
O Congresso dos lobbies
O fim do PSDB como partido de vocação presidencial, e do MDB e do PFL como partidos fortes, abriu espaço para partidos arrivistas
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O Congresso dominado por partidos invertebrados do Centrão ficou disfuncional para a sociedade brasileira. Virou a rotina o conluio entre bancadas regionais muito particularistas, capazes de formar maioria contra o interesse coletivo para beneficiar pequenos grupos, a favor às vezes de uma grande empresa encalacrada em algum reduto de parlamentares. O fim do PSDB como partido de vocação presidencial, e do MDB e do PFL como partidos fortes, abriu espaço para partidos arrivistas, turbinados pelos fundos partidário e eleitoral e pelas emendas. Basta examinar decisões recentes para identificar o viés particularista em ação.
A derrubada de vetos presidenciais a jabutis inseridos no projeto que regula a energia eólica offshore preserva “inserções” que ferem a boa técnica legislativa e, talvez, a Constituição, a favor de interesses com CNPJ e CPF. A prorrogação do Proinfra já superado econômica e tecnologicamente, criado para incentivar o início da geração de novas energias, pereniza contratos com preços inteiramente fora de mercado. O kilowatt/hora custa 2,5 a 3 vezes mais que os valores hoje praticados.
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A obrigatoriedade de compra de energia de PCHs (pequenas hidrelétricas), a custos muito altos e forte impacto ambiental, algumas ainda nem construídas, tem endereço certo. Decisões que favorecem um punhado de empresas ineficientes com tecnologia ultrapassada, baixa produtividade, adquiridas por notórios especuladores que se valem da eficácia de seu lobby no Congresso.
Ficaram faltando dois outros expedientes que obrigam a compra de energia de térmicas a carvão, as mais sujas do mundo, e a construção de gasodutos caríssimos e de alto impacto ambiental, totalmente desnecessários. Esses vetos só não serão derrubados se o governo ceder e incluir os jabutis no projeto que o ministro de Minas e Energia elabora, de luz e gás para todos. O problema é que o projeto do MME provocará um aumento do gasto público.
O Congresso jamais discutiu alternativas compatíveis com a necessária transição energética a esses projetos de baixa qualidade. O que tem debatido é sempre benefícios a empresários ricos, que não melhoram a economia brasileira e espetam a conta bilionária nos boletos dos consumidores.
Os partidos do centrão não precisam mais se preocupar com o eleitor. Asseguram o voto com as emendas. Por isso se dedicam a representar os lobbies. Está evidente que o governo é minoritário no Congresso. Mais ainda, não tem espaço para compor uma coalizão majoritária funcional. Perto de 60% dos votos que contrariaram a orientação governamental vieram de partidos que têm gordos ministérios no governo.
Não é que MDB e PFL não fossem fisiológicos. Eram. Entretanto, eram também mais estruturados e seguiam a orientação das lideranças. Estas, permaneciam fiéis ao governo uma vez acertados os acordos de cargos e verbas públicas. Um mal menor, ainda que aquém da boa política orientada por programas. Hoje, descumprem o acordado.
O PSDB tinha, de início, mais visão nacional e protagonizou políticas públicas de qualidade — além do Plano Real — como o “Toda criança na escola”, para universalização do ensino fundamental, a estruturação do SUS, depois ampliado pelo primeiro governo Lula, os medicamentos genéricos e o próprio Proinfra, muito inicial e tímido, mas um começo. Na trajetória de decadência, foi dominado por grupos contrários às necessidades do país, como defensores de grileiros e desmatadores no Norte. Finalmente, morreu de anemia, deixando vaga a posição que ocupava no eixo bipartidário de disputa presidencial.
Analisei as coalizões dos governos FHC I e II, Lula I e II e Dilma. Nas do presidente do PSDB, o partido pivô, que dava articulação majoritária à coalizão, foi o PFL e, subsidiariamente, o PMDB. Nos governos do PT, o partido-pivô que tinha o papel de estender a coalizão para além da esquerda, foi o PMDB. Este, só mudou para MDB, sintomaticamente, no governo Temer, início de sua decadência.
De pivô, mudou para protagonista da ruptura da coalizão do governo Dilma, abrindo caminho para o impeachment da presidente. Bombados pelos fundos partidário e eleitoral e pelas emendas, que são fortes anabolizantes, os partidos do Centrão serão muito competitivos nas eleições de 26 e a situação atual pode não ser modificada. As propagandas enganosas em horário nobre na TV, geringonça brasileira, são parte desses esteróides. O próximo governo eleito terá os mesmos problemas de governabilidade, ou será um peão desses partidos e seus lobbies.
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