André Murad
André Murad
Diretor-executivo da Clínica Personal Oncologia de Precisão de BH. Oncologista e oncogeneticista da OncoLavras.
ONCOSAÚDE

A relação entre a gordura da dieta e o câncer

Uma ingestão equilibrada de ácidos graxos ômega-6 e ômega-3 já está ganhando força na promoção de uma imunidade saudável

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Em um estudo recente, pesquisadores descobriram que um ácido graxo essencial, chamado ácido linoleico ômega-6, que só podemos obter por meio da alimentação, ativa diretamente uma via central de crescimento em nossas células, chamada mTORC1. Essa ativação depende de uma proteína chamada FABP5, que atua como chaperona lipídica. Quando o ácido linoleico ômega-6 se liga à FABP5, ele ativa a mTORC1, que então impulsiona o crescimento e a proliferação celular.

Isso é significativo porque liga uma gordura alimentar específica diretamente à maquinaria celular que controla o crescimento, incluindo o crescimento de células cancerígenas. Por que é importante entender como as gorduras alimentares afetam o crescimento celular?

Os nutrientes da dieta fornecem matérias-primas essenciais para o crescimento e a proliferação celular. Embora uma dieta balanceada promova a saúde, o excesso de carboidratos e gorduras pode interromper os processos celulares, aumentando o risco de doenças como o câncer.

Qual é a diferença entre os ácidos graxos ômega-6 e ômega-3 e por que isso importa?

Tanto o ácido linoleico ômega-6 quanto o ácido linolênico ômega-3 são ácidos graxos essenciais, o que significa que nosso corpo não consegue produzi-los. Precisamos obtê-los por meio da dieta. O ômega-6 é mais abundante na dieta ocidental a partir de óleos vegetais, enquanto o ômega-3 vem de fontes como peixes e nozes.

A pesquisa mostra que o ômega-6, mas não o ômega-3 ou seus derivados, ativa a via de crescimento do mTORC1. Isso reforça a noção de que o excesso de ômega-6 pode ter efeitos adversos, superestimulando o mTORC1 e, consequentemente, desregulando o crescimento celular.

Como essa pesquisa se relaciona ao câncer?

A pesquisa descobriu que a FABP5, a chaperona lipídica que permite que o ômega-6 ative o mTORC1, está presente em maiores quantidades em certos tipos de câncer, especialmente no de mama triplo-negativo, do que no câncer de mama com receptor positivo.

Quando camundongos com células de câncer de mama triplo-negativas implantadas foram alimentados com dietas com diferentes ácidos graxos, aqueles que receberam ômega-6 apresentaram aumento no crescimento tumoral, enquanto aqueles que receberam ômega-3 não. Isso sugere que tumores com FABP5 abundante podem usar preferencialmente ômega-6 da dieta para alimentar seu crescimento.

Quais são as potenciais implicações para pacientes com câncer?

Como o ômega-6 é obtido apenas por meio da dieta, restringir sua ingestão pode beneficiar pacientes com altos níveis de FABP5. A pesquisa aponta para uma possível estratégia terapêutica que combina o direcionamento tanto para mTOR quanto para FABP5, juntamente com a restrição alimentar de ômega-6, para cânceres que dependem da via ômega-6-FABP5-mTORC1.

Essa abordagem pode ser particularmente relevante para o câncer de mama triplo-negativo, que é uma forma mais agressiva de câncer de mama com opções limitadas de tratamento.

Como essa pesquisa pode influenciar as recomendações alimentares?

Uma ingestão equilibrada de ácidos graxos ômega-6 e ômega-3 já está ganhando força na promoção de uma imunidade saudável. Essa pesquisa acrescenta outra consideração, especialmente para a prevenção e o tratamento do câncer.

Estudos futuros devem explorar como a manipulação das quantidades desses lipídios afeta os sinais de crescimento em diferentes tipos de células, incluindo células imunes, para potencialmente prevenir o câncer. Mas é importante observar que o ômega-6 é um ácido graxo essencial — precisamos de uma parte dele — então o objetivo seria o equilíbrio, e não a eliminação completa.

Quais são os próximos passos da pesquisa?

O direcionamento de FABPs para o tratamento do câncer está atualmente em investigação, assim como inúmeros esforços clínicos direcionados à mTOR. No entanto, a inibição da mTOR isoladamente apresentou apenas resultados modestos devido a problemas de toxicidade.

A nova compreensão de como o ômega-6, FABP5 e mTORC1 atuam em conjunto abre possibilidades para abordagens mais direcionadas. Pesquisas futuras devem investigar como o excesso de gordura na dieta reprograma o metabolismo celular e corporal, o que pode fornecer informações valiosas sobre os mecanismos subjacentes ao início e à progressão do câncer.

Por que esta descoberta é particularmente importante para a compreensão do metabolismo do câncer?

A pesquisa ajuda a preencher uma lacuna significativa no conhecimento sobre como nutrientes específicos, particularmente lipídios, afetam o crescimento celular. Ela fornece uma compreensão passo a passo de como uma gordura comum na dieta pode alimentar a proliferação do câncer.

Ao identificar os agentes moleculares envolvidos — ácido linoleico ômega-6, FABP5 e mTORC1 — os pesquisadores agora têm novos alvos para potencial intervenção terapêutica. Isso pode eventualmente levar a tratamentos mais personalizados para o câncer, que considerem tanto terapias medicamentosas quanto modificações dietéticas.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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