Fred Melo Paiva
Fred Melo Paiva
DA ARQUIBANCADA

Por favor, Atlético, não deixa mais esse povo ir embora

É dessa gente que o Galo precisa, e a quarta-feira foi didática para a compreensão de que esse pessoal é nosso melhor esquema tático

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Circula nas redes a imagem de uma das saídas do Terreirão do Galo depois da classificação de quarta-feira. A bateria da Galoucura anima uma turba de torcedores enlouquecidos. Ao som daqueles irresistíveis atabaques, o que o povaréu performa é algo entre o pogo do punk rock, o Baile do Corredor no funk carioca e o descarrego da igreja evangélica. Trocando em miúdos, a velha e boa torcida do Galo, democrática embora a ditadura da maioria. O velho Mineirão finalmente redivivo.

Fiquei a observar esse pessoal. Difícil achar um branco naquela balbúrdia alvinegra. Todo mundo na beca das camisas tailandesas, quando não, à mostra, o peito torneado no supino das caixas do almoxarifado. Cabelos platinados de Venda Nova. Tatuagens de cadeia do Aglomerado. GNV categoria Devo Não Nego Pago Quando Puder.

Um cara de oclinhos, barba, cabelo e bigode aparados na tesoura do material escolar, a calça comprida do gerente, pula descamisado como um doido que tivesse saltado da janela da firma diretamente na pipoca da Daniela Mercury. E então despirocasse naquela alegria incontida do atleticano que, aos trancos e barrancos, acaba vencedor.

É como se o pessoal do 8 de janeiro fosse preto, tivesse invadido o palácio e, no lugar do quebra-quebra, optasse pelo carnaval. É como se tivessem sido bem-sucedidos em sua tentativa de golpe. E de repente tivessem tomado o poder, a estabelecer como o hino da revolução o Time de preto, de favelado, mas quando joga o Terreirão fica lotado.

A filosofia ensina que a saída reside, muitas vezes, na mais absoluta falta de saída. A galosofia diz que no fundo do nosso poço tem uma catapulta capaz de lançamentos ao infinito e além. Porque não havia consumidor o suficiente para encher um quarto do estádio, decidiram abrir as portas ao povão. O povão ganhou o jogo, como se a cabeça do Bernard, logo o Bernard, fosse a foice e o martelo com os quais construíram na raça e no gogó a vitória já improvável. Foi aquela gente que botou pra dentro a bola fatal daquele arranca-toco sinistro.

O que vimos quarta-feira foi de uma prática e uma simbologia maravilhosas. Parecia estádio. Parecia arquibancada. Parecia a torcida do Galo. Não houve mosaico, não tinha 40 mil bandeiras. Veja: os mosaicos são incríveis, as bandeiras são um espetáculo. Mas a ausência delas só fez sublinhar aquela Massa que, pela primeira vez, tinha sido convidada pra festa no lugar de ficar na porta estacionando os carros.

Esse pessoal não liga pro arranca-toco, não reclama no SAC. A vida é um arranca-toco. E o Galo, a cachaça que lava a alma. Não é sobre ganhar, não é sobre taça, é sobre luta e celebração. É uma gente que ensina a fazer festa desde o advento do samba à explosão do funk. Um povo que anda se esbarrando no ônibus lotado não reclama da bandeira que lhe tampa a vista. É um povo que vira o jogo todo dia, na lida ininterrupta da escala 6x1.

Pelo amor de Deus, Atlético, é dessa gente que o Galo precisa, e a quarta-feira foi didática para a compreensão de que esse pessoal é nosso melhor esquema tático. Esse pessoal é o melhor técnico do mundo! Capaz de fazer do Dinho o homem-força, “todo entrega, todo generosa luta”. Capaz de recuperar Marques e Tardelli, Leonardo Silva e Jô, e nunca mais perdê-los. Capaz de fazer chorar o Ronaldinho Gaúcho, campeão de tudo. Capaz de produzir literalmente um time inteiro de verdadeiros atleticanos, como é o Galo campeão de 2013 e 14. É essa gente que faz o cara entrar funcionário e sair torcedor. Reside neles essa coisa que não se explica.

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Por favor, Atlético, não deixa mais esse pessoal ir embora. Vamos inventar estratégias, como aquelas sugeridas no “GNV Instituto Galo”, proposta pelo jornalista Guilherme Frossard. Como as crianças que entram em campo com os jogadores, invenção nossa exportada para o mundo todo, sejamos pioneiros nessa também. Deve ter gente disposta a pagar dois GNVs para que um deles seja do guardador de carros.

Abra mão do lucro imediato, bota o povão no orçamento e confia que ele vai fazer jogar o Júnior Santos. Acredite, esse pessoal é a galinha dos ovos de ouro do nosso Galo: é pra eles que a gente olhou quando era criança e pensou – é pra esse time que eu vou torcer. Agora eu vou com eles até o final.

 

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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