Advocacia criminal na veia
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O Sr. se formou em Direito em 1976 pela Faculdade de Direito da UFMG, a vetusta “Casa de Afonso Pena”, onde iniciou como professor em 1978. A opção pelo Direito Penal foi influência de seu saudoso pai, o professor Jair Leonardo Lopes? O Direito Penal mudou muito desde que iniciou na advocacia? Em que pontos, principalmente?
A opção pela advocacia criminal, naturalmente, sofreu a influência de meu querido pai, que, além de criminalista, foi professor titular de Direito Penal na Faculdade de Direito da UFMG. Na Vetusta fiz concurso para professor de Direito Processual Penal, tendo lecionado durante 35 anos. Houve significativas mudanças na forma de advogar e também na própria área profissional. Nos últimos 20 anos estamos dedicados ao Direito Penal empresarial, que nem existia como segmento da advocacia criminal na década de 70 do século passado, quando comecei a trabalhar. A criminalização de condutas no âmbito das empresas veio depois.
O Código Penal é da década de 40, tendo mais de 80 anos, assim como o Código de Processo Penal. O Congresso vez por outra institui novos crimes, fixa penas e revoga outros, conforme o anseio popular. Isso não é ruim? Não seria a hora de novos Códigos Penal e de Processo Penal? Como está esse tema?
O Código Penal está dividido em Parte Geral e Parte Especial. Aquela foi reformada por completo em 1984, com o trabalho de comissão de juristas de que participou o professor Jair Leonardo. A Especial, que tem o catálogo de crimes e penas, nunca foi objeto de reforma ampla, em virtude das naturais divergências que causa, tanto na sociedade em geral, quanto na comunidade jurídica. No passado tínhamos um parlamentar mineiro muito preparado intelectualmente, que muito ajudava na tramitação dos projetos de lei em matéria penal e era sempre o relator no Congresso (refiro-me ao deputado Ibrahim Abi-Ackel). Há um projeto de novo Código de Processo Penal apresentado ao Parlamento faz alguns anos, mas parece não haver clima político para sua apreciação. Sempre considero lamentáveis as iniciativas parlamentares de novas leis penais no clamor de casos concretos com repercussão midiática. Nunca sai coisa boa.
Na Lava-Jato foram mais de 100 delações premiadas, a grande maioria revogada por vícios. Agora vem o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e tem, como maior fundamento para a condenação, uma delação. O que acha desse instituto? Ele está de volta?
Ao longo dos anos na legislação penal brasileira foram sendo instituídos benefícios em favor de quem colaborava com as investigações e esclarecimento de crimes. A delação premiada possou a ter uma regulamentação específica e mais completa na Lei 12.850 de 2013, que trata das organizações criminosas. A grande confusão reside em achar que a delação premiada já é prova direta contra a pessoa delatada, quando a própria lei diz que ela é meio para obtenção de prova, o que significa, conforme o entendimento do STF, que ninguém pode ser condenado apenas com base numa delação.
Atualmente, tramita a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública, que cria um Sistema Único de Segurança Pública e amplia a competência da União no planejamento e coordenação da segurança pública. Alguns estados são contrários, inclusive Minas Gerais, que tem uma polícia considerada muito eficiente, inclusive no combate ao crime organizado. Como o Sr. enxerga esse tema? Essa PEC não retira poder dos estados e empodera, de certa forma, as polícias Federal e Rodoviária Federal?
A Constituição vigente distribui a competência na área de segurança pública entre União e estados. Apesar disso, vários municípios criaram guardas municipais, que deveriam ficar limitadas a proteção do patrimônio municipal, mas que acabam fazendo papel de policiamento ostensivo geral em razão da necessidade e das deficiências conhecidas. A questão exige, na verdade, em caso de reforma administrativa dar a atribuição e também os meios para seu desempenho. Não vejo necessidade de ampliar a competência da União, melhor é aparelhar bem cada esfera de governo com bons recursos humanos, materiais, financeiros e tecnológicos e com uma cultura política de respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana. É triste ver Estado instituindo gratificação para policial que mata...