Serginho Marques enfrenta a ELA, mas não se cansa de viver e de cantar
Doença impede o músico de tocar violão, mas ele avisa: 'Fico doido para o sábado chegar e voltar a cantar'. Hoje (25/1), tem show no Buteco d'Avenidinha
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Siga noO cantor e compositor Serginho Marques estreou nos palcos aos 13 anos. Aos 9, aprendeu a tocar violão. Em 2021, o músico foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ELA), doença degenerativa e progressiva que afeta o sistema nervoso, causando paralisia motora irreversível. Tinha 52 anos.
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Conhecido na noite de Belo Horizonte, Serginho, aos 55, luta contra a doença, que dificulta sua carreira. Tem os movimentos reduzidos, está impedido de tocar violão. Porém, continua se apresentando em palcos da cidade. Aos sábados, ele e amigos fazem show às 21h30 no Buteco d'Avenidinha, no Bairro Santa Efigênia. Hoje à noite, vai bater ponto lá.
"Todos têm momentos difíceis e não sou diferente. Existem pessoas em estado muito pior do que o meu. Há dias em que estou bem, outros não. Todo mundo é assim. Não posso reclamar da vida, pois Deus me deu tudo: toquei violão, cantei e ainda canto, joguei bola, corri, caminhei, pedalei, viajei. Enfim, fiz quase de tudo nesta vida. Graças a Deus, sou um cara querido no meio musical”, afirma.
Parece até que Fernando Brant e Milton Nascimento pensavam nele quando lançaram "Nos bailes da vida", especialmente aquele verso: "Todo artista tem de ir aonde o povo está/ Se foi assim, assim será/ Cantando me disfarço e não me canso/ De viver nem de cantar".
Shows aos 9 anos
Pois a “vida de artista” de Serginho começou aos 9 anos, quando ele era atração de festas no Bairro São Geraldo, na Região Leste.
“Aos 13, passei a me apresentar em bares e eventos. Em 1985, me juntei à Caravana da Rádio Inconfidência, fazendo shows pelo interior do estado”, relembra. Aos 16, mudou-se para Salvador, onde prosseguiu cantando.
“Foi bacana, aprendi muito com os músicos baianos. Em Salvador, conheci o cantor e compositor Tavito e nos tornamos parceiros.” Esta parceria rendeu canções do disco solo “Um pouco mais de mim”, lançado por ele em 2003.
Aos 20 anos, de volta a BH, Serginho Marques passou a tocar no Bar Sea Lord, no Gutierrez. Acrescentou música baiana a seu repertório e se tornou um dos pioneiros do axé em Minas.
“Foram seis anos de sucesso no Sea Lord. Em 1993, entrei para o grupo Lombinho com Cachaça, no qual fiquei até 1999.” Paralelamente ao Lombinho, montou a banda Quebra Tudo. “Em 1995, criamos a B. Djala e até lançamos um disco.” Em 2018, passou a fazer parte do bloco Baiana Ozadas, estrela do carnaval de rua de BH.
Há cinco anos, surgiram os primeiros sintomas da ELA. É a mesma doença do britânico Stephen Hawkins (1942-2018), gênio da física e autor do best-seller “Uma breve história do tempo”. Persistente como Serginho, Hawkins dedicou a vida à divulgação da ciência.
Frequentador de academia, o músico andava de bicicleta quando sentiu cansaço excessivo, aos 50 anos. “Um dos braços pesou e pensei em infarto. Fiz vários exames que não resultaram nada e voltei à atividade física”, recorda.
Dias depois, tropeçou no pé direito. “Ele começou a ficar bambo e o mesmo aconteceu dias depois. Fiz teste ergométrico, o cardiologista me encaminhou para o ortopedista. Após exames, disse que era problema neurológico. Um exame constatou atrofia muscular progressiva, que poderia evoluir para ELA. O médico disse que era doença grave, não havia cura. Procurei ficar calmo e não entrar em desespero.”
Um dia de cada vez
A partir dali, a perna direita foi piorando e o músico buscou tratamento no Hospital Sarah Kubitschek. “De lá para cá, tento levar tudo com a maior leveza possível. Afinal, tinha duas opções: viver em luto com a doença ou viver a minha vida, um dia de cada vez. Assim tenho feito.”
Serginho usou órtese e depois passou para a bengala, ainda dirigindo, tocando e cantando. No segundo ano da doença, usava muletas e continuou fazendo de tudo. “Ano passado, fui para a cadeira de rodas e passei a fazer fisioterapia em casa”, relata.
Atualmente, ele usa o aparelho respiratório Trilogy de 16 a 18 horas por dia. “O objetivo é evitar o colapso respiratório. A maioria das pessoas que morre é por falta dele. Parei de tocar violão no ano passado. Quando os movimentos dos braços e mãos diminuíram, vi que não dava mais. Hoje, estou só cantando, inclusive os médicos do Sarah disseram que não sabem como consigo fazer isso.”
Em 2024, Serginho comemorou 40 anos de carreira com um show no Palácio das Artes. Participaram Flávio Venturini, Marcelo Dai, Bauxita, Play, Baianas Ozadas, Eduardo Picoli, Toninho Horta, Neo Andrade e Will Motta, entre outros.
Amigos vêm fazendo vários shows beneficentes para ajudá-lo. “Não consigo cantar várias vezes na semana, com isso a receita diminuiu. Atualmente, eu me apresento no Buteco d'Avenidinha, geralmente ao lado de Marcelo Lopes (teclados), Beethoven (baixo), Wesley Calmon (guitarra) e Ivan Bahia (bateria). Às vezes, também tocam o Lincoln Cheib e os irmãos Wilson e Beto Lopes.”
Wilson Lopes é diretor musical de Milton Nascimento, que ganhou o apelido de “maestro do Bituca”.
Palco e divã
Serginho teve de vender carro, som e violões, mas avisa que continua na ativa. “Isso é o que importa. Ainda tenho dois violões, pois carrego a esperança de voltar a tocá-los. Não posso perder a fé em Deus, espero que o milagre venha a qualquer momento.”
É difícil levar talher à boca, segurar copo d'água e trocar de roupa, mas ele conta que não está triste, pois continua cantando.
“O palco é o meu divã. Lá, estou perto de Deus. O que está me deixando alegre é a música. Primeiramente, a minha fé em Deus, depois a música que me alimenta. Fico doido para o sábado chegar e voltar a cantar.”
SERGINHO MARQUES
Com Wilson Lopes (guitarra), Wesley Calmon (bateria) e Beethoven (baixo). Neste sábado (25/1), às 21h30, no Buteco d’Avenidinha (Avenida do Contorno, 3.379, Santa Efigênia). R$ 15.