
Que toda mulher possa ousar ser livre
Aventureira, destemida, corajosa são adjetivos impróprios para mulheres. Cabem somente aos homens
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A única certeza que temos na vida é a de que todos vamos morrer um dia. Uns vivendo mais intensamente, com coragem de realizar seus sonhos. Outros seguindo o protocolo, sem se arriscar. Sentir medo, ansiedade, ir com medo mesmo. Vencer e sentir a vida, a recompensa de se superar. Viver com intensidade.
Melhor morrer se sentindo viva? Ou viver se sentindo morta? Viver pouco, com intensidade, ou viver muito parecendo que nem viveu? Ficamos comovidos com a partida de Juliana Marins, infelizmente o resgate demorou demais e, quando a equipe conseguiu chegar até ela, já não havia mais vida em seu corpo. Juliana foi deixada para trás pelo guia, estava cansada, debilitada, sem roupas adequadas para o frio, não tinha água, estava sem os óculos. Caiu. Um segundo grupo de turistas a avistou e avisou a família. Onde estava o guia responsável pelo grupo dela? Por que uma pessoa do grupo foi deixada para trás num lugar tão perigoso?
Juliana caiu no sábado, o resgate só chegou quatro dias depois, e o turismo seguiu normalmente, pessoas fazendo o mesmo percurso em grupos, percorrendo a mesma trilha e correndo os mesmos riscos, enquanto ela esperava por um resgate que não chegou. Juliana foi encontrada morta no vulcão na Indonésia. Uma fatalidade com pitadas de negligência. Juliana sofreu ferimentos graves, e, segundo a autópsia realizada, morreu 20 minutos após a queda. De acordo com o médico-legista, a causa da morte foi uma lesão provocada por forte impacto nas costas, que causou sangramento intenso na cavidade torácica.
Durante todo esse tempo, Juliana foi julgada. "Se estivesse em casa, isso não teria acontecido." Julga quem se esquece que ela pode ter morrido pela queda ou esperando por um resgate que não veio, mas tem mulher que morre dentro de casa. Esperando também um resgate que nunca chega, ou em decorrência de traumas causados por agressão física. A cada 10 casos de feminicídio, sete acontecem dentro de casa. A cada 10 casos de feminicídio, sete são de mulheres que estão em casa realizando o trabalho de cuidado e deixando de realizar os próprios sonhos.
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Juliana escolheu a intensidade. Conheceu lugares incríveis, teve experiências ímpares. Permitiu-se ser livre para viajar sozinha. Toda mulher sabe dos temores de fazer uma viagem sozinha, e da coragem necessária para seguir seus sonhos. Aventureira, destemida, corajosa são adjetivos impróprios para mulheres. Cabem somente aos homens. Teria um homem sido questionado se estivesse fazendo o mesmo que Juliana?
Em um dos posts que ela fez durante a viagem, ela escreveu:
“É difícil descrever o que foi a Tailândia pra mim, mas acredito que tenha sido, principalmente, sobre propósito. Aprendi muito com a cultura e a filosofia de vida, mas também sobre respeitar o que eu sinto e seguir o que faz sentido.
Explorei cidades completamente sozinha; fiquei 5 dias em um retiro de yoga; mergulhei 11 vezes e recebi dois certificados internacionais de mergulho; vivi 5 dias em um monastério budista enquanto meditava e aprendia com os monges.
Tenho aprendido a me concentrar no meu corpo e em tudo que ele é capaz de fazer (por dentro e por fora). Hoje sou grata por viver cada momento, por aceitar todas as emoções e não relutar em deixar elas irem e virem.
Eu não fiquei bem o tempo todo. Em alguns momentos, me senti triste, frágil, vulnerável. Em outros, me senti completamente cheia de mim. Grata, feliz, em paz, apaixonada pela vida.
O budismo acredita na impermanência. Tudo é passageiro. Por isso, a importância de se voltar pro presente, olhar pra dentro, respirar fundo e viver o agora. Até porque, como diria Gil, esse é o melhor lugar do mundo”.
Para mulheres, liberdade é ousadia. Juliana ousou viver livre e deixou a vida vivendo uma experiência que a maioria de nós nunca vai conseguir viver. Que toda mulher possa ousar ser livre.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.