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A urgência de construir o Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte trouxe à tona um dos dilemas recentes do Direito Ambiental e Constitucional brasileiro: a ponderação entre o direito fundamental à Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) das comunidades quilombolas e o direito fundamental à vida e à saúde da população geral.
O projeto de 100 quilômetros de extensão, com a interligação de 11 cidades, ajudará a desafogar o atual Anel Rodoviário de BH, que não é apenas uma via obsoleta; é um "corredor da morte". Estatísticas recentes do EM apontam para uma realidade inaceitável: a rodovia registra, em média, um óbito a cada 16 dias. Dados da Secretaria de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais evidenciam uma média de 12 acidentes por dia. Esses dados resumem a urgência da situação: a cada semana, famílias são destruídas pela ineficiência e precariedade da infraestrutura existente.
Além do custo humano, o atraso tem um preço ambiental. O tráfego intenso e os congestionamentos diários na via aumentam drasticamente a emissão de poluentes, agravando a qualidade do ar em bairros populosos e desrespeitando o direito a um meio ambiente equilibrado e à saúde pública.
O novo projeto, portanto, não proporciona apenas o desenvolvimento; é uma medida de segurança pública e saúde coletiva.
A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT 169), ratificada somente por 23 países, 15 da América Latina, além da Alemanha, Dinamarca, Espanha, Fiji, Holanda, Noruega, Nepal e Nova Zelândia, garante às comunidades tradicionais, como os quilombolas, o direito de serem consultadas sobre qualquer medida que possa afetá-las diretamente.
A CLPI é um instrumento de governança que visa garantir a participação e a mitigação dos impactos de empreendimentos sobre as comunidades tradicionais. Contudo, sua aplicação, no Brasil, tem sido desviada do seu propósito, transformando-se, paradoxalmente, em um vetor de insegurança jurídica e de paralisação indefinida de obras de interesse público.
A lacuna regulatória é a principal causa da insegurança jurídica. O Poder Judiciário tem sido acionado para definir os ritos da consulta, sobrecarregando o sistema e postergando as decisões. Empresas e o setor público ficam sem parâmetros claros, tornando o cronograma e o custo de obras essenciais para o desenvolvimento do país, e até mesmo para a infraestrutura de saúde e segurança, absolutamente imprevisíveis.
No caso de Belo Horizonte, o exercício desse direito transformou-se em um obstáculo ao interesse público majoritário. Relatos apontam que algumas comunidades quilombolas, orientadas por um corpo jurídico externo, têm se esquivado das tentativas de diálogo feitas pelo poder público e pelo empreendedor, como medida para paralisar ou inviabilizar obras de extrema importância para toda a população. Essa resistência, ao frustrar o princípio da boa-fé exigido pela própria OIT 169, deve ser apurada e, se efetivamente comprovada, exemplarmente combatida pelo Poder Judiciário.
A questão central, portanto, é: pode o direito de consulta, um direito-meio, paralisar a concretização do direito-fim da vida e da segurança de centenas de milhares de cidadãos que trafegam todos os dias pelo "corredor da morte"?
Em situações de risco iminente e de dano irreparável à coletividade, o direito à vida (artigo 5º da CF) e à segurança viária deve prevalecer sobre o direito a uma consulta que esteja sendo deliberadamente obstruída.
O atraso no projeto significa a manutenção da elevada taxa de mortalidade e lesões graves na rodovia. A cada dia de paralisação, mais vidas são perdidas. O direito à vida, nesse cenário, assume uma dimensão de urgência e necessidade pública inadiável.