
Bertha Maakaroun
Jornalista, pesquisadora e doutora em Ciência Política
EM MINAS
O teatro da "anistia" e as cabeças da trama golpista
Zema faz de tudo pela ilusão de que concorre ao espólio eleitoral do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)
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08/04/2025 06:00
- atualizado 08/04/2025 06:24
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De Minas Gerais emergiriam em 1985 as lideranças políticas centrais à reabertura democrática. O então vice-presidente da República, Aureliano Chaves, do PFL perdeu a indicação para concorrer ao colégio eleitoral para Paulo Maluf, do PDS, e abriu dissidência nas hostes militares da sucessão de João Baptista Figueiredo. Tancredo Neves, então governador de Minas pelo PMDB, vinha, desde a campanha pelas “Diretas Já”, trabalhando a sua candidatura à Presidência da República.
Político experiente de centro, habilidoso negociador, Tancredo abria perspectivas para composições à esquerda e à direita. Ambos foram centrais na articulação da Aliança Democrática, que enterraria o regime militar 21 anos depois do golpe de 1964.
Minas como a de Tancredo Neves já não há mais. Quarenta anos depois da transição democrática, o governador Romeu Zema (Novo) (foto) faz o caminho inverso. Zema faz de tudo pela ilusão de que concorre ao espólio eleitoral do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Vinha em campanha presidencial pelo país adotando a narrativa antipetista.
Se do ponto de vista estratégico pareceria a linha adequada para a oposição política de um pré-candidato a presidente, do ponto de vista de conteúdo, o resultado até aqui são lugares-comuns, que parecem brotar do fígado, repetidos à exaustão.
Na semana passada, Romeu Zema deu passos mais largos em direção ao bolsonarismo raiz. Lançou com apoio de IA uma espécie de “hino gospel” em defesa do “perdão” aos golpistas condenados e àqueles que ainda não foram, mas poderão sê-lo. As razões de Estado são tratadas ali como um púlpito ou confessionário de igreja – ignorando que crime é previsto em legislação construída sob a égide da impessoalidade e da racionalidade.
Uma IA talvez ainda não saiba a diferença. Para além da peça infame, esse é um “perdão” que 56% dos brasileiros são contrários, 34% são favoráveis, 10% não opinam, registram os dados da pesquisa Quaest divulgada neste domingo.
Bolsonaro quer envolver governadores em sua narrativa para demonstrar apoio político e pressionar o Congresso a votar uma nova anistia prejudicial às instituições nacionais. Governadores bajulam Bolsonaro porque sabem que está inelegível e não será candidato. Lutam pelos votos orgânicos da extrema direita. Sonham ser ungidos pelo “mito” feito réu.
Por essas razões, o ex-presidente juntou apoio político neste domingo (6/4). O ato usa as condenações dos “figurantes” recrutados para o enredo dos acampamentos e das depredações aos Poderes para generalizar o “perdão” a quem de fato interessa: as cabeças agora em julgamento.
Bolsonaro não está preocupado com a concessão de anistia à “cabeleireira do batom” – agora usada como símbolo – ou com o “popcorn and icecream men”, conforme gaguejou do palanque, num inglês que faz de Joel Santana poliglota fluente. Está preocupado com aqueles que colocaram as buchas no canhão. Que este seja o pesadelo do ex-presidente, compreende-se.
Segundo a denúncia enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela Procuradoria-Geral da República, ao longo de seu mandato, houve uma construção que culminou com a tentativa de golpe após a derrota eleitoral. Segundo a acusação, Bolsonaro é peça central da quartelada. Mas que Zema embarque em tal cruzada com tanta sede ainda está para ser compreendido.2
Numa hipótese remota e muito improvável em que os envolvidos na tentativa de golpe sejam anistiados – e, em outra hipótese ainda mais improvável em que Bolsonaro reverta sua inelegibilidade –, a presença do ex-presidente na disputa eliminaria a chance de qualquer um dos quatro governadores presidenciáveis de unir extrema direita e direita em torno do próprio nome.
Em outras palavras: além da instabilidade institucional que aportaria a um futuro governo, Bolsonaro no páreo não interessa a ninguém, talvez ao presidente Lula, pois, conforme apontam as projeções de cenários eleitorais, seria um adversário com maior taxa de rejeição e com menor potencial eleitoral de crescimento em relação, por exemplo, ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).
E aí, Grok?
Sem ter feito desembolsos significativos em seu primeiro mandato à União, beneficiado por sucessivas liminares no Supremo Tribunal Federal (STF), o governador Romeu Zema anunciou nesta segunda-feira (7/4) pelo X: “Já tá na conta da União: R$ 396,65 milhões de mais uma parcela da dívida de quase 30 anos que nós mineiros temos que pagar”. Disse que o estado já soma mais de R$ 9,5 bilhões em quitações desde 2019. Entre as diversas perguntas dirigidas ao Grok como comentário à postagem de Zema, um dos usuários da rede questionou: “Ei, @grok, sob o governo Zema, a dívida do estado de Minas Gerais aumentou ou diminuiu?”
Tesouro Estadual
Dados do Tesouro estadual indicam que, em fevereiro de 2025, o estoque da dívida de Minas era de R$ 189,4 bilhões, dos quais R$ 162,9 bilhões – o equivalente a 86% – deve à União, integrando a dívida CAM (Coeficiente de Atualização Monetária) aplicado aos contratos de refinanciamento de dívida – Lei 9.496/1997 e LC 159/2017). Em dezembro de 2018, a dívida pública de Minas era de R$ 114, 699 bilhões. Portanto, desde que Zema assumiu, em janeiro de 2019, a dívida pública de Minas cresceu 65%.
Vai que cola
Na comitiva de Lula em Montes Claros, para o anúncio da expansão da produção da Novo Nordisk, que produz insulina para o SUS (Sistema Único de Saúde), o senador Rodrigo Pacheco (PSD) ouviu gritos de “Pacheco governador”, durante o ato em que a empresa anunciou investimentos de R$ 6,4 bilhões.
Vaias
Sem a presença de Romeu Zema em Montes Claros, o representante do governador, Leandro Andrade, diretor da Invest Minas, foi vaiado pela plateia durante a nominata do prefeito Guilherme Guimarães (União). Como se espera de um anfitrião, Guimarães repreendeu a plateia pela descortesia.
Tratamento
Depois de uma cirurgia de câncer de próstata, o deputado federal Rogério Correia (PT-MG), que estava licenciado, celebrou os resultados e anunciou o retorno à Câmara dos Deputados para a última semana de abril.
Nova direção
O MDB de Belo Horizonte elegeu, nesta segunda-feira (7/4), Gabriel Azevedo para presidir a executiva da capital. O partido vinha atuando com uma comissão provisória desde o ano passado, quando Azevedo concorreu à prefeitura. Paulo Brant, que foi o vive da chapa, é o primeiro vice-presidente. “Estamos começando agora, em 2025, um trabalho para 2028” declarou o ex-presidente da Câmara Municipal, que pretende se candidatar novamente à PBH.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.