Gustavo Nolasco
Gustavo Nolasco
DA ARQUIBANCADA

O menino Maurício e a Folia do Rei de Copas

O garoto cresceu e se fez Tizumba. Um dos mais talentosos artistas do país. Correu o mundo, o Brasil e cidades de Minas que dessem pouso ao seu "conga"

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Mais de 106.000 cruzeirenses faziam as arquibancadas do Mineirão dançarem. O gigante de concreto se mexia, vibrava e ganhava vida. Maurício, com seu sorriso largo e os cabelos trançados, se deixava misturar, levado pelo ritmo do placar a marcar 1 a 0 para o seu Cruzeiro contra o Sporting Cristal, do Peru. Seus olhos marejados, com se quisessem derramar lágrimas de devoção pelo rosto de pele preta.

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Os cânticos entoados pela torcida seguiam a batida forte dos tambores e os agudos das caixas de tarol e dos repiliques. A folia do Povão Azul era a representação mais sagrada da fé no Cruzeiro e no seu escrete.

O tempo era rei e à medida de sua passagem em nosso terreiro, o goleiro Dida ia se incorporando em muralha. Um divino negro a fechar o corpo celeste contras armas de nossos inimigos. Definitivamente, naquela noite, os chutes dos peruanos não nos alcançariam.

O apito final pegou Maurício extasiado. Sua camisa do Cruzeiro empapada de suor e alegria. Dançava e cantava como se estivesse seguindo com os caixeiros, mestres, contramestres e violeiros de Nossa Senhora do Rosário a carregarem bandeiras e coroas de Minas Gerais para todos os cantos da América do Sul.

Aquela noite de 13 de agosto de 1997 ficou marcada como a Folia do Rei de Copas. Jamais saiu da memória do cruzeirense Maurício Lino Moreira, o Maurício Tizumba, um dos mais importantes artistas e guardiões da cultura, da religiosidade e das tradições musicais de matrizes africanas no Brasil.

Esse menino Maurício cresceu cruzeirense na periferia de Belo Horizonte. Por entre ruas e terreiros do bairro Aparecida, na região Noroeste. Dividindo o tempo entre as batidas de caixa na Irmandade de Congo e Moçambique de Nossa Senhora do Rosário da comunidade dos Carolinos e as escapadas com os outros moleques pelas trilhas que levavam até a Pampulha, onde, ainda esqueleto, no início da década de 1960, se erguia o futuro estádio Mineirão.

Foi nessa época, com seis anos de idade, que ele pensou em trocar a sua paixão por outro time “azul e branco” e – assim como o Cruzeiro – de origem operária: o Siderúrgica, de Sabará, que havia acabado de se sagrar campeão mineiro de 1964.

A virada de folha durou pouquíssimo. No ano seguinte, Seu Antônio Lourenço, amigo da família, resolveu juntar meia dúzia de moleques dos Carolinos e rumar por entre os carros da avenida Catalão até o recém-inaugurado Mineirão. Entre eles estava o pequeno Maurício.

A Academia Celeste de 1966 se encarregou do restante. Colocou o Cruzeiro definitivamente no coração menino e deu a ele seus primeiros ídolos negros, como ele: Evaldo, Zé Carlos e Dirceu Lopes, apelidado de forma racista pela imprensa argentina de “El Negrito”.

Maurício cresceu e se fez Tizumba. Um dos mais talentosos artistas populares do país. Correu o mundo, o Brasil profundo e todas as cidades e casas desta Minas Gerais que dessem pouso ao seu “congar”. E foi assim, nesse interior mineiro cruzeirense, que ele foi arrumando jeitinho de ir matando a saudade de estar nas arquibancadas do Mineirão.

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Basta sobrar um tempo livre em Belo Horizonte para o menino moleque Maurício voltar a sacudir Tizumba, lhe puxando como chocalho nos tornozelos, em um chamado para correr para o Mineirão de novo. “Ah, eu adoro ser Cruzeiro!” Cerveja a lhe alimentar a alma; tropeiro a lhe dar energia ao corpo e o Cabuloso a lhe renovar a devoção por suas origens.

Salve, Tizumba! Salve, Nossa Senhora do Rosário! Salve, nosso Cruzeiro Rei de Copas!

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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