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Juraciara Vieira Cardoso
Juraciara Vieira Cardoso
Professora da Universidade Federal de Lavras, graduada em Direito, mestre em Direito Constitucional e doutora em Filosofia do Direito
COLUNA VITALidade

O parceiro é percebido como produto a ser consumido

Essas ferramentas muitas vezes se parecem mais com um cardápio humano, no qual ninguém assume verdadeira responsabilidade com ninguém

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Cada um a seu modo, os aplicativos de namoro prometem “unir pessoas com os mesmos interesses” a um simples deslizar de dedos na tela. Não faz muito tempo que um parceiro amoroso só era possível de ser achado em encontros reais, mas aplicativos como Tinder, Bumble e Hinge transformaram essa realidade e, atualmente, estão entre as formas mais populares para busca de parceiros. No entanto, essa nova realidade, mediada pela tecnologia, pode acabar transformando a forma como nos relacionamos e nos conectamos.

 

 

A razão pela qual muitas pessoas estão preferindo os aplicativos de namoro aos encontros virtuais pode ser creditada a fatores múltiplos, mas o fato de vivermos apressados, correndo de um lado a outro, equilibrando os compromissos profissionais, familiares e sociais, pode ser uma das prováveis causas. Ter acesso imediato a potenciais parceiros amorosos pode ser mesmo bastante convidativo, em lugar de ir a bares, festas ou depender de amigos para apresentar.

 

 

Isso parece uma boa notícia, mas a facilidade de conhecer gente nova não garante necessariamente a profundidade do vínculo estabelecido. Frequentemente usuários relatam sobre o desânimo em relação às pessoas que conhecem nesse tipo de aplicativo, seja em razão da superficialidade da conversa, do excesso de objetividade ou dos encontros decepcionantes do ponto de vista emocional. A cada conversa ou encontro surge a sensação de que o que se deseja naquele ambiente é apenas um amor líquido, no sentido dado a esse termo por Zygmunt Bauman, que dizia que a contemporaneidade favorece o surgimento de laços frágeis.

 

 

A possibilidade de se escolher entre uma infinidade de perfis de possíveis parceiros - que são oferecidos pelo aplicativo baseados em algoritmos que avaliam interesses, localização e padrões de comportamento - pode acabar gerando a sensação de que tem sempre alguém melhor ao próximo deslizar de tela, fazendo surgir daí a sensação de que “o melhor ainda está por vir”. E isso compromete o estabelecimento de laços genuínos, gerando ciclos de relações superficiais, nas quais ninguém quer permanecer muito tempo, pois o horizonte sugere sempre algo mais interessante.

 

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Nessa lógica, o excesso de possibilidade traz também o excesso do descarte, fazendo com que, nesse sentido, a liberdade se transforme em solidão. Como há sempre parceiros disponíveis nunca é preciso negociar ou trabalhar junto questão alguma. Se algo não deu certo, basta novamente voltar ao aplicativo e encontrar um novo parceiro que o algoritmo os disponibilizará segundo padrões individuais. Isso favorece a construção de relacionamentos superficiais, de modo que, em meio a tantas opções, as pessoas se sentem cada vez mais sozinhas diante da dificuldade de construir relacionamentos consistentes.

 

 

É inegável que existem inúmeros relatos felizes sobre os encontros via aplicativo, mas o que a grande maioria das pessoas relata é que, mesmo diante de tantos perfis, os laços estabelecidos tendem a permanecer frágeis, e isso mina a esperança de que um encontro casual possa vir a se tornar uma relação mais profunda. Ao invés de oferecerem um encontro entre duas subjetividades, que vão aos poucos se revelando, essas ferramentas muitas vezes se parecem mais com um cardápio humano, no qual ninguém assume verdadeira responsabilidade com ninguém e o parceiro escolhido é percebido como produto a ser consumido.

 

A conclusão? Não tem conclusão, que fique apenas o alerta!

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