Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz Filho, Vice-procurador-Geral da República

O Ministério Público Federal na visão de quem entende

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O entrevistado desta edição do D&J é o subprocurador-geral da República, Hindemburgo Chateaubriand Pereira Diniz Filho. Mineiro, mas há 27 anos residindo na capital federal, Hindemburgo tem o Ministério Público Federal (MPF) na veia. Com a autoridade de quem já exerceu diversos cargos na instituição e, atualmente, exerce o segundo posto mais importante do MPF, nesta entrevista fala sobre os desafios e a importância do Ministério Público após Constituição Federal de 1988, aborda temas como combate à criminalidade organizada nacional e internacional e ativismo do Supremo Tribunal Federal e fala sobre sua candidatura a uma vaga no Superior Tribunal de Justiça.   

O Sr. é filho do saudoso Hindemburgo Pereira Diniz que, entre outras coisas, foi fundador e primeiro presidente da Fundação João Pinheiro e presidente do BDMG – Bando de Desenvolvimento de Minas Gerais. Mineiro, o Sr. se formou em Direito pela PUC Minas e é mestre e doutor pela UFMG. Como nasceu a ideia de ingressar no Ministério Público Federal (MPF) e por que a mudança para Brasília?


Fui influenciado por uma prima, atualmente ministra do Superior Tribunal de Justiça, Maria Isabel Gallotti. Ela era, à época, procuradora da República recém-concursada e eu estava na Itália, onde estudava como bolsista. O início do concurso coincidiu com o meu retorno ao Brasil. Fui aprovado e tomei posse em fevereiro de 1991. A mudança para Brasília ocorreu em 1998, em virtude da minha promoção ao cargo de procurador regional da República. Confesso que parti de Belo Horizonte com a esperança de retornar em breve, pois já se falava muito da criação do Tribunal Regional Federal em Minas Gerais. Infelizmente, veio tarde e Brasília se tornou a minha casa, assim como a de tantos outros mineiros. Sou neto de Israel Pinheiro e me orgulho de viver aqui, mas meu título de eleitor eu nunca transferi.

O Sr. ingressou no MPF logo após a Constituição de 1988, que ampliou a competência e os poderes do Ministério Público. Como o Sr. enxerga a atual atuação do MP em relação ao seu início de carreira? Temas, atualmente mais em voga, como meio ambiente, povos originários, discussão de gênero, fake news, liberdade de expressão etc. tornam a atuação, hoje, mais complexa? Qual a solução para equilibrar a defesa de tais temas sem interferir no desenvolvimento do país?


Na Constituição brasileira o Ministério Público é a única instituição a quem se incumbiu, expressamente, a defesa da ordem jurídica, o regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Mais do que cuidar, portanto, de uma das funções clássicas do Estado, fomos encarregados de proteger o todo, ou seja, o próprio poder político por meio do qual se expressa a vontade popular. Somos responsáveis por zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos aos direitos por ela (CF/88) assegurados e, para isso, recebemos garantias de estatura equivalente, como a da independência funcional, da autonomia de gestão com relação aos demais Poderes da República, o direito de elaborar a nossa proposta orçamentária e de encaminhar ao parlamento a criação e extinção de nossos cargos e serviços auxiliares. O Ministério Público brasileiro tem, portanto, características únicas, e a ampliação dos nossos poderes foi a escolha política que se fez para que pudéssemos defender direitos que vão muito além da nossa clássica atribuição de titular da ação penal pública. Temos que lembrar, também, que a independência dos procuradores e promotores será sempre um princípio básico de nossa atuação, especialmente quando nos manifestamos sobre conflitos individuais e coletivos que nascem espontaneamente da experiência econômica e social e ali defendemos o interesse público. A independência remedia os riscos de pressões indevidas. O problema surge, por vezes, quando se permite ao membro do Ministério Público, a pretexto da defesa de temas relevantes, o poder de criar o fato, interferindo em aspectos discricionários de políticas públicas. Aqui, o sentido superdimensionado da independência funcional, associado à ideia de feudos territoriais, talvez tenha sido a causa de excessos claramente indesejáveis. Temos que entender que a nossa instituição é única e me parece evidente que, como em qualquer outra, as suas ações não devam ser praticadas de forma descoordenada, como se incorporassem, cada um de seus membros, o seu próprio Ministério Público. O que quero dizer é que os resultados da nossa atuação serão sempre mais legítimos quando alinhados a um consenso institucional, que se constrói por meio de estruturas dispostas à união de esforços e não a sua dispersão. Precisamos compreender, portanto, cada vez mais, e fortalecer, o sentido indivisível da instituição. Essa é uma ideia que vem se impondo diante dos novos desafios da realidade contemporânea, para os quais já não cabem respostas individuais e descoordenadas. É assim que alcançaremos o equilíbrio desejado entre os nossos fins e o desenvolvimento do país.


Como vice-procurador-geral da República, uma de suas atribuições é oficiar perante o Supremo Tribunal Federal. Fala-se muito do ativismo judicial no âmbito do STF e da necessidade de restringir as matérias a serem analisadas pela Suprema Corte? Qual sua visão a respeito?


A minha atribuição como vice-PGR é a de oficiar, em nome do procurador-geral, em processos criminais de competência originária do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. O volume é, sem dúvida, em ambos os casos, significativo, mas isso tem menos a ver com as atribuições daquelas Cortes do que com os efeitos deletérios de um sistema político, cujas formas de financiamento favorecem enormemente a prática de desvios e de outros crimes contra a administração pública. No mais, penso que o Supremo Tribunal Federal, apesar de eventuais críticas de ativismo, que talvez decorram da ocupação de espaços que deveriam ser, de algum modo, preenchidos pelos demais Poderes, tem sido fundamental para a manutenção da nossa democracia.


Recentemente tivemos uma grande operação contra o crime organizado, na qual o MPF teve importante participação. O Ministério Público Federal está preparado e estruturado para o combate ao crime organizado, que, outrora localizado no Rio e em São Paulo, atualmente proliferou por diversos estados brasileiros e já tem atuação transnacional ? Qual a postura da atual administração do MPF em relação ao enfrentamento ao crime organizado?


Aprimorar a nossa atuação no combate à criminalidade organizada é uma prioridade da atual gestão da PGR. Esse é um fenômeno que preocupa a todos diante da dimensão que tem assumido. Para isso, estamos nos estruturando de forma adequada. Acabamos de criar o Grupo de Apoio Especializado no Combate à Criminalidade Organizada com atribuição nacional e estamos fortalecendo os caminhos da cooperação internacional com as instituições congêneres de outros países, o que é também fundamental. Temos realizado, com sucesso, investigações conjuntas com países da Europa e América do Sul, definido estratégias comuns e criado inúmeras redes de contato. A qualidade e eficiência do nosso trabalho resultou inclusive no convite para integrarmos, como país terceiro, a principal agência de cooperação em matéria criminal da União Europeia, conhecida por Eurojust. Nada disso, porém, será suficiente se não houver uma adequada integração do trabalho dos órgãos de persecução criminal, no âmbito federal e dos estados. Sem isso, não se avançará muito nessa matéria.


Em 2024, o Sr. foi candidato a ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na vaga destinada ao quinto do Ministério Público. A última vez que um mineiro foi escolhido para o STJ na vaga do MP foi em 2013, com a nomeação do ministro Rogério Schietti, que continua na Corte. O Sr. pretende se candidatar a uma próxima vaga?


A minha candidatura ao STJ surgiu de um convite, ou melhor, de um incentivo feito por pessoas por quem tenho grande admiração, o que para mim foi uma honra. Eu a encarei, naquele momento, como uma oportunidade de contribuir, numa perspectiva diferente, para a realização daqueles valores de Justiça em que tanto acredito. Mas não me animaria a uma nova candidatura, mesmo porque nunca perdi a admiração e orgulho de pertencer ao Ministério Público Federal.

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