

A polêmica em torno das mulheres CEOs
A igualdade de poder é vista como uma ameaça à uma ordem que historicamente favoreceu os homens
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A recente situação envolvendo Tallis Gomes, CEO da G4 Educação, trouxe à tona o desconforto que alguns homens sentem em aceitar mulheres ocupando posições de liderança equivalente às suas. O empresário afirmou que, “Deus me livre de mulher CEO”, expressando, além de sua preferência pessoal, também uma situação mais profunda, relacionada ao poder e os papéis de gênero. A declaração foi recebida com críticas generalizadas e fez com que o empresário renunciasse ao cargo de CEO de sua própria empresa.
Simone de Beauvoir, no seu livro "O Segundo Sexo", defende que as mulheres foram historicamente relegadas a um papel secundário, vistas como complementares ou subordinadas aos homens em quase todas as esferas da vida. A ascensão de mulheres a posições de poder, como a de CEO, desestabiliza essa narrativa histórica.
Persiste no imaginário popular a ideia de que, ao ocupar espaços de poder, as mulheres se “masculinizam”, reforçando a noção errônea de que o poder é exclusivamente masculino, e que as mulheres que ocupam tais espaços estariam abandonando sua essência feminina. A questão que se coloca é: o que é essa tal essência feminina? Simone de Beauvoir novamente nos socorre, defendendo que essa tal “essência” é uma construção social que oprime as mulheres, forçando-as a aceitar papéis de passividade e submissão. A mulher, ao assumir um cargo de liderança, rompe com a construção histórica daquilo que significa ser feminina, redefinindo o conceito. Isso faz com que alguns homens encontrem certa dificuldade em lidar com essa nova forma de feminilidade que não se encaixa nos moldes tradicionais.
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Roland Barthes, em "Fragmentos de um Discurso Amoroso", nos ajuda ainda mais a entender a questão. Ele sugere que, nas relações, o parceiro se torna um espelho que reflete nossas próprias inseguranças. A crença de que uma mulher CEO colocaria o lar, o parceiro e os filhos em segundo plano reflete ansiedades e inseguranças projetadas sobre o impacto do sucesso feminino na dinâmica familiar. Para Barthes, essa projeção revela, na verdade, um medo de perder o controle ou a centralidade no relacionamento, o que poderia ser uma ameaça ao equilíbrio de poder que tradicionalmente é favorecido para homens.
A fala de Tallis, ao contrário do que ele próprio pode ter imaginado, revela mais do que uma simples preferência, demonstra que, para muitos homens, compartilhar o mesmo espaço de poder com uma parceira significa uma desafiadora reconfiguração das relações. Nesse sentido, a igualdade de poder é vista como uma ameaça à uma ordem que historicamente favoreceu os homens.
O que assistimos é uma transformação, na qual as mulheres estão cada vez mais ocupando espaços de liderança, desafiando as normas tradicionais de gênero. Para muitos homens, acostumados a ocupar o centro dessas esferas, essa mudança pode parecer uma ameaça, pois exige uma reconfiguração, não apenas dos papéis profissionais, mas também dos relacionamentos pessoais.
Por trás de falas como a do CEO, de que não quer se relacionar com uma CEO, está a dificuldade de alguns homens em aceitar a ressignificação dos espaços de poder. A mulher CEO é um símbolo dessa nova realidade, e o verdadeiro desafio para muitos homens é entender que essa transformação não enfraquece suas próprias posições, mas, ao contrário, pode gerar um novo equilíbrio onde a parceria se constrói com base na igualdade e no respeito mútuo, como deveria ter sido desde sempre!
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