‘Silvio Santos vem aí’ é bem menos interessante que o personagem real
Longa-metragem que estreia nesta quinta-feira (20/11) tem roteiro frágil e desperdiça a oportunidade de retratar a personalidade fascinante do apresentador
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Silvio Santos (1930-2024) foi uma figura tão interessante e instigante que qualquer cinebiografia corre o risco de ficar aquém do personagem ao tentar dar conta de sua complexidade. Foi exatamente o que ocorreu com “Silvio Santos vem aí”, longa-metragem de Cris D’Amato (“S.O.S. Mulheres ao mar”, “A sogra perfeita”), que chega aos cinemas nesta quinta-feira (20/11).
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Com Leandro Hassum no papel do apresentador – ele faz questão de dizer que não buscou imitá-lo, mas captar sua essência, embora recorra aos cacoetes característicos de Silvio –, o filme parte da campanha presidencial de 1989, quando o empresário e apresentador que dominava os domingos na TV com o programa que levava seu nome ensaiou uma candidatura, para recontar sua trajetória.
Na vida real, Silvio foi convidado a se candidatar pelo Partido Municipalista Brasileiro (PMB), mas demorou a tomar uma decisão e, quando finalmente aceitou concorrer à Presidência da República, as cédulas já haviam sido impressas com o nome de Armando Corrêa, lançado pela sigla.
O PMB até voltou atrás, mas não havia mais tempo para reimprimir o material. Silvio, então, a duas semanas da eleição, apareceu em seu programa com uma cédula na mão e declarou: “Para votar no Silvio Santos, devem marcar no meio da cédula Corrêa. Não aparece meu nome, mas o candidato sou eu”.
O apresentador despontava como favorito, mas o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impugnou a candidatura, a pedido de Fernando Collor de Mello, que solicitou a extinção do PMB, alegando que o partido não havia comprovado o cumprimento da regra de realizar convenções em nove estados.
Entrevista
É nesse contexto que começa “Silvio Santos vem aí”. Quando o PMB lança o nome do apresentador, uma agência é contratada para cuidar da campanha. Para abastecer as peças publicitárias com informações – e, inclusive, vasculhar possíveis contradições na vida do “homem do Baú” –, a agência designa a jornalista Marília (Manu Gavassi) para entrevistá-lo.
A jovem não nutre grande simpatia por Silvio. Ao contrário, mostra certo ceticismo em relação às versões que ele costuma dar à imprensa sobre a própria vida. No entanto, à medida que se aproxima do apresentador, baixa a guarda e muda sua percepção.
É nessas conversas com Marília que Silvio relembra seu primeiro emprego, em 1945, quando estava prestes a completar 15 anos. O Brasil se preparava para uma eleição presidencial e, às vésperas da votação, ele viu um ambulante vendendo capinhas de plástico para proteger o título de eleitor. Resolveu fazer o mesmo. Passou a trabalhar como camelô, não só com capinhas, mas também com canetas, no Centro do Rio de Janeiro, com a ajuda do irmão Leon Abravanel.
Silvio conta, ainda, os insights que o levaram à criação de quadros televisivos que se tornaram clássicos em seu programa de auditório, como “Show de calouros” e “Namoro na TV”, e aborda o episódio do primeiro casamento – com Maria Aparecida Vieira Abravanel –, que ele não tornou público para não chatear suas fãs.
Outros episódios marcantes na trajetória de Silvio Santos, como a disputa judicial que manteve com o diretor de teatro Zé Celso Martinez Corrêa (1937-2023) em torno da área onde está situado o Teatro Oficina, na capital paulista, não são tratados na história.
A maior fragilidade do roteiro de Paulo Cursino, no entanto, é recorrer à bajulação excessiva – não há uma única cena em que algum personagem secundário deixe de elogiar o apresentador – e desnecessária, dada a evidente grandeza do protagonista da história.
Outras figuras do entorno de Silvio que se tornaram famosas – como o locutor Lombardi, o animador de plateia Roque e o dublador Pablo – surgem para fazer comentários rasos à jornalista, desperdiçando a oportunidade de revelar facetas do apresentador conhecidas somente por quem conviveu com ele atrás das câmeras.
As conclusões de Marília, em seu movimento de aproximação com Silvio, esbarram na ingenuidade, quando, por exemplo, ela traça paralelos entre quadros do “Programa Silvio Santos” e a biografia do apresentador. A jornalista conclui que Silvio distribuía brinquedos na “Porta da Esperança” e levava crianças a parques de diversões para compensar a “infância roubada” por ter começado a trabalhar cedo. Já o “Namoro na TV” permitiria que as pessoas encontrassem sua cara-metade, como ele encontrou a sua em Iris Abravanel.
Se o roteiro de “Silvio Santos vem aí” deixa a desejar, a estética do longa e a reconstituição de época não compensam essas fragilidades, sobretudo quando valores atuais são reproduzidos de maneira completamente anacrônica.
“SILVIO SANTOS VEM AÍ”
(Brasil, 2025, 91 min.) Direção: Cris D’Amato. Com Leandro Hassum e Manu Gavassi. Estreia nesta quinta-feira (20/11), nos shoppings BH, Big, Boulevard, Cidade, Contagem, Del Rey, Diamond, Estação, Itaú, Minas, MonteCarmo, Norte, Partage, Pátio, Ponteio, Unimed-BH Minas e Via.