A sombra da violência que paira sobre as mulheres
Constantemente somos bombardeados por notícias, nas quais mulheres são vítimas de violência e contam as suas histórias quando sobrevivem para isso
Mais lidas
compartilhe
SIGA NOPor Tamara Santos*
Nos deparamos com a história da francesa, Gisèle Pélicot que descobriu ter sido drogada pelo marido e estuprada por inúmeros homens durante anos. Ela vem contando a sua triste história, dando exemplo de força e superação.
Mas, a advogada Carolina Magalhães não teve a mesma sorte, pois ela teria sido jogada do 8º andar de seu prédio supostamente pelo namorado, o também advogado Raul Lages, falecendo em junho de 2022. O suspeito está respondendo por homicídio qualificado, não por esforços da polícia, mas da família da advogada, que não satisfeita com a versão de suicídio, foi atrás de evidências que sugerem o contrário.
Histórias como essas, existem inúmeras que não se tornaram públicas, permanecendo nas sombras. Segundo a Agência Brasil, a cada 24 horas, ao menos oito mulheres são vítimas de violência.
A Lei Maria da Penha
A Lei 11.340/2006, também conhecida como Lei Maria da Penha, relacionou os tipos de violência contra a mulher. E, ao contrário do que muitos pensam, não é apenas a violência física (integridade ou saúde corporal), pois na maioria das vezes ela é antecedida por outros tipos de violência. Nesse rol entram a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que cause danos emocionais e diminuição da autoestima ou ainda, que prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento. Que vise degradar ou controlar as ações das mulheres, através de ameaça, constrangimento, humilhação, perseguição, chantagem e limitação de liberdade.
Temos ainda a violência moral, caracterizada por qualquer conduta que enseje calúnia, difamação ou injúria. E não para por aí, já que existe a violência patrimonial, tida como a retenção, subtração ou destruição parcial ou total de bens da mulher, como por exemplo, instrumentos de trabalho. Por fim, chegamos a violência sexual, concebida por qualquer conduta que constranja a mulher a praticar, a presenciar, a manter ou participar de práticas sexuais contra a sua vontade, mediante manipulação, ameaça e/ou uso de força.
Pacote Antifeminicídio
Com o fim de coibir tais práticas, tivemos a promulgação do Pacote Antifeminicídio (Lei 14.994/2024), que promoveu o feminicídio a crime autônomo; agravou as penas de outros crimes praticados contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino; e estabeleceu outras medidas destinadas a prevenir e coibir a violência praticada contra a mulher.
Contudo, isso não é suficiente, pois em algumas localidades a própria justiça dificulta o acesso da vítima as benesses da lei, como por exemplo, exigindo que ela seja acompanhada por um advogado ou defensor para se manifestar no procedimento de solicitação das medidas protetivas de urgência. Ora, se a vítima não tem condições financeiras de contratar um profissional, ela deveria ser sempre amparada pela Defensoria Pública, que não consegue atender todos os casos, em razão do volume de procedimentos.
Comumente, vemos a Justiça ser representada por uma estátua que tem os olhos vendados (Deusa Têmis) como símbolo da imparcialidade. Mas, nesse caso, me parece que a Justiça é cega mesmo, já que fecha os olhos para uma realidade existente desde a antiguidade. É preciso fazer valer o direito fundamental de acesso à Justiça, previsto em nossa Constituição. Afinal, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
Muito já se ganhou nessa luta, muitos direitos começam a ser resguardados. Mas, essa luta deve ser constante, para que o meu e o seu direito possam ser preservados, e a mulher vítima de violência possa de fato encontrar o amparo que precisa.
É importante que a mulher saiba que é possível pedir ajuda. Hoje, nas grandes cidades, temos as Delegacias Especializadas em Violência Contra a Mulher e na falta delas, pode-se procurar qualquer delegacia.
Também existe a Casa da Mulher Brasileira (criada pelo Programa Mulher Viver Sem Violência do Ministério das Mulheres), que promove o atendimento integral e humanizado para mulheres em situação de violência. Esse serviço existe em algumas cidades brasileiras, alguns lugares em implementação e outros já em pleno funcionamento como é o caso de Salvador, São Paulo, São Luís, Campo Grande, Curitiba, Teresina, Fortaleza, Mossoró, Ortolândia.
Contamos também com inúmeros projetos que promovem o acolhimento de mulheres vítimas de violência, oferecendo apoio psicológico, jurídico e social. Esse trabalho já vem sendo desenvolvido por algumas instituições, como é o caso do Centro Risoleta Neves de Atendimento à Mulher (Cerna), localizado na região metropolitana de Belo Horizonte. Ele é especializado no atendimento de mulheres em situação de violência doméstica, atuando no acolhimento, orientação e acompanhamento, além de proporcionar atendimento psicológico, individual e em grupo, visando o rompimento do ciclo de violência e promovendo a autonomia das mulheres.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba em primeira mão notícias relevantes para o seu dia
O Projeto Justiceiras, criado pela advogada Gabriela Manssur, com o fim de suprir as necessidades de canais e sistemas alternativos para combater e prevenir à violência de gênero, também promove esse acolhimento interdisciplinar em nível nacional e internacional.
O canal Disque Denúncia através do número 180 é um importante aliado, pois ele permite que qualquer pessoa possa realizar a denúncia. Lembrando que não existe essa história de que “em vida de marido e mulher não se mete a colher”. Qualquer tipo de violência familiar e contra a mulher devem ser reportados.
Lembre-se: uma vida sem violência é direito de todas nós mulheres. Faça valer o seu direito!
*Tamara Santos é advogada.