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Luiz Carlos Azedo
ENTRE LINHAS

Inquéritos sobre emendas parlamentares seguem o rastro do dinheiro desviado

A PF apura desvios de verbas destinadas a prefeituras, em inquéritos a cargo de ministros do STF, entre eles, Flávio Dino, Carmen Lúcia, Cristiano Zanin

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A 316 km de Fortaleza, a cidade de Nova Russas tem 102 anos e nunca viu tanto dinheiro como agora. Com 742 km2 e 30 mil habitantes, no Sertão de Crateús, semiárido nordestino, com um PIB de R$ 118 milhões anuais, ao sopé da Chapada do Ibiapaba, é um “case” de como funcionam os esquemas de desvios de verbas das emendas parlamentares. Às margens dos rios Acaraú, Poti e Curtume, terras que já pertenceram aos tabajaras, caratiú e os temidos tupinambás, a cidade é o principal alvo da Operação Underhand (Desonesto) da Polícia Federal.


Sob autorização do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes (STF), a PF cumpriu 15 mandados de busca e apreensão em Brasília e outras quatro cidades do Ceará: Fortaleza, Eusébio, Canindé e Baixio, além de Nova Russas. O alvo principal é o deputado federal Júnior Mano (PSB CE), suspeito de atuar como cabeça de uma organização criminosa que desviava emendas parlamentares e manipulava eleições municipais em até 51 cidades cearenses.


Casado com a prefeita de Nova Russas, Giordanna Mano (PRD, Júnior Mano já foi do PRB, PSD, MDB, Patriota e do PL, do qual foi expulso por apoiar o candidato do PT em Fortaleza. Desde o ano passado, está no PSB. A PF alega que Júnior Mano teve papel central nos desvios de recursos públicos por meio de licitações fraudulentas, compra de apoio eleitoral e uso de caixa2? em campanhas municipais de2024.? Outros prefeitos estão envolvidos no esquema, a partir do desvio de verbas via emendas, com cobrança de “pedágio” de 12% do valor, repassados para empresas de fachada. Somente Nova Russas recebeu R$4,?4 milhões em recursos entre 2021 e 2025, o maior montante destinado por Junior Mano.

 


Nos últimos anos, as emendas parlamentares – mecanismo legítimo de alocação de recursos do Orçamento da União por deputados e senadores – tornaram-se foco de diversas investigações, seja por suspeitas de corrupção, direcionamento ilegal de verbas, favorecimento político ou uso como moeda de troca entre o Legislativo e o Executivo. O caso mais notório é o das chamadas emendas de relator (RP9), que estiveram no centro do escândalo das emendas do orçamento secreto, revelado a partir de 2020.


Bilhões de reais foram distribuídos com pouca ou nenhuma transparência. O esquema permitia que parlamentares indicassem, por meio de interlocução com os relatores do orçamento, a destinação de recursos para municípios e estados com os quais mantinham relações políticas, sem registro público formal de autoria. Essas emendas se tornaram um instrumento de compra de apoio eleitoral. Intermediários, incluindo prefeitos, empresas contratadas e operadores políticos formaram um sistema paralelo de liberação orçamentária.

 

Emendas secretas

 

Diversos inquéritos foram abertos para apurar fraudes em licitações, sobrepreço em obras, desvios na aquisição de tratores e ambulâncias, e uso de empresas de fachada. Em 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão da ministra Rosa Weber, suspendeu a execução das emendas de relator e exigiu maior transparência. A decisão foi posteriormente referendada pelo plenário da Corte.


Em 2022, porém, o Congresso aprovou resolução estabelecendo novos critérios de publicidade para as emendas RP9, mas o controle ainda é frágil e o sistema foi apenas disfarçado, com parte dos recursos sendo redirecionada para outras modalidades, como as emendas de comissão. Cerca de 20 inquéritos sigilosos estão em pleno curso, investigando o desvio de emendas parlamentares. especialmente no Norte e no Nordeste, onde há maior concentração de recursos dessas emendas. O TCU identificou que, entre 2019 e 2022, aproximadamente R$ 54 bilhões foram distribuídos por meio das RP9.


Em estados como Maranhão, Piauí, Alagoas e Amazonas, há investigações sobre o superfaturamento de kits de robótica, poços artesianos e retroescavadeiras financiados por essas emendas. Outro foco de investigação envolve as chamadas emendas PIX, transferências diretas para contas de prefeituras via transferências especiais, sem necessidade de convênios. Criadas em 2019, essas emendas aumentaram a capilaridade dos parlamentares e não são rastreáveis.


Apesar da gravidade dos indícios, em razão do foro privilegiado e da falta de estrutura investigativa autônoma, o Congresso se recusa a revelar a destinação das emendas secretas. Iniciativas da sociedade civil, como o projeto “De Olho nas Emendas”, do portal Congresso em Foco, e ações da Transparência Brasil, têm ajudado a tornar públicas as informações sobre autorias, beneficiários e valores liberados, pressionando por mais prestação de contas.

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Em 2025, os inquéritos que apuram desvios de emendas para prefeituras foram distribuídos aos ministros do STF Flávio Dino, Carmen Lúcia, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Nunes Marques. São investigados parlamentares suspeitos de envolvimento em licitações fraudulentas e superfaturamento, com uso de emendas como moeda de troca. No plano institucional, especialistas defendem a criação de um sistema integrado de rastreabilidade orçamentária, com transparência ativa, indicadores de eficiência, e vinculação obrigatória das emendas a metas públicas previamente estabelecidas.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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