Escalada de tensões na etapa decisiva do julgamento de Jair Bolsonaro
O julgamento ocorre em meio a forte polarização. O destino judicial do ex-presidente e seus generais se entrelaça com tensões políticas, diplomáticas e econômic
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O julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus pela tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023 recomeça hoje, na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), com uma escalada de tensões políticas. No domingo, num ato em apoio ao ex-presidente na Avenida Paulista, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PR), fez duros ataques ao Supremo e ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.
Tarcísio tenta conquistar o apoio de Bolsonaro para se candidatar à Presidência da República e subiu o tom contra o Supremo. Enquanto manifestantes gritavam “fora, Moraes”, na Avenida Paulista, o governador paulista disparou: “Por que vocês estão gritando isso? Talvez porque ninguém aguente mais. Ninguém aguenta mais a tirania de um ministro como Moraes. Ninguém aguenta mais o que está acontecendo nesse país”.
Decano da Corte, em resposta, o ministro Gilmar Mendes publicou uma nota nas redes sociais em defesa do Supremo. “Não há no Brasil 'ditadura da toga', tampouco ministros agindo como tiranos. O STF tem cumprido seu papel de guardião da Constituição e do Estado de Direito: o que o Brasil realmente não aguenta mais são as sucessivas tentativas de golpe que, ao longo de sua história, ameaçaram a democracia e a liberdade do povo”. Segundo o ministro do Supremo, “crimes contra o Estado democrático de direito são insuscetíveis de perdão!”
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O julgamento eleva a radicalização política a um novo patamar, com o mesmo viés golpista que antecedeu o 8 de janeiro. Parece um filme que estava com a imagem congelada e voltou a rodar. Entretanto, representa um divisor de águas na história do Brasil. Pela primeira vez, um ex-chefe de Estado e oficiais-generais das Forças Armadas são levados ao banco dos réus por conspirarem contra a ordem constitucional.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) sustenta que houve uma articulação criminosa para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, anular o resultado das eleições de 2022 e instaurar um regime de exceção.
NEGATIVA DE AUTORIA
Segundo a Procuradoria-Geral da República, Bolsonaro liderava o chamado “núcleo crucial” de uma organização criminosa. Esse núcleo reunia ex-ministros, assessores próximos e militares de alta patente, todos empenhados em sustentar a narrativa de fraude eleitoral e preparar medidas para inviabilizar a posse de Lula.
Entre as provas listadas estão os depoimentos de delatores, como Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro na Presidência da República, mensagens apreendidas em celulares, relatórios militares e a famosa “minuta de decreto” encontrada na casa do ex-ministro Anderson Torres.
O documento previa medidas extraordinárias, como a instauração de “estado de defesa” e a prisão de ministros do Supremo Tribunal Federal.
No entendimento da Procuradoria-Geral da República, havia um plano consistente para abolição violenta do Estado democrático de direito.
Relatos de reuniões no Palácio da Alvorada e tentativas de quebra de hierarquia nos quartéis apontam que se discutiu inclusive a possibilidade de assassinato ou prisão de autoridades, numa escalada de radicalização que culminaria nos ataques do dia 8 de janeiro, quando sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas em Brasília.
Bolsonaro e seus auxiliares são acusados de tentativa de golpe de Estado, organização criminosa, incitação à violência, dano qualificado ao patrimônio público e ataque a bens tombados.
Suas defesas – exceção para o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que fez delação premiada – têm em comum a alegação de que não há provas suficientes para sustentar a denúncia da PGR.
A delação de Mauro Cid é desqualificada como prova central. O documento com a “minuta do golpe” encontrado com Anderson Torres também. Assim, não haveria materialidade que configure tentativa de golpe.
Outra linha de argumentação é a de que Jair Bolsonaro e seus aliados sempre atuaram dentro das alternativas previstas pela Constituição. Nenhum decreto foi publicado, nenhuma ordem militar foi dada, afirmam.
Os advogados também acusam o Supremo de atropelar o devido processo legal e cercear a defesa. Bolsonaro foi “dragado”. Generais acusados negam qualquer plano de ruptura. Reforçam que, se houve crimes, foram atos isolados de indivíduos, não um projeto coordenado pelo governo.
POLARIZAÇÃO
O julgamento ocorre em meio a um ambiente político de forte polarização. O destino judicial de Bolsonaro se entrelaça, assim, com tensões diplomáticas e econômicas mais amplas. O cenário externo pressiona.
O presidente norte-americano Donald Trump tem atacado Lula e defendido Bolsonaro em discursos e entrevistas, apresentando-o como vítima de perseguição judicial.
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Ao mesmo tempo, a relação Brasil-EUA atravessa uma crise comercial causada pelo tarifaço imposto por Trump contra exportações brasileiras, o que dá um contorno geopolítico ao julgamento.
A oposição se organiza para ganhar novamente as ruas e transformar o processo em bandeira contra o governo e contra o Supremo Tribunal Federal.
No Congresso Nacional, parlamentares bolsonaristas anunciaram obstrução de pautas e pedem uma anistia ampla para os envolvidos no 8 de janeiro. O julgamento é um campo de batalha simbólico sobre os limites da democracia brasileira.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.