Tradição de 200 anos transforma funerais em festa no Pará
Conheça o "frete", cortejo fúnebre festivo que celebra a vida em Curuçá (PA)
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Siga noUm cortejo fúnebre com música, fogos de artifício, cachaça e muita animação, realizado pelos moradores da vila de São João do Abade, em Curuçá, no nordeste do Pará, viralizou nas redes sociais.
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O ritual, chamado de “frete”, existe há mais de 200 anos, é uma tradição no município e tem como propósito celebrar a vida da pessoa falecida. O cortejo percorre quase 5 km, desde São João do Abade até o Cemitério São Bonifácio, no centro da vila.
“[...] o nome ‘Frete’ surge da ideia de que as pessoas estariam ‘fretadas’ para levar o caixão até o cemitério", explica a professora e pesquisadora Valéria Fernanda Sousa Sales.
A celebração teve origem em um período em que o município não contava com acesso a serviços funerários. De acordo com o criador de conteúdo digital Alexandre Nascimento, na época, o caixão era improvisado com tábuas de marupá, que é uma madeira comum na Amazônia, e os amigos e vizinhos se reuniam para ajudar na preparação do funeral, bebendo e caminhando até o cemitério.
Uma dissertação intitulada “Lágrimas e Cachaça: a espetacularidade do cortejo fúnebre do Frete em São João do Abade, Curuçá-PA”, escrita por Valéria, afirma que o cortejo é uma adaptação dos funerais barrocos, que existiam no Brasil até meados do século XIX.
Ainda segundo a pesquisadora, naquela época foi proibido o sepultamento dentro das igrejas. Em Curuçá, os enterros eram realizados inicialmente na Igreja de Nossa Senhora do Rosário e, posteriormente, passaram a ser feitos em um cemitério mais afastado do centro.
Durante o percurso do frete, há tradicionalmente uma divisão de funções entre homens e mulheres. O início do trajeto é conduzido pelos homens e, ao se aproximarem de um ponto de referência, as mulheres assumem o cortejo, momento a partir do qual os homens não podem mais carregar o caixão.
Como o percurso é bastante extenso, essa troca de responsabilidades ajuda a manter o ritmo da cerimônia. Todo o trajeto é acompanhado por muita festa e bebida. “As pessoas tomam uma bebida alcoólica para ganhar energia, como se fosse um combustível para carregar o caixão", relata Valéria.
*Estagiária sob supervisão do editor João Renato Faria