Impacto negativo do tarifaço de Trump pôs a oposição na defensiva
O que era uma acusação da oposição contra Lula, a partidarização e a contaminação ideológica da política externa, voltou-se contra Bolsonaro e Tarcísio
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Não durou 24 horas a euforia da oposição com o apoio dado ao ex-presidente Jair Bolsonaro pelo presidente Donald Trump, que atacou o Supremo Tribunal Federal (STF) por causa do julgamento do ex-presidente, e impôs uma tarifa de mais 50% sobre os produtos brasileiros em retaliação ao governo Lula, por sua atuação nos Brics. A repercussão foi muito negativa, inclusive para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que havia responsabilizado o presidente Lula pela decisão absurda e sem precedentes do presidente norte-americano.
A reação formal do governo a Trump ocorreu em nível diplomático, a carta foi devolvida, e no plano político, com o presidente Lula refutando suas alegações em nota oficial firme, porém, moderada. Nas redes sociais, entretanto, houve uma forte mobilização política dos brasileiros, que criticaram Trump no seu próprio perfil do X.
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Na política interna, sobrou principalmente para Bolsonaro e Tarcísio, que apoiam incondicionalmente Trump e tentam culpar Lula pelo tarifaço. A resposta veio na linha do secretário de Comunicação da Presidência, Sidônio Palmeira, que não deixou por menos: “Lula quer taxar os super-ricos, Bolsonaro quer taxar o Brasil”.
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O governo surfou na onda da rejeição popular à decisão de Trump. Levantamento da AP Exata, feito com base em 260 mil publicações, revela que 59% criticaram a medida e cobraram uma reação do Brasil. Apenas 22% manifestaram apoio à decisão dos Estados Unidos, enquanto 18% mantiveram tom neutro, mas pediram que o governo atue com racionalidade.
Entre os que discutem solução para o problema, 61% defendem acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC). Outros 24% preferem o uso da reciprocidade de forma limitada, somente após o fracasso de negociações. Há ainda 15% que rejeitam qualquer tipo de retaliação, por temerem uma escalada prejudicial à economia brasileira.
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A guerra de narrativas sobre a responsabilidade de cada um na crise também está sendo prejudicial a Bolsonaro e Tarcísio, que inicialmente culparam Lula pelo tarifaço, mas esse não é o entendimento da maioria: para 48%, a culpa é de Trump e de sua política protecionista; um terço responsabiliza a polarização brasileira entre lulismo e bolsonarismo. Somente 11% culpam exclusivamente Lula e outros 9% apontam as pressões da direita brasileira sobre os Estados Unidos como responsável pela medida.
O que era uma acusação da oposição contra Lula, a partidarização e a contaminação ideológica da política externa, voltou-se assim contra Bolsonaro, por causa da atuação de seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos Estados Unidos. O parlamentar articulou as pressões da extrema direita republicana para Trump aplicasse sanções contra o Brasil, por causa do julgamento de seu pai. Ao anunciar o tarifaço, a Casa Branca exigiu que o Supremo Tribunal Federal (STF) encerre o julgamento de Jair Bolsonaro no caso da tentativa de golpe de 8 de janeiro.
Sanção política
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Ao agradecer publicamente a Trump, Bolsonaro fomentou essa percepção e deu de bandeja a bandeira do patriotismo para Lula, o que era um monopólio da oposição. O governador Tarcísio de Freitas, chamuscado, também começou a mudar sua narrativa. Admitiu que a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros terá impacto “negativo” para São Paulo. Disse ainda que a medida do governo dos EUA é “deletéria” para o estado, porque “pega empresas importantes, como, por exemplo, a Embraer, que fechou grandes contratos agora recentemente”.
O governador paulista afirmou que a sua gestão já está “conversando com a embaixada' americana, mas que cabe ao governo federal estabelecer uma mesa de negociação, deixando as “questões ideológicas de lado”. Na quarta-feira, o governador dissera em suas redes sociais que “a responsabilidade é de quem governa” e que “Lula colocou sua ideologia acima da economia, e esse é o resultado”. Agora, se deu conta de que o estado mais prejudicado com as sanções é São Paulo, nosso maior exportador de produtos industrializados e alimentos para os Estados Unidos.
Os principais produtos exportados para os EUA são óleos brutos e combustíveis de petróleo, produtos de ferro e aço, aeronaves, café e celulose. Já os mais importados pelo Brasil são motores e máquinas não elétricos, óleos combustíveis e brutos de petróleo, aeronaves e gás natural. A balança comercial entre Brasil e EUA ficou positiva para os americanos em cerca de US$ 300 milhões, pois compraram US$ 40,4 bilhões em produtos do Brasil (12% das exportações brasileiras) e nos venderam US$ 40,7 bilhões (15,5% das importações do Brasil).
A taxa determinada para o Brasil é a maior anunciada pelo presidente Trump. Entre os países já notificados, estão Japão e Coreia do Sul, ameaçados com uma tarifa extra de 25%. Trump também apresentou na segunda-feira planos para uma tarifa de 40% sobre produtos de Mianmar e Laos, de 36% sobre o comércio de Tailândia e Camboja, de 35% sobre produtos da Sérvia e Bangladesh, de 32% sobre a Indonésia, de 30% sobre itens da África do Sul e de 25% sobre Malásia e Tunísia. As Filipinas terão uma tarifa de 20%. Entretanto, todas as decisões fora de natureza econômica. O tarifaço aplicado ao Brasil é uma sanção de natureza política.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.