
A liderança silenciosa de Juliano Lopes
Hoje, Juliano é mais do que presidente da Câmara. É o operador silencioso da governabilidade
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A história raramente reserva protagonismo aos discretos. Heróis e vilões, por definição narrativa, tendem a ser barulhentos. Mas há momentos em que o poder muda de forma e, mais do que se reinventar, ele se esconde. Juliano Lopes (Podemos), por anos uma presença periférica em Belo Horizonte, hoje é quem segura os bastidores da cidade. Não por carisma. Não por clamor popular. Mas por ofício e, principalmente, por vácuo.
Durante muito tempo, Juliano foi o tipo de vereador que circula sem deixar vestígio. Comparecia, votava, cumprimentava. Não criava caso nem pauta. Parecia destinado à irrelevância. Mas a política, às vezes, premia justamente os que não disputam palco e sabem esperar o momento de entrar em cena. Quando a disputa entre Gabriel Azevedo (MDB) e Marcelo Aro (PP) esgarçou o sistema, foi ele quem permaneceu. E, ao permanecer, ocupou.
Hoje, Juliano é mais do que presidente da Câmara. É o operador silencioso da governabilidade. É o elo, ainda frágil, entre Álvaro Damião (União Brasil) e Aro, que até pouco tempo não dividiam nem mesmo o elevador. Foi ele quem conduziu as conversas, amorteceu os ruídos, organizou a redistribuição de espaços na PBH. E, entre uma articulação e outra, já avisa: quer ser deputado estadual em 2026. Não faz disso segredo. Pelo contrário, planta com método e colhe com parcimônia.
A presidência da Casa, aliás, foi só o início da reconfiguração. Juliano não apenas herdou a estrutura; ele reescreveu os símbolos. A tradicional cadeira de Afonso Pena, retirada. O projeto Câmara Cultural, encerrado. A galeria de ex-presidentes, rearranjada. E o quadro de Gabriel Azevedo, ausente da cerimônia oficial, só voltou à parede depois que os aliados de Aro deixaram o Salão Nobre. Nada foi acidental. Em política, até o esquecimento pode ser método.
Mas Juliano não opera com os instrumentos clássicos da liderança. Não mobiliza afeto, não encarna rupturas, não oferece discurso. Seu capital é outro: a previsibilidade. Resolve sem criar ruído, cumpre sem prometer, escuta sem se comprometer. Um vereador da base define: “Ele não cobra. Ele entrega”. O que, num ambiente saturado de vaidades e promessas vazias, passou a ser considerado virtude.
Quando Álvaro Damião viajou ao Peru, foi Juliano quem assumiu o comando da prefeitura, não por protocolo, mas por escolha. A transmissão de cargo foi um gesto de cortesia institucional, cuidadosamente calculado para sinalizar confiança. E o gesto foi compreendido, dentro da base, pelo que de fato representava: um sinal verde. Juliano passou a ser visto como operador confiável, capaz de articular sem criar tensão.
Desde então, voltou a ocupar a cadeira outras vezes, um movimento impensável em administrações anteriores. Fuad Noman (PSD), por exemplo, preferia adiar viagens a ter de transferir o posto a Gabriel. A cadeira da PBH, mais do que poder, sempre carregou simbolismo.
O contraste, nesse tabuleiro, é inevitável. Gabriel tratava o cargo como liturgia: ensaiava gestos, compunha discursos, empunhava o regimento como quem segura um cetro com solenidade e teatralidade. Do outro lado, Marcelo Aro, padrinho político, centraliza pela força: cobra, controla, exige lealdade como moeda.
Juliano, por sua vez, não tem rito nem comando. Governa pelo silêncio, opera pela ausência. É o homem que não impõe, mas também não incomoda. E, num sistema cansado de fricções, isso basta para torná-lo indispensável.
Essa nova centralidade não nasce de um projeto pessoal robusto, mas da conveniência do sistema. A política municipal parece ter cansado dos personagens intensos. Hoje, prefere os que não dão trabalho. Juliano preenche esse espaço com precisão cirúrgica. E é exatamente aí que mora sua força e seu risco. Porque o que se apresenta como habilidade pode ser, também, um espelho de um tempo que prefere a ausência de conflito à presença de ideias.
Barreiro em aberto, Aro em alta
Com oito dos nove diretores regionais da Coordenadoria de Vilas e Favelas já definidos, só o Barreiro segue sem comando. Mas o cenário pode mudar nos próximos dias: o nome mais cotado para assumir o posto é Hugleiber Teixeira, líder comunitário do Bairro Lindéia e suplente na chapa do PP nas eleições de 2024. Hugleiber é próximo do presidente da Câmara, Juliano Lopes.
Coreografia
Na última semana, Álvaro Damião completou três meses no comando da Prefeitura de Belo Horizonte e celebrou o marco com um vídeo nas redes sociais ao som de “Melzinho”, de Talita Mel com Xand Avião, em que aparece abraçando populares, tirando fotos e circulando pela cidade. À primeira vista, parecia só mais uma trend da internet, mas, nos bastidores, a trilha era outra: a publicação veio após críticas discretas à sua baixa presença institucional e ao distanciamento da base aliada. O movimento também coincidiu com os números da mais recente pesquisa Opus/Estado de Minas, que apontou 42% de aprovação à sua gestão.
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Candidato por procuração
Impedido de assumir a prefeitura de São José da Varginha por uma condenação por tráfico de drogas, José Alves de Carvalho Neto (PP), o Netinho, decidiu permanecer no jogo por vias alternativas: lançou a própria irmã como candidata na eleição suplementar convocada após o indeferimento de sua candidatura. Embora tenha sido o mais votado em 2024, Netinho teve o registro barrado pela Justiça Eleitoral com base na Lei da Inelegibilidade, o que forçou o município, a cerca de 90 quilômetros de Belo Horizonte, a voltar às urnas. Nos bastidores, o movimento é visto como tentativa de manter o poder em família.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.