Bertha Maakaroun
Bertha Maakaroun
Jornalista, pesquisadora e doutora em Ciência Política
Em Minas/nos bastidores da política mineira

A última barreira à privatização da Cemig

Zema propõe converter as ações preferenciais da Cemig em ordinárias, de modo que, com 17,04% das ações ordinárias, o governo perderia o controle da gestão

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Depois de consolidada maioria na Assembleia Legislativa para a mudança constitucional que retirou a obrigatoriedade do referendo para a privatização da Copasa, o governo Zema está neste momento mais interessado na desestatização da Cemig do que na adesão ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas de Estado (Propag). Em meio a uma lista de “ativos” de R$ 96,5 bilhões – 75% dos quais fluxo de recebíveis, a maior parte deles sem previsão legal –, a participação acionária do governo do estado na Cemig foi incluída na lista de ativos para federalização ao valor de R$ 13,5 bilhões, condicionada à transformação prévia da companhia em corporation.

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A Cemig possui duas classes de ações: um terço das ações é de ordinárias, com direito a voto, e dois terços são preferenciais, sem direito a voto, mas com preferência no recebimento de dividendos. O estado possui 50,97% das ações ordinárias e nenhuma ação preferencial, o que, na prática, significa que detém 17,04% do total das ações, além do controle da empresa, já que tem maioria das ações ordinárias.

No projeto que enviou à Assembleia em novembro de 2024 – e ainda não tramita por decisão do presidente da Casa, Tadeu Leite (MDB) –, o governo Zema propõe converter as ações preferenciais da Cemig em ordinárias, de modo que, com 17,04% das ações ordinárias, perderia o controle da gestão, mantendo poder de veto (Golden Share). Por esse modelo, o estado não teria mais qualquer poder para interferir nos programas e nas políticas públicas da Cemig.

A primeira pergunta, ainda em aberto: para fins de amortização da dívida com a União, o governo federal – que certamente recusará a maior parte da lista de “ativos” apresentada pelo governo do estado – aceitará a federalização da Cemig sem o controle da companhia? Há quem considere que, no âmbito da Secretaria do Tesouro Nacional, a proposta possa ser aceita, já que a Cemig e a Codemig seriam os únicos ativos que interessariam ao governo federal. Mas, há também, quem duvide que essa seja uma hipótese aberta à discussão.

Na dúvida do porvir, contudo, uma última barreira se interpõe a esse processo de privatização da Cemig: Tadeu Leite, responsável por pautar as proposições, já deu inúmeras declarações públicas contrárias à proposta. Para além das declarações, as suas atitudes têm sido na mesma direção. A começar pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 24/23, encaminhada por Zema à Assembleia, que inicialmente tratava do fim do referendo popular para a privatização da Cemig e da Copasa. A Cemig foi retirada do texto por recomendação de Tadeu Leite.

Após a aprovação dessa proposta em primeiro turno, a base de Romeu Zema – em particular, os deputados Gil Pereira (PSD) e Gustavo Valadares (PSD) – manobrou para incluir em substitutivo de segundo turno, além da Copasa, o fim do referendo também para a privatização da Gasmig, subsidiária da Cemig. O jabuti foi retirado por orientação de Tadeu Leite. Uma sinalização de Tadeu Leite ao governo federal, responsável por pautar as matérias, desencorajaria qualquer flerte na direção da federalização da Cemig sob o modelo corporation. E mais: se a matéria não é pautada, não é aprovada. E se não é aprovada, não há o que discutir.

Mas a política tem as suas artimanhas. Neste momento, o governo Zema está politicamente fortalecido, porque avança com as articulações políticas em torno da candidatura do vice-governador Mateus Simões (PSD). É o nome posto com a estrutura do estado trabalhando em seu favor, em um quadro sucessório que só agora ganha os nomes de Gabriel Azevedo (MDB) e Alexandre Kalil (PDT). O senador Cleitinho (Republicanos) segue ainda sem confirmar a sua candidatura. Tadeu Leite tem convites de todos os campos políticos, inclusive de Mateus Simões, para compor uma chapa ao governo de Minas. Se a esquerda e movimentos sindicais – inconformados com o destino que se anuncia para a Copasa – seguirem em rota de desgaste com o presidente da Assembleia, poderão colocá-lo de vez no colo de Mateus Simões. E ainda terão de dormir com um outro barulho: poderão perder a última barreira que detém o curso da privatização da Cemig.


Hora do espanto


A proposta do governo Romeu Zema (Novo) à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) para amortização de R$ 36,2 bilhões – que correspondem a 20% da dívida com a União, de R$ 181 bilhões – é inaceitável, diz Hugo René de Souza, diretor do Sinfazfisco. Segundo ele, foi inflada por “ativos” de R$ 96,5 bilhões, dos quais, R$ 72,7 bilhões – 75% – são fluxo de recebíveis e referem-se a antecipações de valores a receber sem previsão legal e embasados em projeções inconsistentes, que contradizem os dados do próprio Tesouro estadual. A tendência é de que menos de 10% dessas rubricas sejam aceitas pelo governo federal. Foram incluídas com o propósito de fazer número, provocar ruído, debates e desgaste ao governo federal, que será forçado a “recusar” a lista de Zema.


R$ 30,1 bilhões


O maior valor incluído na lista de ativos pelo governo Zema é a cota-parte do Fundo de Participação dos Estados (FPE), no valor de R$ 30,1 bilhões. Ao longo de 2024, Minas recebeu cerca de R$ 7 bilhões dessa transferência da União, distribuída a estados e ao Distrito Federal, formada por uma parcela de 21,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). O governo de Minas está propondo antecipar cerca de quatro anos do FPE, que depende da arrecadação do governo federal e muda todos os anos. “Não há previsão legal para usar a antecipação desses repasses para quitar a dívida”, critica Hugo René de Souza.

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Imóveis


O governo do estado incluiu R$ 1,9 bilhão em imóveis estaduais a serem federalizados por interesse de instituições federais. Mas há uma dificuldade que tenderá a inviabilizar essa operação, aponta Hugo René de Souza. Segundo ele, a Lei 3.800/2019, de avaliações da União, estabelece que qualquer imóvel a ser dado como doação em pagamento precisa estar livre de ônus e gravames, além de apresentar a documentação pertinente: matrícula atualizada, IPTU quitado, habite-se para imóveis construídos, além de certidões negativas. “Menos de 1% dos imóveis do estado tem essa documentação”, diz ele.


Fraudes com IA


No embalo da Black Friday, o coordenador do Procon da Assembleia Legislativa, Marcelo Barbosa, faz alerta aos consumidores: “A inteligência artificial é capaz de criar vídeos de altíssima qualidade mostrando qualquer personagem utilizando qualquer voz vendendo qualquer coisa em nome de qualquer loja”. São as chamadas “deepfakes”. Barbosa recomenda que o consumidor desconfie de “celebridades” fazendo ofertas “imperdíveis”. É preciso checar se o vídeo é verdadeiro por meio de sites de checagem, avisa. Quando a esmola é grande, até o santo desconfia.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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