
Depois de determinada época e apesar de você
O vírus mais letal é aquele que nos faz crer que somos diferentes, superiores, imunes à dor do outro
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Depois de muito tempo passeando por esse planeta, o que nos resta senão pensar?! Pensar, juntar as peças e interpretar. O que fazer com o saber da engrenagem que nos trouxe até aqui?! Levar todo esse fosfato para adubar a terra?! Virar fumaça?!
Não!! Não! Isso, não! É hora de transformar a água em vinho! Degustar cada gota desse milagre e compartilhar. Essa é a essência da arte. Compartilhar o orgasmo cósmico da percepção do tudo e do nada.
Demora tanto para juntarmos esse quebra-cabeça e está tão próximo de desfazê-lo, guardá-lo numa caixa e nunca mais montá-lo. Demora tanto para vermos a luz, que dentro da caverna, não sabíamos existir. O mundo nos embrulha num emaranhado de tramas que custamos a encontrar o fio da meada.
Tão complexo quanto enxergar é ensinar o caminho. Estrada longa e esburacada, com abismos de lado a lado, onde tantos ficaram. Cá estamos, com bagagem e horizonte incertos. Como sempre foi. Não sabíamos, mas era. No frigir dos ovos, sempre fomos multideficientes com inata intuição. Algo ancestral que protege qualquer animal.
Demora um bom tempo para percebermos que os faraós e suas pirâmides ainda circulam por aí, puxados por carruagens milionárias. Assim como entendermos a miséria deixada à beira do caminho e escondida nos morros e viadutos que ligam o nada a coisa nenhuma.
Não é simples entendermos o viés de "predileção" das bactérias, vírus e parasitas pelos pobres, negros, velhos e marginalizados. Principalmente, quando se é branco e tem sobrenome de colonizador. O parto moral é nauseante como um ritual de Ayahuasca.
Mas é nesse vômito da consciência que renasce o ser. Como células que se multiplicam e evoluem, nossa compreensão se expande em direção ao infinito. O DNA da compaixão finalmente se expressa, rompendo a membrana do individualismo que por tanto tempo nos manteve isolados uns dos outros e que alguns ainda insistem em tentar preservar.
A guerra comercial de Trump contra o mundo é apenas um dos vários exemplos da doença letal que o radicalismo político e o individualismo patológico tentam nos impor. A ciência nos ensina que somos todos feitos da mesma matéria, unidades de carbono vulneráveis às mesmas doenças, todos mortais sob o mesmo céu. Os patógenos não conhecem classes sociais, embora a sociedade insista em criar as próprias cepas de desigualdade. As doenças infecciosas, o sofrimento e a dor gerada por elas, em boa parte, refletem a patologia mental humana.
E, assim, entre microscópios e macroscópicas revelações, descobrimos que a verdadeira pandemia é a da indiferença. O vírus mais letal é aquele que nos faz crer que somos diferentes, superiores, imunes à dor do outro.
Mas há cura. Ela brota do mesmo lugar onde nasceu nossa primeira célula: do amor universal, que permeia toda a existência. Um amor que não discrimina, não seleciona, não se deixa contaminar pelos preconceitos que criamos, não invade, não mata, não fecha os olhos para a dor do mundo.
Como profissionais de saúde, precisamos prescrever doses diárias de empatia. Vacinar corações contra o ódio. Criar anticorpos contra a segregação. O prontuário da humanidade está em nossas mãos, e o diagnóstico é claro: precisamos uns dos outros para sobreviver.
Na evolução dessa espécie que somos, o próximo salto não será físico, mas consciencial. A mutação necessária é aquela que nos fará ver no outro não um estranho, mas uma extensão de nós mesmos. Uma cepa de amor que se espalhe mais rápido do que qualquer variante de medo e egoísmo.
Quando finalmente entendermos que a cura sempre esteve em nós, teremos evoluído não apenas como espécie, mas como consciência universal. Porque no fim, somos todos células do mesmo tecido cósmico, pulsando no ritmo do amor que move as estrelas.
Nesse laboratório chamado vida, cada dia é uma nova experiência, um novo teste, uma nova chance de isolar o vírus do preconceito e cultivar a cultura da compreensão. Somos todos pesquisadores nessa jornada, buscando a vacina definitiva contra a solidão existencial que nos aflige. Como uma cadeia de DNA que se desenrola infinitamente, nossa história é uma espiral de aprendizados e descobertas.
E assim, enquanto tratamos as feridas do corpo, descobrimos que a verdadeira cura está no olhar. Na capacidade de ver além das aparências, de transcender as barreiras do ego, de reconhecer em cada ser humano a mesma luz que nos habita.
O estetoscópio da empatia nos permite auscultar o coração do mundo, ouvir seus batimentos arrítmicos, entender que cada dor individual é parte de uma dor coletiva que clama por cura. E essa cura só virá quando aprendermos a enxergar não apenas nossos semelhantes, mas também o todo, o inteiro e, em especial, o que nos parece diferente.
No final, quando o último paciente for atendido, quando o último diagnóstico for dado, o que restará será apenas o amor. O amor que cura, que transforma, que transcende todas as doenças e todas as diferenças. O amor que é, em sua essência mais profunda, a própria força vital que nos mantém vivos e conectados nessa grande teia da existência.
Depois de determinada época e apesar de você, é tempo de acordar.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.