Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso foram ao programa 'Mais Você' falar sobre o racismo sofrido pela filha em Portugal. Ao chamar as imagens da reportagem, o VT mostrou a imagem de macacos



 -  (crédito: Reprodução/Globo)

Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso foram ao programa 'Mais Você' falar sobre o racismo sofrido pela filha em Portugal. Ao chamar as imagens da reportagem, o VT mostrou a imagem de macacos

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No início do ano passado, precisei me mudar para o Rio de Janeiro para iniciar meu doutorado na UFRJ. Aluguei um apartamento no centro da cidade, e, poucos dias depois, uma vizinha começou a gritar me chamando de macaca suja. Fiz boletim de ocorrência, saiu na imprensa local, e em poucos dias a vizinha se mudou do prédio. Meses depois, fiquei sabendo que a mesma apresentou laudo médico alegando estar em surto e por isso não poderia responder pelo crime cometido. Sei que esse é o modus operandi e provavelmente você também já sabe. O que eu não sabia era que, diante de uma situação como essa, no momento eu fosse ficar incrédula, fosse duvidar que uma pessoa teria a coragem e ou falta de sensibilidade para fazer o que essa vizinha fez. Eu a escutava gritar e duvidava das palavras. Meu ouvido escutava, e mesmo assim eu não acreditava. Então gravei com o celular, mostrei para outras pessoas e só assim acreditei. Você talvez possa estar se perguntando: Etiene, o que você fez para ela te chamar assim? E eu te respondo: Nada, absolutamente nada. Nós não nos conhecíamos, nunca havíamos trocado uma palavra sequer antes de ela me gritar assim. 

 


Depois de passar por situações como essa ficamos mais atentas. Talvez na ilusão de que podemos impedir que isso ocorra novamente, ou na esperança de nunca mais passar por isso, mas, se caso acontecer, termos uma reação imediata. No último domingo, foi veiculado no programa "Esporte Espetacular", da Rede Globo, uma entrevista com a judoca medalhista de ouro das Olimpíadas de 2024 Bia Souza. Em um dado momento da reportagem, tive a impressão de ouvir uma trilha sonora de sons de macaco. Então, voltei para ouvir melhor e fiquei chocada, tentando entender o que motiva uma pessoa a fazer isso. E olha que já passei por isso e não perco minha capacidade de me indignar. Diante da situação, novamente duvidei, então enviei o vídeo para alguns amigos, perguntando o que ouviram, e a maioria ouviu o mesmo que eu. Postei na minha rede social e novamente perguntei o que as pessoas ouviram, e a maioria também ouviu o mesmo que eu. 


 

O racismo tem a capacidade de nos fazer duvidar da nossa sanidade mental, daquilo que a gente enxerga e sente e até daquilo que a gente escuta. Quase todas as vezes que uma pessoa negra relata uma situação como essa, a primeira pergunta é: "Será que você não se confundiu?". E a gente acaba se fazendo essa pergunta cruel mesmo tendo entendido. Mas me lembrei que, em 2022, a filha da Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso passou por uma situação de racismo em Portugal. Situação essa que virou notícia no Brasil, e o programa "Mais Você", da Rede Globo, veiculou uma entrevista com a mãe das crianças na TV. Porém, quando a apresentadora Ana Maria Braga chama o VT, o que aparece na tela é a imagem de macacos com a seguinte legenda: "Racismo em Portugal - ataques covardes contra filhos de atores causam indignação". Após o ocorrido, a apresentadora veio a público dizer que o erro era inadmissível e, por esse motivo, a pessoa responsável pelo ocorrido foi desligada de sua equipe profissional. 


Recentemente, um casal de educadores, uma argentina e um brasileiro, começou a gesticular imitando macacos em uma festa popular da cultura negra no centro do Rio de Janeiro. As pessoas olhavam, outras filmaram, e em nenhum momento a dupla de pessoas brancas se intimidou ou ficou constrangida de imitar macacos diante das muitas pessoas negras que ali estavam. O vídeo viralizou nas redes sociais, ganhou o noticiário nacional e causou muita indignação. Foi realizado um boletim de ocorrência. 

 

 

 

Erros ocorrem? Sem dúvidas que sim, mas você tem que concordar comigo que um erro desses é um tanto quanto suspeito. Ainda mais em um país em que um dos atos mais comuns de racismo é chamar a pessoa de macaco. Uma comparação para destituir a pessoa negra de sua humanidade e, portanto, animalizar essa parcela da população. 


Também não dá para tratar esses assuntos como piada sem graça. Ainda hoje vivemos relações com pessoas que acreditam e defendem que utilizar o humor para constranger umas às outras em razão de suas características físicas e raciais seja piada. Não, não é. O doutor Adilson Moreira é cirúrgico nesse assunto quando define isso como racismo recreativo. Há diversos níveis desse crime, o escancarado em que o criminoso grita para quem quiser escutar, como foi o caso da vizinha que eu contei aqui, o irônico, sarcástico nos ambientes corporativos, e tem também aqueles, ditos sofisticados, em que é quase impossível de conseguir provas para indiciar criminalmente o responsável. Seja como for, o racismo continua sendo uma violência constante, contínua e cruel. Não perdoa mulheres simples, como eu, filhas de celebridades nem uma medalhista de ouro. Um racismo presente nos locais de trabalho, nos momentos de lazer e até quando estamos dentro de nossas casas. 


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