

Vereadores mais preocupados com likes, tretas e bonés
Enquanto isso, a cidade segue com seus problemas reais. Mas quem se importa? No fim das contas, a guerra dos likes rende mais cliques do que as questões locais
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“Não somos a Câmara Federal de Belo Horizonte.” A frase do novato Helton Júnior (PSD) soou como um desabafo. Mas os primeiros dias da nova legislatura dizem o contrário. No plenário, a disputa já não é por projetos ou melhorias para a cidade. O que vale são os cortes de vídeo, os discursos inflamados, as tretas que viralizam nas redes. Vereadores eleitos para ajudar a resolver problemas da cidade não escondem que miram voos mais altos: Assembleia, Câmara dos Deputados e, para os mais ambiciosos, até o Senado.
A legislatura começou com um acessório inesperado roubando a cena: bonés. Pedro Rousseff (PT), Pedralva (PT) e Luiza Dulci (PT) desfilaram pelo plenário com um modelo azul, distribuído pelo marqueteiro de Lula, Sidônio Palmeira, estampado com a frase “O Brasil é dos brasileiros.”
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O gesto, claro, não passou batido. Vile Santos (PL), o nome de Jair Bolsonaro (PL) na Casa, reagiu com um discurso inflamado. Minutos depois, Pablo Almeida (PL), afilhado de Nikolas Ferreira (PL), subiu à tribuna ostentando um boné preto com os dizeres: “Sem café, sem picanha e sem cerveja.”
Nos corredores, vereadores mais experientes riram da cena. O embate ideológico costumava ficar restrito ao Congresso Nacional, mas a troca de farpas no plenário escancarou uma tendência: a política nacional engolindo a municipal.
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Enquanto o eleitor quer saber se haverá passe livre na capital ou como ficará o novo escape do Anel Rodoviário, muitos de seus vereadores preferem debater deportações, Lula, Bolsonaro e até Donald Trump. E mais: sem aumento de salário – que por ora seguirá congelado –, a principal discussão nos bastidores tem sido o vale-alimentação. Em tempos de passagem cara e supermercado pesando no bolso, até os vereadores estão chorando uma ajuda extra para o presidente da Câmara, Juliano Lopes (Podemos).
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Se a guerra dos bonés foi só um aperitivo, a sessão seguinte virou um ringue. Lopes decidiu pautar o polêmico projeto de Flávia Borja (DC), uma de suas grandes aliadas, que impede mulheres trans de competirem em categorias femininas. Do lado de fora, protestos da comunidade LGBTQIA+. Na galeria, gritos de “fascista” e acusações de corrupção envolvendo o setor dos transportes coletivos. No plenário, o circo armado.
A confusão atingiu o ápice quando Flávia Borja desafiou a única vereadora trans da Casa, Juhlia Santos (PSOL), para uma luta de boxe. “Fight. 1x1,” provocou. Pablo Almeida e Vile Santos ironizaram: “Apostamos na vereadora para o combate.” Juhlia rebateu sem perder o decoro: “Adoraria bater sem correr esse risco.” Iza Lourença (Psol) entrou na discussão, sugerindo que poderia enfrentar Flávia para provar que não haveria diferença entre ela e Juhlia.
Enquanto isso, um manifestante foi retirado da galeria a chutes e socos, por ordem do presidente da Casa, que se irritou porque não conseguia ouvir os colegas no plenário. No fundo da sala, uma vereadora mais experiente pediu para sair. Reclamou de dor de cabeça e se absteve da votação. Já os conservadores mais jovens, inflamados, aplaudiram a ação dos seguranças. No dia seguinte, Flávia apareceu no gabinete de Pablo e Vile com luvas de boxe. O vídeo viralizou.
A briga trouxe outro problema: com a proibição da presença de assessores no plenário, muitos passaram a ocupar a galeria, de onde demonstram apoio efusivo aos seus vereadores – e, o que tem incomodado, manifestações negativas aos adversários.
Os gritos com xingamentos mais pesados vêm pegando mal. O próprio Juliano Lopes pediu cautela: alertou que a prática não era ética e que o plenário não poderia virar palco de linchamento.
Os primeiros dias da nova legislatura da CMBH deixam um recado claro: a polarização da política nacional seguirá firme entre os representantes de Belo Horizonte. Enquanto isso, a cidade segue com seus problemas reais. Mas quem se importa? No fim das contas, a guerra dos likes rende mais cliques do que as questões locais.
Dois caminhos
O prefeito em exercício, Álvaro Damião, disse a vereadores aliados que a base não precisa estar sempre ao lado da prefeitura. Para ele, a PBH pode caminhar sem a Câmara – pelo menos por enquanto. Na sua visão, os projetos mais relevantes foram aprovados na legislatura anterior, o que reduz a urgência de alianças formais.
Comissão definida
A Câmara de Belo Horizonte finalmente concluiu a formação da Comissão de Mulheres, última pendência na distribuição dos grupos temáticos. As vereadoras Michelly Siqueira (PRD), Flávia Borja (DC), Juhlia Santos (Psol), Loíde Gonçalves (MDB) e Luiza Dulci (PT) serão as titulares, enquanto Fernanda Altoé (Novo), Iza Lourença (Psol), Janaina Cardoso (União), Marilda Portela (PL) e Marcela Trópia (Novo) ficam como suplentes. A nomeação foi oficializada nesta sexta-feira (7) pelo presidente da Câmara, Juliano Lopes (Podemos), no Diário Oficial do Município.
Liderança contestada
O deputado estadual Noraldino Júnior (PSB) deve assumir a liderança do bloco governista “Avança Minas” na Assembleia Legislativa. O grupo, que reúne 22 parlamentares, ficou sem comando após sua recriação na quarta-feira (5). Mas a escolha não foi unânime: alguns deputados não gostaram da decisão, gerando mais um atrito na já turbulenta base do governo Zema.
Vereador investigado
A Polícia Civil de Minas Gerais informou que o vereador Wladimir Canuto (Avante), de Felício dos Santos, na Região Central do estado, será investigado por homicídio doloso. No início desta semana, o parlamentar invadiu a sala de emergência durante o atendimento de um paciente, um idoso de 93 anos, na Unidade Básica de Saúde (UBS). O idoso faleceu posteriormente, e a polícia agora investiga se a interrupção do atendimento pode ter contribuído para aumentar o risco de morte.