Balanço de dois mandatos à frente da Corregedoria
compartilhe
SIGA
O Sr. termina, neste mês de dezembro, seu 2º mandato à frente da Corregedoria-Geral do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). O Sr.r sempre pregou a necessidade de diálogo e de união para enfrentar os desafios. O fato de ter seu primeiro mandato numa gestão do MPMG e o atual na presente gestão dificultou, de alguma forma, esse diálogo e a união da classe? Quais os principais desafios da primeira gestão e os que foram superados?
O Ministério Público (MP) possui estrutura que reproduz, de certa forma, o princípio da repartição de poderes. Na administração superior, além do procurador-geral de Justiça e do corregedor-geral do Ministério Público, há também a Ouvidoria, o Conselho Superior e o Colégio de Procuradores de Justiça. Cada órgão tem suas atribuições definidas em lei. Nunca enfrentei dificuldades para estabelecer diálogo institucional junto a qualquer dos órgãos da administração superior da instituição. Os desafios foram enfrentados com escuta, diálogo e respeito, uma prática possível porque a união da classe não depende de uma única gestão, mas do compromisso permanente de todos com a instituição e com os destinatários de nosso trabalho. Durante o segundo mandato, ocorreu a mudança na chefia institucional, sem que isso representasse qualquer solução de continuidade nas atividades da Corregedoria-Geral (CGMP). No período de disputa eleitoral, recebi todos os candidatos, mantendo diálogo harmonioso e apresentando de forma transparente as deficiências estruturais observadas durante o exercício correcional. Os avanços alcançados refletem que essa união prevaleceu durante todo o período à frente da CGMP, demonstrando que o sucesso institucional resulta do esforço conjunto e da permanente cooperação entre todos os membros e servidores do Ministério Público de Minas Gerais. Posso dizer que o desafio maior que enfrentei foi a transição do modelo de trabalho remoto e semipresencial, imposto pela pandemia do coronavírus, para o regime de plena disponibilidade do membro do Ministério Público. A cultura do trabalho remoto, estimulada pelos avanços tecnológicos, impregnou-se com muita força em todos os setores, públicos e privados, e passamos a ter de enfrentar esse paradoxo de, ao mesmo tempo, buscarmos aumento de produtividade com tais recursos, incluindo a inteligência artificial, e estarmos presentes na comunidade, efetuando reuniões, visitas, palestras e residindo nos mais distantes municípios mineiros.
Quais os desafios e conquistas dessa gestão que se encerra? A recondução foi importante para a consolidação de seu trabalho? De que forma?
Sempre tive plena convicção de que o interesse social repousa no trabalho árduo e efetivo do membro do Ministério Público. A Corregedoria-Geral, por lei, é órgão orientador e fiscalizador das atividades dos promotores e procuradores de Justiça. Busquei fortalecer a atividade orientadora, de modo a evitar que a fiscalização se agigantasse a ponto de se transformar em atividade inibidora da atuação dos membros, o que seria contrário ao interesse da sociedade. Uma fiscalização repressora somente interessa àqueles que desejam uma instituição fraca, um Promotor de Justiça sempre receoso de seu próprio órgão orientador e fiscalizador. O promotor de Justiça precisa ter tranquilidade para trabalhar e bem desempenhar suas atribuições, seja no combate ao crime e à corrupção, seja na defesa dos mais elevados interesses sociais. Busquei garantir respostas rápidas, justas e efetivas para atender às expectativas internas e externas.´Nossa gestão se reaproximou do modelo de atividade correcional trazido pela Carta de Brasília, que foi documento produzido nacionalmente no ano de 2016, um acordo de resultados entre a Corregedoria Nacional e todas as outras corregedorias dos demais ramos do Ministério Público. Segundo esse modelo, a atividade fiscalizadora do órgão não se limita a buscar erros, mas, sobretudo, a fomentar boas práticas, estimular ações que aproximem o Ministério Público da comunidade e atuar de maneira propositiva e resolutiva. A recondução ao mandato assegurou a continuidade da confiança da classe no trabalho até então realizado por esta administração, além de possibilitar a consolidação de fluxos de trabalho, o aprimorar dos sistemas de acompanhamento correcional e o fortalecimento das medidas voltadas ao enfrentamento do expressivo acervo de feitos extrajudiciais existente nas unidades ministeriais.
Há quem diga que sua gestão como corregedor-geral se encerra como uma das melhores da história do MPMG. Qual o legado o Sr. deixará para seu sucessor e o que o Sr. espera da atuação do próximo corregedor-geral?
Deixo uma Corregedoria-Geral estruturada com a convicção de que toda gestão deve sempre, quanto ao fluxo de trabalho, suceder a outra, independentemente de quem ali esteja à sua frente, bem como de que o avanço operacional é processo contínuo de evolução da instituição. Assim, independentemente da gestão que irá me suceder, espero realmente a continuidade do trabalho que, ao longo de todos esses anos, foi sendo aprimorado por cada um dos corregedores-gerais, aprimoramento esse que necessita constantemente ser aperfeiçoado para que a instituição, seus membros e seus servidores possam acompanhar a evolução da sociedade. Deixo também um programa individualizado de estágio probatório por meio do qual a Corregedoria-Geral incentiva continuamente os promotores de Justiça em estágio probatório a se envolverem em atividades com efetivo impacto social. Esse programa recebeu o Certificado de Boa Prática Resolutiva do CNMP, por sua metodologia inovadora de acompanhamento do estágio, permitindo abordagem individualizada de cada promotor de Justiça recém-ingresso na instituição. Deixo ainda um plano diretor focado em oito eixos temáticos, que têm por finalidade conduzir atuação estratégica, responsável e alinhada ao interesse público, favorecendo aproximação com a sociedade, planejamento orientado a resultados concretos, soluções consensuais sempre que adequadas, produtividade com qualidade, priorização de temas de maior impacto social, cuidado com o bem-estar dos membros, dos servidores e dos colaboradores, além do fortalecimento da confiança social por meio da transparência e garantia de um comportamento ético e íntegro em todas as etapas da atuação institucional. Esta Corregedoria-Geral, por fim, procurou, ao longo desses quatro anos, fazer-se próxima dos membros, o que se deu por meio das inúmeras visitas e reuniões minhas nas diversas promotorias de Justiça do interior de Minas Gerais para conhecer o trabalho desenvolvido pelos colegas e a estrutura disponibilizada ao promotor de Justiça para a boa realização de seu mister, além da criação do programa ‘Café com a Corregedoria’, por meio do qual diversos colegas em estágio probatório se reuniam de maneira virtual para conversa aberta e proveitosa com promotores de Justiça, corregedores e subcorregedores, prática essa, inclusive, que acabou sendo replicada em outros Ministérios Públicos brasileiros. Enfim, faço votos no sentido de que o meu sucessor mantenha o órgão correcional como órgão de confiança do membro do Ministério Público, que aí está para somar, buscar soluções, estimular o bom trabalho, fomentar as boas práticas, cobrar o que for necessário, inclusive mediante imposição de penalidades disciplinares, mas sem perder de vista que a sociedade é a verdadeira destinatária dos nossos serviços.
O Sr. é também o 2º vice-presidente do Conselho Nacional de Corregedores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União. A reforma administrativa apresentada por meio da PEC nº 38/2025 é preocupação para o Ministério Público e pode afetar direitos da classe? Em que pontos, principalmente?
A reforma administrativa não é preocupação da classe, mas de todas as pessoas que prezam o Estado Democrático de Direito. Quando você, apesar das boas intenções, afeta determinadas garantias, que foram adotadas para dar força às instituições, você enfraquece essas instituições. Nós temos consciência de que o país passa por momento difícil, mas a solução não está em enfraquecer o Ministério Público e as demais carreiras de Estado, o que, com certeza, serviria para desvalorizar essas carreiras e colocar em risco a própria defesa da sociedade e, inclusive, da própria democracia.