Ana Mendonça
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EM MINAS

Nikolas prova do próprio veneno

Se esse novo Nikolas será, de fato, desconectado das fake news, dos ataques sistemáticos e do legado tóxico da máquina que o projetou, ainda não se sabe

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“O que você faria se alguém todos os dias jogasse bosta em você?”. A pergunta escatológica foi feita pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em vídeo publicado nas redes sociais enquanto estava em viagem ao Japão. A metáfora, repetida com convicção, inaugura sua tese: ele estaria sendo vítima de uma campanha sistemática de fake news, difamações e ataques promovidos por adversários políticos, setores da imprensa e usuários das plataformas digitais. Nikolas se coloca como um alvo de guerra suja, um homem limpo tentando se desvencilhar do odor de uma máquina que opera para sujá-lo. Mas há um problema central nesse discurso, já que a lama que hoje o atinge é, em grande parte, a mesma que ele ajudou a fabricar.


A retórica da injustiça cola bem no Brasil de 2025, onde a política se tornou espetáculo moral, e o papel de vítima rende mais dividendos do que o de herói. O problema é que Nikolas Ferreira não é, exatamente, um estranho nessa engrenagem. Ele é seu filho mais bem-sucedido.


Sua trajetória foi construída em cima das mesmas ferramentas que hoje denuncia: vídeos cortados com precisão cirúrgica, indignações performadas diante de ring lights, memes com legendas amarelas, distorções narrativas que dispensam contexto e cultivam cliques.


O deputado reclama da velocidade com que fake news se espalham, da superficialidade das manchetes, do julgamento público antes dos fatos, da ausência de apuração nas redes sociais. Critica a lógica da torcida que se forma em torno de nomes, partidos ou ideologias, como se isso fosse uma novidade e não a base da política que ele próprio ajuda a radicalizar. No vídeo, tenta provar que está sendo injustiçado, distorcido, vítima de uma armação. Mas tropeça em dados concretos, documentos públicos e contradições que ele mesmo alimenta.


O primeiro exemplo é a votação recente de vetos do presidente Lula (PT). Nikolas afirma ter votado pela manutenção de um dos vetos para impedir aumento na conta de luz. E isso é verdade. Ele foi um dos dois únicos deputados da oposição a votar com o governo, contrariando a base bolsonarista, e fez questão de deixar isso claro como símbolo de sua “coerência”.


Mas, no mesmo dia, votou também a favor de outro veto presidencial, o que previa pensão vitalícia a crianças com sequelas da síndrome do zika vírus. Após a repercussão negativa, alegou que houve um “erro material” no preenchimento do voto remoto, atribuindo a falha à equipe do gabinete. Um voto vira prova de responsabilidade política; o outro, de erro técnico.


Em outro trecho, o deputado cita com veemência a tentativa de associá-lo a um primo preso por posse de drogas em Nova Serrana, cidade que recebeu emendas parlamentares de sua autoria.


A história veio a público exatamente no dia do seu aniversário e foi impulsionada nas redes por André Janones (Avante-MG), seu adversário político direto. A imprensa, como é comum nesses casos, seguiu o rastro. Nikolas não foi acusado de ilegalidade, mas a ligação simbólica com o primo preso e a cidade onde o deputado mineiro recebeu mais votos que qualquer outro parlamentar, se transformou em manchete.


Aqui, o jornalismo nasce da curiosidade, não da acusação. O fato é noticiado com precisão: a cidade onde Nikolas foi o mais votado é a mesma onde um familiar seu foi preso. A dúvida, essa se instala depois, quando a mesma informação passa a circular em canais paralelos, embalada por trilhas sensacionalistas e manchetes que mais provocam do que esclarecem.


O deputado também cita uma matéria que teria dito que ele gastou R$ 102 mil para promover um curso de política. No vídeo, acusa a imprensa de insinuar que o valor foi bancado com dinheiro público. Mas a reportagem em questão, atribuída ao Estado de Minas, deixa claro que a quantia foi paga com verba da própria empresa do deputado. Ou seja, a denúncia que ele faz, nesse caso, não se sustenta no corpo do texto. Ainda assim, a manchete é usada para reforçar a imagem de perseguição midiática.


Tudo isso acontece na mesma semana em que a Polícia Federal apontou o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como idealizador de um esquema clandestino de inteligência na Abin, conhecido como “gabinete do ódio”. A estrutura teria monitorado ilegalmente adversários e instrumentalizado a máquina pública para fins políticos.


Foi nesse mesmo ambiente de vazamentos seletivos, ataques coordenados e narrativas fabricadas que Nikolas se forjou. Era o pupilo, o jovem mais bem-intencionado. Pode não operar o esquema, mas é produto político dele.


Nikolas, no vídeo, termina com uma conclusão calculada: “a verdade vai chegando às pessoas com o tempo”. Pode ser. Mas há algo de cíclico nesse discurso, como no livro “O retrato de Dorian Gray”, no qual a degradação não se dá apenas no retrato pintado por outro, mas na imagem que o próprio personagem constrói de si.


Talvez este pronunciamento marque o início de uma transição. Nos bastidores de Brasília, interlocutores próximos relatam que o deputado mineiro tem discordado de Jair Bolsonaro em decisões mais radicais. Não tem endossado a retórica golpista do entorno do ex-presidente e vem apostando em nova vertente batizada de “nikolismo”. Um projeto político próprio, focado na formação de vereadores e prefeitos com perfil jovem, conservador, mas menos colado ao bolsonarismo raiz. Um movimento que tenta se descolar da retórica da destruição e buscar um espaço próprio na direita brasileira.


Se esse novo Nikolas será, de fato, desconectado das fake news, dos ataques sistemáticos e do legado tóxico da máquina que o projetou, ainda não se sabe. Mas o gesto de se dizer sujo, mesmo que para negar a culpa, talvez seja o primeiro sinal de que, desta vez, ele enxergou o espelho.

Investimento

Durante missão internacional no Japão, o grupo Sumitomo Corporation anunciou um investimento de R$ 140 milhões para a instalação de uma unidade de armazenamento e beneficiamento de sementes de soja em Patos de Minas, no Alto Paranaíba. A planta, que será operada pela Agro Amazônia, deve gerar 40 empregos diretos e entrar em funcionamento até o fim de 2026. O anúncio foi feito nesta sexta-feira (20/6), durante agenda da comitiva liderada pelo governador Romeu Zema (Novo), que destacou o potencial de Minas Gerais e a importância da parceria com empresas japonesas para o desenvolvimento do estado.

Prêmios

A campanha eleitoral em Itapecerica, no Centro-Oeste de Minas, garantiu quatro troféus ao marqueteiro mineiro Celso Lamounier no Polaris Awards 2025, um dos principais prêmios internacionais de marketing político. A cerimônia foi realizada em Londres, na sexta-feira (13/6), com a presença dos maiores nomes da comunicação política mundial.

De volta

A chegada de Álvaro Damião a Belo Horizonte foi cuidadosamente articulada pela prefeitura. Havia, nos bastidores, o temor de que o prefeito fizesse declarações inflamadas sobre o conflito entre Israel e Irã, o que poderia gerar repercussões negativas. Por isso, antes do desembarque, foi montado um esquema de contenção e alinhamento: assessores tiveram uma conversa direta com Damião, orientando-o a evitar falas polêmicas ou excessivamente “manchetáveis”.


A recepção também foi pensada com simbolismo: a filha foi convidada a recebê-lo publicamente, enquanto a namorada, mais jovem, permaneceu nos bastidores, longe dos holofotes.


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As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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