O que assistimos é uma transformação na qual as mulheres estão cada vez mais ocupando espaços de liderança, desafiando as normas tradicionais de gênero -  (crédito: 89Stocker)

O que assistimos é uma transformação na qual as mulheres estão cada vez mais ocupando espaços de liderança, desafiando as normas tradicionais de gênero

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A recente situação envolvendo Tallis Gomes, CEO da G4 Educação, trouxe à tona o desconforto que alguns homens sentem em aceitar mulheres ocupando posições de liderança equivalente às suas. O empresário afirmou que, “Deus me livre de mulher CEO”, expressando, além de sua preferência pessoal, também uma situação mais profunda, relacionada ao poder e os papéis de gênero. A declaração foi recebida com críticas generalizadas e fez com que o empresário renunciasse ao cargo de CEO de sua própria empresa. 

 

 

Simone de Beauvoir, no seu livro "O Segundo Sexo", defende que as mulheres foram historicamente relegadas a um papel secundário, vistas como complementares ou subordinadas aos homens em quase todas as esferas da vida. A ascensão de mulheres a posições de poder, como a de CEO, desestabiliza essa narrativa histórica. 

 

 

Persiste no imaginário popular a ideia de que, ao ocupar espaços de poder, as mulheres se “masculinizam”, reforçando a noção errônea de que o poder é exclusivamente masculino, e que as mulheres que ocupam tais espaços estariam abandonando sua essência feminina. A questão que se coloca é: o que é essa tal essência feminina? Simone de Beauvoir novamente nos socorre, defendendo que essa tal “essência” é uma construção social que oprime as mulheres, forçando-as a aceitar papéis de passividade e submissão. A mulher, ao assumir um cargo de liderança, rompe com a construção histórica daquilo que significa ser feminina, redefinindo o conceito. Isso faz com que alguns homens encontrem certa dificuldade em lidar com essa nova forma de feminilidade que não se encaixa nos moldes tradicionais.

 

 

Roland Barthes, em "Fragmentos de um Discurso Amoroso", nos ajuda ainda mais a entender a questão. Ele sugere que, nas relações, o parceiro se torna um espelho que reflete nossas próprias inseguranças. A crença de que uma mulher CEO colocaria o lar, o parceiro e os filhos em segundo plano reflete ansiedades e inseguranças projetadas sobre o impacto do sucesso feminino na dinâmica familiar. Para Barthes, essa projeção revela, na verdade, um medo de perder o controle ou a centralidade no relacionamento, o que poderia ser uma ameaça ao equilíbrio de poder que tradicionalmente é favorecido para homens. 

 

A fala de Tallis, ao contrário do que ele próprio pode ter imaginado, revela mais do que uma simples preferência, demonstra que, para muitos homens, compartilhar o mesmo espaço de poder com uma parceira significa uma desafiadora reconfiguração das relações. Nesse sentido, a igualdade de poder é vista como uma ameaça à uma ordem que historicamente favoreceu os homens. 

 

 

O que assistimos é uma transformação, na qual as mulheres estão cada vez mais ocupando espaços de liderança, desafiando as normas tradicionais de gênero. Para muitos homens, acostumados a ocupar o centro dessas esferas, essa mudança pode parecer uma ameaça, pois exige uma reconfiguração, não apenas dos papéis profissionais, mas também dos relacionamentos pessoais.

 

Por trás de falas como a do CEO, de que não quer se relacionar com uma CEO, está a dificuldade de alguns homens em aceitar a ressignificação dos espaços de poder. A mulher CEO é um símbolo dessa nova realidade, e o verdadeiro desafio para muitos homens é entender que essa transformação não enfraquece suas próprias posições, mas, ao contrário, pode gerar um novo equilíbrio onde a parceria se constrói com base na igualdade e no respeito mútuo, como deveria ter sido desde sempre!


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