Haute couture, n'est pas?
Um país é tão mais civilizado quanto mais a Arquitetura é valorizada
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SIGA NOPierre Cardin foi da moda, mas flertou com a Arquitetura (se inscrevendo numa universidade francesa) pouco antes de montar o próprio atelier, logo após desenhar para Christian Dior. Os traços geométricos (e a Arquitetura) sempre estiveram ali, presentes em suas criações, lembrando a convergência das estampas inspiradas na arte de Piet Mondrian criadas por Yves Saint Laurent para peças de sua Maison.
Os vestidos inspirados em Mondrian foram, possivelmente os mais copiados de toda a história, demonstrando a capacidade do cidadão comum de compreender - e apostar - no que é extraordinário, bonito, harmônico e rico, para além dos dourados, dos brilhos e dos balangandãs (afinal, quem se deixa seduzir por dourado, coisa brilhante e balangandã é peixe, e não gente).
Coco Chanel dizia que “a moda passa, mas o estilo permanece". Dizia, ainda, que “para ser insubstituível, deve-se sempre ser diferente", na mesma linha do enfant-terrible Jean Cocteau que, lá atrás, declarou que “o estilo é uma maneira muito simples de dizer coisas complicadas”.
Pierre Cardin dizia que “a moda é a transmissão da civilização", assim como são a Arquitetura e seus prédios, suas casas, museus, escolas e qualquer outro elemento construído. Mas com uma “pequena” diferença: os elementos construídos duram séculos, atestando a incompetência e a falta de criatividade de forma contundente e - praticamente – eterna.
Na Arquitetura, o que é ruim dura tanto tempo, que os impactos negativos e a feiura perduram por gerações. A “falta de estilo”, na moda, é um problema exclusivo de quem usa; na Arquitetura, um problema de todos, e por décadas.
Como explicar, então, o cuidado que aplicado à moda na criação dos padrões e dos tecidos, no desenho das peças de vestuário e nos acessórios, e na fabricação dos produtos quando falamos de moda, mas o oposto, com o desleixo, a improvisação e a preguiça quando se trata de prédios?
Como explicar a dedicação e o empenho em produtos de curta duração e baixo custo, em oposição à falta de cuidado, de gosto e de originalidade em edificações caríssimas, e que duram - quase - para sempre?
Por que a civilização e a cultura permeiam a moda, mas não estão presentes em 95% dos prédios construídos? Por que o estilo é reverenciado na moda, mas não na Arquitetura? Por que tantos prédios tão feios e repetitivos, quando a moda investe em designs que confiram diferenciação, identidade e personalidade?
Não que eu esteja reclamando, até porque, enquanto sócio de uma incorporadora que só investe em prédios de alto valor estético, com identidade única e personalidade marcante, uma concorrência de baixo nível não apenas não incomoda, quanto ajuda.
Mas enquanto cidadão, incomoda e incomoda muito. Enquanto pai, incomoda muito. Enquanto consumidor de arte e cultura, incomoda muito. Enquanto belo-horizontino, incomoda muito.
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Incomoda que as cidades estejam cada dia mais feias, que os prédios sejam cada dia menos inspirados e menos interessantes, menos originais e mais parecidos. Incomoda saber que essa epidemia de feiura estará aqui por, pelo menos, 4 gerações, piorando as cidades.
Se a moda carrega cultura, o mercado imobiliário instila falta de cultura, pobreza de espírito, inventividade, bom gosto e arte, ao mesmo tempo em que ofusca os potenciais compradores com muito brilho, contas, espelhos, dourados e fitas de LED, trocando civilização por brilho, por deslumbre.
A minha proposta? Levar (de verdade) a história da arte e da Arquitetura às escolas, promover oficinas de desenho para os estudantes, e costurar tudo isso com alguma filosofia, e muitos, muitos roteiros e passeios arquitetônicos, como o amigo - e Arquiteto - Ulisses Morato (@ulisses.morato) tem promovido, com bastante sucesso, resgatando prédios, lugares e biografias.
Parafraseando Pierre Cardin, “a ARQUITETURA também é a transmissão da civilização", e um país é tão mais civilizado quanto mais a Arquitetura é valorizada e ajuda a compor a cidade.