar os desafios climáticos e sociais que ainda estão por vir.