Padre pede ajuda para revitalização do entorno da Igreja Boa Viagem
Pároco do santuário dedicado à padroeira de BH faz campanha para recuperar a praça que cerca a igreja. Marco Zero da capital, a área sofre com degradação
compartilhe
Siga no
Pichações, quebra de vitrais, assaltos, estragos em veículos e até agressões físicas expõem a situação de perigo e degradação na Praça Boa Viagem, Marco Zero oficial de Belo Horizonte, na Região Centro-Sul. No espaço tombado pelo estado e município, onde se destaca o Santuário Arquidiocesano da Santíssima Eucaristia, templo centenário mais conhecido por Igreja Boa Viagem, a preocupação do clero chegou a tal limite que, em determinadas épocas, há cancelamento de horário de missas para garantir tranquilidade aos fiéis e ao grande número de visitantes interessados em conhecer a “casa” da padroeira de BH, Nossa Senhora da Boa Viagem.
Cansado de pedir atenção das autoridades, embora sem perder a esperança numa solução, o pároco e reitor do santuário, padre José Júnior, fortalece uma campanha para revitalização do entorno do complexo arquitetônico: “Só assim poderemos proteger o patrimônio e a vida das pessoas”. Na cruzada para manter a integridade do bem cultural e espiritual, o religioso diz que vai procurar a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para apresentar um projeto de revitalização feito há 10 anos e ainda não posto em prática.
“Vamos encontrar o prefeito Álvaro Damião para conversar e falar sobre os problemas aqui existentes e urgentes. O projeto, demandando atualização, contempla acessibilidade, parte elétrica, paisagismo (jardins e adro), melhoria da ambiência, tratamento dos passeios, enfim, toda a estrutura da praça”, explica o pároco. Ele lembra que em fevereiro do ano passado, antes do carnaval, solicitou às autoridades municipais que protegessem o entorno da praça, o que não ocorreu. “Na época, alugamos os gradis, mas no último carnaval, por falta de recursos, ficou sem proteção. Foi quando as paredes externas foram pichadas com números parecendo um código.”
Leia Mais
Os impactos decorrentes da revitalização da praça serão muito grandes, tanto para o Bairro Boa Viagem, “onde estamos”, como para toda a capital, diz o reitor e pároco: “Este é o Marco Zero de BH, então um ponto turístico importante. Veja só a quantidade de barzinhos, prédios em construção, edifícios residenciais e outros estabelecimentos em torno do santuário”. Padre José Júnior observa que, antes da declaração de Marco Zero, no ano passado (Lei 11.724, sancionada pelo prefeito Fuad Noman), o movimento de visitantes era bem menor. “Em certos horários, a igreja ficava vazia. Hoje, não. O fluxo de turistas cresceu demais”, informa.
DESTRUIÇÃO À MOSTRA
As pichações na lateral da igreja, perto da secretaria da paróquia, ainda podem ser vistas, assim como os vitrais quebrados em 18 de abril. Na madrugada de Sexta-feira da Paixão, os vitrais franceses foram atingidos com pedradas e pedaços de pau. No alvo do vandalismo, se encontram os elementos artísticos que retratam os evangelistas São João e São Marcos.
Indignado com a situação, o padre contou à equipe do Estado de Minas: “Estávamos abrindo a igreja, antes das 5h, quando ouvimos o barulho. Quando fomos ver do se tratava, encontramos os vidros quebrados e parte da armação dos vitrais no chão. Ainda ficou um pedaço de pau preso no alto”. A suspeita recaiu sobre uma moradora em situação de rua que já tentou esfaquear um homem de 73 anos, frequentador constante das missas, e não conseguindo machucá-lo, riscou o carro dele. A Polícia Militar (PM) esteve no local e fez o boletim de ocorrência.
Pouca iluminação e falta de segurança na praça impedem, em alguns períodos, a celebração de missas à tarde e à noite. “No próximo carnaval, no sábado e domingo, só haverá celebração na parte da manhã. Depois, fica impossível. Além disso, durante todo o ano, os fiéis estão sempre se queixando das abordagens da população de rua”, observa o reitor do santuário.
AÇÕES DE PREVENÇÃO
A PBH informa que a Guarda Civil Municipal realiza patrulhamento preventivo diário na Igreja Boa Viagem e em seu entorno. Nos horários de missas, momentos de maior fluxo de fiéis, a segurança é intensificada por meio da Operação Templo Seguro, desenvolvida em parceria com a Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG). A operação tem como objetivo ampliar a proteção aos frequentadores da igreja, inibindo práticas criminosas como furtos, roubos, coações e outras ocorrências, além de assegurar o direito de livre circulação nas imediações dos templos religiosos.
Ainda em nota, a prefeitura explica que a coordenação da equipe da Inspetoria do Hipercentro da Guarda Municipal mantém um canal permanente de diálogo com os padres e representantes da administração da Igreja Boa Viagem, buscando sempre aprimorar as ações e fortalecer a segurança no local. Já conforme a subsecretaria Municipal de Zeladoria Urbana, os serviços de manutenção das árvores são realizados na Praça Boa Viagem sempre que necessário, sendo a última intervenção ocorrida em 22 de setembro. O serviço de jardinagem ocorre três vezes por semana, com a limpeza dos jardins e pequenos reparos quando identificados
Também em nota, a PMMG, por meio da 4ª Companhia do 1º Batalhão de Polícia Militar (1º BPM), responsável pelo policiamento na Praça Boa Viagem e paróquia, informa que faz constantemente ações e operações preventivas no local. “Entre as medidas adotadas, está a Operação Tempo Seguro, em que guarnições da 4ª Companhia realizam pontos base, abordagens e patrulhamentos com o objetivo de prevenir crimes e elevar a sensação de segurança dos frequentadores da praça e da paróquia.”
Além disso, está em andamento projeto que prevê a instalação de sete conjuntos de câmeras de segurança em todo o entorno da praça. Os equipamentos serão integrados ao sistema Olho Vivo, permitindo o monitoramento em tempo real, a prevenção de delitos e, em caso de ocorrência, o rápido rastreamento e prisão de autores. “O local é alvo de policiamento constante pelas guarnições da 4ª Companhia. Sempre que algum delito é registrado, são desencadeados os devidos rastreamentos visando a prisão dos envolvidos e a redução da criminalidade na região.”
PARÓQUIA MOBILIZADA
Com mais de 100 anos de história, a edificação em estilo neogótico – localizada entre as ruas Sergipe, Aimorés, Alagoas e Timbiras – é tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG) e município, via Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de BH.
O templo tem elementos artísticos (imagem, altar, pia, chafariz e outras peças do século 18, dos tempos de Curral del-Rey, localidade destruída para a construção de BH) tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
“Também a praça que circunda a construção está sob tombamentos municipal e estadual. Então, todo o complexo (santuário e área externa) é protegido”, diz o padre. Após um período de oito anos em restauração, o Santuário Arquidiocesano da Santíssima Eucaristia vai passar por novas intervenções nos pináculos e duas torres, serviço orçado em R$ 8 milhões. A paróquia está se mobilizando para conseguir os recursos e fazendo eventos.
Quem entra no santuário pode ver os efeitos da primeira etapa do restauro concluída em 2019. Nas obras realizadas na igreja, foram descobertas duas cores originais sob sete camadas de tinta aplicadas durante quase um século. Ornamentando o interior do templo, estão o azulado, que remete à abóbada celeste e à Virgem Maria, e o amarelo ocre no tom do trigo, símbolo da eucaristia.
CONSTRUÇÃO E ACERVO
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia
O trabalho de restauro ocorreu em etapas. O telhado, um dos pontos mais importantes para proteger a construção e o acervo, foi reformado. Duas capelas laterais, que ficam no interior do templo, foram restauradas, momento em que a equipe técnica envolvida nas obras descobriu as cores originais das paredes, barrados e relevos decorativos do santuário. A imagem da padroeira de BH, Nossa Senhora da Boa Viagem, do século 18, também foi restaurada pela especialista Carla Castro Silva.
Além das capelas internas, dedicadas a Nossa Senhora da Boa Viagem e ao Sagrado Coração de Jesus, a equipe restaurou o altar principal, o trono do Santíssimo Sacramento, a cúpula (torre interna de 36 metros de altura), a nave, o coro, as tribunas localizadas à direita e à esquerda, o calvário (sala interna) e a cripta, onde bispos e arcebispos são sepultados, a exemplo do pioneiro na Arquidiocese de BH, dom Antônio dos Santos Cabral (1884-1967), dom João Resende Costa (1910-2007) e do cardeal dom Serafim Fernandes de Araújo (1924-2019).