MOVIMENTO CRISTÃO

Legendários em BH: vereador quer data em apoio a grupo que só aceita homens

Movimento prega a transformação de famílias e leva grupos para experiências em meio à natureza

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Em meio à crescente popularidade dos Legendários, movimento cristão que se declara voltado para a transformação do caráter dos homens, o vereador de Belo Horizonte (MG) Wanderley Porto (PRD) propôs projeto de lei que cria o Dia Municipal dos Legendários. A data sugerida é 23 de julho. Porto já participou duas vezes do TOP: Track Outdoor Potencial, e define a experiência como “espetacular”.

Na justificativa do PL, o vereador considera que a proposta é um reconhecimento ao impacto positivo do movimento em Belo Horizonte e reforça o compromisso da capital mineira com o respeito à diversidade religiosa. Porto acredita ainda que o Dia dos Legendários vai dar mais visibilidade para o movimento e, assim, alcançar mais homens para que possam participar desse momento de transformação.

“Nos últimos dias muitas pessoas têm se voltado contra o movimento. Por ser algo que resgata, reestrutura, restaura famílias e trabalha o caráter do homem. Tudo isso é uma afronta para sociedade em si. Hoje nós estamos vivendo em uma inversão de valores: o que é errado é certo, o que é certo é errado”, disse o político.

Sobre a crítica de que o movimento seria machista, o vereador garante que não: “Pelo contrário, a maioria das inscrições são feitas pelas esposas e filhas. Hoje a maioria dos testemunhos também são delas, falando de como a pessoa se transformou, se regenerou."

Os Legendários

No site oficial, os Legendários se descrevem como um “movimento que busca a transformação de homens, famílias e comunidades por meio de experiências que levam os homens a encontrar a melhor versão de si mesmos e seu novo potencial”. Iniciado na Guatemala em 2015 por Chepe Putzu, os Legendários já estão em 70 cidades de 13 países. 

Exclusivamente voltado para homens, o principal evento do grupo é o TOP: Track Outdoor Potencial, no qual o grupo vai para um local fora da cidade e passa 72 horas na natureza, sem celular ou qualquer outro contato externo. Sem ligação oficial com nenhuma religião, a ideia é se conectar a Deus e criar homens “inquebrantáveis diante do pecado”.

O evento é cercado de mistérios, e pouco do que acontece durante os três dias é divulgado. Diferentemente de um retiro espiritual, no TOP os momentos de reflexão e adoração a Deus são intercalados com atividades físicas, por vezes extremas. Acompanhados de equipes de segurança e médica, os legendários acampam ao ar livre, recebem uma quantidade de alimento e são responsáveis por preparar as refeições, no estilo escoteiros. Com isso, prometem devolver “o herói a cada família”.

“É importante deixar claro que não é nenhuma sociedade secreta, não é nenhuma maçonaria, nenhuma seita, nada disso. A questão de não contar o que acontece lá é para não tirar a surpresa de quem vai, é simplesmente isso”, explica o vereador Wanderley Porto.

O movimento já conquistou 52 mil participantes  no mundo No Brasil, já são 10.128, até a publicação desta reportagem. Os ingressos para os eventos custam a partir de R$1.490,00, podendo ultrapassar R$81 mil a depender do evento, e, segundo relatos em redes sociais, esgotam-se rapidamente.

Além do TOP, os Legendários também promovem o REC (Reto Extremo de Caráter), com ênfase no fortalecimento do caráter; e o Legendários Tour, edições especiais para pais e filhos ou com foco no resgate do casamento, entre outros. 

Em julho de 2024 foi realizado o Tour Testosterona, divulgado como um evento para “discutir o papel do homem na sua família, no seu trabalho, na sociedade e no mundo” e como “o maior guia sobre masculinidade do mundo”.

Tocados por Deus

Entre os famosos que já divulgaram ter participado dos eventos dos legendários estão Pablo Marçal, Gustavo Tubarão, Thiago Nigro e o empresário Kaká Diniz e, mais recentemente, o ex-BBB Eliezer

Ricardo Ribeiro participou do primeiro TOP realizado no Brasil, em 2017, e na primeira edição em Minas Gerais, em 2019. Desde então, participa como voluntário pelo menos uma vez por ano. Ele explica que o Legendário nº1 se refere à Jesus e que cada Legendário recebe um número para mostrar que cada um é único perante Deus. 

“Lá na montanha você descobre que você nunca esteve sozinho, que Deus está ao seu lado o tempo todo. Eu creio que eu voltei um pai, um homem, um marido e um cidadão melhor. Um dos motivos de eu servir é para retribuir, derramar aquilo que eu recebi ao próximo, mas também para reviver a experiência que eu tive”.

Segundo Ribeiro, a falta de divulgação sobre o que acontece na montanha faz parte da experiência, de modo que cada participante vivencie o evento sem influências prévias.

“Eu acho que um dos motivos do sucesso é porque criou-se algo que precisava ser criado. Como cristãos, a gente crê que o homem foi criado com propósito, assim como a mulher, como a família, e isso tem sido muito atacado. O propósito dos Legendários é trazer essa reconfiguração do papel do homem perante a sociedade que ele vive”.

Do céu ao inferno

Mas nem tudo são flores. Para Nikolas Amorim, que participou do TOP em 2023, o evento estava longe de ser o ideal. Ao chegar no ponto de encontro no Bairro Buritis, em Belo Horizonte, a primeira impressão não o agradou e quis desistir de embarcar para o local não divulgado.

“Já começou um esquema que não me desceu muito bem. Uma gritaria muito grande, mandando correr, fazer agachamento, tipo um esquema meio que militar. Eu estava com o joelho machucado devido a um agachamento que eu fiz errado na academia e me recusei a fazer o agachamento. Aí um cara chegou e falou ‘ou você aprende no amor ou você aprende na dor’. Eu respondi ‘você tá me ameaçando?’”, relata. 

Houve um desentendimento e, depois de muita conversa com outros participantes, foi pedido que “desse uma segunda chance” e Amorim resolveu seguir viagem. No ônibus, ele passou mal e voltou a pedir para ir embora. Os organizadores então disseram que havia carros no ponto onde a caminhada começaria e que poderiam trazê-lo de volta.  

“Então dei mais um voto de confiança. Toda hora eles falavam que “ali” tinha um carro que ia me tirar e andávamos para mais longe. E isso foi a montanha inteira. Toda hora alguém mentia para mim”.

Com o fim do primeiro dia, Nikolas teve que passar a noite acampado junto com os outros participantes. Segundo ele, o grupo foi acordado na manhã seguinte com bombas de efeito moral e algumas pessoas chegaram a passar mal com o susto. Ao longo do segundo dia aconteceram atividades como pular de uma ponte em um rio e cruzar um lago e, segundo Nikolas, em nenhum momento foi perguntado se alguém não sabia nadar. 

“Não é obrigatório, mas eles fazem de tudo para você pular. Aquela pressão psicológica. Tem um uma parte do evento que chama ‘salto da fé’. Um dos primeiros caras que pulou no rio cortou o pé e, a partir daquele momento, eles mandaram a gente pular de tênis. Depois nós fomos cruzar um lago em botes bem precários e todos nós estávamos sem coletes”.

Em determinado momento, conta Nikolas, ele avistou uma cidade próxima e tentou abandonar o evento par ir até ela, mas novamente foi impedido. Ao tentar correr, ele afirma que foi perseguido e derrubado com um bastão de trekking. Depois de uma longa conversa, Nikolas concordou em seguir com o grupo, e desistiu de abandonar o evento.  

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“Não nego, para quem participou e foi de coração aberto, realmente mudou a vida. É um evento que mudou a vida de algumas pessoas, e eu presenciei isso. Mas em alguns casos, não. No meu caso, piorou. Eu fiquei muito chateado, me senti muito desrespeitado, afinal não tive direito de escolha”. 

O Estado de Minas entrou em contato com o Legendários mas, até a publicação desta matéria, não teve resposta.

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