Criada pelo escritor Lewis Carrol, Alice quebra o espelho, atravessa o mundo narcísico e ingressa no País das Maravilhas. Mia Wasikowska interpreta a personagem no filme de Tim Burton
 -  (crédito: Disney/divulgação)

Criada pelo escritor Lewis Carrol, Alice quebra o espelho, atravessa o mundo narcísico e ingressa no País das Maravilhas. Mia Wasikowska interpreta a personagem no filme de Tim Burton

crédito: Disney/divulgação

 

Vivemos mergulhados em narrativas próprias. Narrativas recheadas de sentidos imaginários que sustentam nossa autoimagem, por equivocada que seja. Damos sentido próprio ao mundo. Erramos carregando nas costas o peso de uma história petrificada, incrustada na pedra do eu. E é no processo analítico que podemos rearranjar essas construções, deixando-as cair e nos libertando de aprisionamentos, até então essenciais.

 


Desvestir a roupa e deixar que, de um lugar atópico, do real e inconsciente, escutemos o ecoar de verdades soterradas, das quais vivemos as consequências sintomáticas. Fracassamos, rivalizamos, desesperamos, nos culpamos e metemos os pés pelas mãos. Sustentamos histórias que não são nossas.
Apenas quando retificamos nossas posições, amarrações, enlaces e desenlaces nos damos conta de que as desilusões foram imprescindíveis e significaram o quanto é preciso acertar as coordenadas do desejo e aliviar a carga da fantasia, da ilusão carregada. E como pesam...


Apresento hoje o livro “Da desilusão”, organizado por Ana Maria Portugal, Gilda Vaz, Regina Beatriz Simões e Maria Auxiliadora Bahia, lançado pela Conceito Editorial. Um trabalho primoroso coordenado por José Eduardo Gonçalves, que conta com preparação e revisão de Leonardo Mordente e capa de Diogo Droschi.

 

 

Onze textos apontam para o campo aberto em que a desilusão pode funcionar como operadora. No posfácio, Márcia Rosa atesta o valor da palavra escrita na abordagem de um tema tão complexo e delicado, como uma aposta do tratamento da desilusão pela escrita.


Um tema central e contemporâneo que, sob o olhar da psicanálise, indica o quanto a desilusão é indispensável e bem-vinda. Sem ela, seria impossível reconhecer-se, pois estaríamos colados em versões familiares, ideais da cultura ou a um juízo crítico mais severo ainda, o nosso próprio, nos amarrando os pés para no rio turvo do imaginário nos afogar.


Escrita pelo querido Fabio Borges, a orelha nos convida a atravessar o mundo narcísico, a crença no eu que nos ilude com um significado só, pleno. Evoca a personagem de Lewis Carroll, Alice, que quebra o espelho para entrar no País das Maravilhas.

 


Prefácio de Jacques Fux, com a sempre boa lembrança de Guimarães Rosa: “Nesta vida embrejada a gente vive mesmo é para se desiludir e desmisturar.” E ainda Freud em suas reflexões sobre a desilusão e a morte nos tempos da Primeira Guerra, diante da incapacidade do homem de resolver seus conflitos pacificamente. Finalmente, aponta o 7 de outubro de 2023, quando o presente se torna desilusão, e as massas escancaram o ódio e a estrangeiridade do outro em si.


As autoras são Ana Lúcia Bahia, Ana Maria Portugal, Carla de Abreu Machado Derzi, Cidléa Barbosa, Gilda Vaz, Maria Auxiliadora Bahia, Regina Beatriz Simões, Regina Pachêco, Regina Teixeira da Costa, Rosely Gazire Melgaço e Thaïs Gontijo.


Embora falemos da desilusão, a mensagem fundamental do livro é que ela nos permite a melhor saída!