
Lady Tempestade e a chuva de democracia que marcou 21/09/2025
Aos 353, sugiro lerem Paulo antes de cometerem mais um ato de heresia contra o povo. E que Oxalá os expulse no ano que vem! Que venha a limpeza!
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Há anos utilizo parte desse espaço para mostrar a forte associação entre política e economia. Em 11 de setembro, vivemos um marco na história política brasileira: a condenação de um ex-presidente da República e de outras figuras importantes no cenário político e militar do País. Na semana seguinte, vimos o escárnio de 353 deputados para com a sociedade brasileira. Neste domingo, o povo coloriu as ruas: vivemos uma chuva de democracia lavando a alma do povo brasileiro.
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O domingo de 21 de setembro de 2025 deve ficar para a história: é o ponto de partida para romper com o abuso de um poder político que, sobretudo nos últimos cinco anos, assalta a sociedade com a (tentativa de) criação de leis e emendas que busquem cuidar exclusivamente do quintal dos parlamentares e de seus interesses individuais, em uma inversão completa do que deve ser o seu papel – em poucas palavras, o de representante dos interesses do povo.
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A emenda do relator, apelidada de “orçamento secreto”, provavelmente era, até uma semana atrás, a medida mais aviltante que o Congresso Nacional – leia-se aí deputados e senadores – vinha esfregando na cara da sociedade brasileira. É importante lembrar que o orçamento público é elaborado no ano anterior à sua execução, para que o Presidente da República o submeta à aprovação do Legislativo.
Para aqueles que não conhecem com clareza os trâmites orçamentários, peço licença para uma breve explicação: o Executivo envia a Lei Orçamentária Anual (LOA) referente ao ano seguinte, para fins de aprovação do Congresso Nacional. Durante a avaliação da LOA, os parlamentares criam emendas parlamentares que são recursos – nome pomposo dado ao instrumento de negociação entre os dois poderes – usados para modificar o Orçamento e favorecer suas bases políticas.
Até 2019, enquanto cresciam silenciosamente os ratos nos porões do Congresso Nacional e a maioria da sociedade acreditava que fazia parte do jogo democrático a alternância de poder e a chegada de novas representações que não pareciam carregar muito escrúpulos no tocante à coisa pública, os tais ratos começaram a colocar seus crescentes dentes incisivos de fora. Criou-se, para além das emendas individuais, de bancada e de comissão, a tal emenda do relator.
Se, por um lado, as emendas individuais, de bancada e de comissão têm (i) regras específicas de publicidade e transparência do destino dos recursos; (ii) a identificação dos beneficiários dos recursos públicos a elas destinados – incluindo o nome do deputado ou senador que os indicou –; e (iii) a identificação do beneficiário que recebeu o repasse; por outro, a emenda do relator desobriga qualquer ato de transparência. É usurpação de dinheiro público para fins individuais secretos.
Não basta terem mais de 50% das emendas sem transparência. Práticas como o orçamento secreto promovem corrosão no sistema e na ética legislativa e deixam cada vez mais à vontade os parlamentares para ousarem em manobras que os beneficiem e os protejam. E não me intimido em dizer que os ratos que habitam os porões da podridão legislativa saíram de seus esgotos e aprovaram a PEC da Blindagem - adequadamente denominada pela sociedade PEC da Bandidagem.
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E neste 21 de setembro de 2025, o povo foi às ruas! Artistas de várias gerações mobilizaram suas redes e movimentos sociais fizeram sua parte. De norte a sul do País, viu-se ruas cheias e coloridas! Vestir verde ou amarelo não foi um ato em defesa de algum partido, mas sim um gesto de soberania e indignação social.
Sou paulistana, mas saí de São Paulo ainda criança. Nesse domingo, 11 de setembro, tive a oportunidade e a emoção de ir à Avenida Paulista. De lá, fui assistir à peça “Lady Tempestade”, monólogo emocionante com a atriz Andréa Beltrão, que protagoniza a vida de Mércia Albuquerque, uma advogada que se tornou defensora de presos políticos na época da ditadura. Em seu diário, Mércia escreve que sua mãe era bonança e ela era tempestade, referindo-se à sua força para lutar contra a opressão da época.
Chorei de emoção no final da peça! Senti-me representada em minha terra natal, revivi a história que, há 58 anos, aconteceu na minha família quando a Polícia Federal chegou inesperadamente em minha casa em busca de um casal que meus pais abrigavam, mas que, felizmente, não se encontrava naquele momento. Eu era um bebê e poderia ter sido mais uma filha da violência da ditadura, como tantas relatadas por Andréa Beltrão em Lady Tempestade.
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Neste domingo, a Igreja Católica refletiu sobre um trecho da primeira carta de São Paulo a Timóteo e sobre parte do capítulo 16 do Evangelho de Lucas. Em ambos os textos, pregava-se o fim da injustiça e da ganância dos governantes. Lembrei-me dos 353 deputados e da cena herege de alguns unidos em oração após o fim da votação da PEC. Aos 353, sugiro lerem Paulo antes de cometerem mais um ato de heresia contra o povo. E que Oxalá os expulse no ano que vem! Que venha a limpeza!
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.