Alimentação adequada do gado reduz a emissão de metano
Estudo da Epamig propõe o consumo de leguminosas como o amendoim forrageiro e a cratília para inibir a atividade de bactérias metanogênicas
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Siga noNão é segredo que o processo digestivo dos bovinos emite para a atmosfera gases de efeito estufa, principalmente o metano (CH4), que tem grande potencial para contribuir com o aquecimento global. A busca pela produção sustentável, ou mesmo a necessidade de se enquadrar em metas de emissões - como o Plano Estadual de Ação Climática (Plac) do governo de Minas Gerais, que visa a neutralidade de emissões líquidas de gases de efeito estufa até 2050, ou os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da Onu (Organização das Nações Unidas) - estimulou a Epamig (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais) a desenvolver um estudo para reduzir esta e outras fontes de emissão.
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De acordo com o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), o setor agropecuário é o maior responsável pelas emissões desses gases em Minas Gerais, superando a indústria, a produção de energia e o desmatamento. Em 2023, o setor respondeu por 35,2% das emissões no estado (59,79 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente). Dentro das emissões do setor - que tem como fontes o manejo de dejetos animais, solos manejados, queima de resíduos agrícolas e cultivo de arroz - a fermentação entérica responde por 63% das emissões (37,70 MtCO2e). A título de comparação, no Brasil, a agropecuária foi a segunda maior fonte emissora (com 27,5% do total), perdendo apenas para o desmatamento, responsável por 46,3% dos gases de efeito estufa em 2023.
Essa fermentação entérica é justamente a causa da emissão de gás metano durante o processo digestivo dos bovinos. Quando esse animal consome seu alimento, a fibra é degradada dentro do rúmen, que é o primeiro dos quatro compartimentos do estômago dos ruminantes. É no rúmen que acontecem os processos fermentativos que decompõem a celulose. O hidrogênio (H2) é um dos produtos da fermentação ruminal sendo utilizado pelas bactérias metanogênicas presentes nesse ambiente. A combinação entre hidrogênio e carbono neste ambiente é o que forma o metano, cuja maior parte é expelida pela eructação (o arroto), além de uma pequena parte pela flatulência do animal. Apesar desse ser um processo natural, como o rebanho de bovinos é grande, a emissão acaba sendo significativa.
De acordo com Edilane Silva, coordenadora do Programa Estadual de Pesquisa em Bovinocultura da Epamig, está em curso uma pesquisa que visa reduzir essas emissões por meio de alternativas alimentares que resultem em menor produção de metano entérico. Para isso, a ideia é oferecer aos animais leguminosas como o amendoim forrageiro e a cratília. “As leguminosas produzem compostos bioativos - como taninos, saponinas e ácidos fenólicos - que podem inibir a atividade das bactérias metanogênicas no rúmen”, explicou a pesquisadora.
Outros alimentos podem ser fornecidos para reduzir a produção de hidrogênio, que vai formar o metano dentro do rúmen. Edilane cita, por exemplo, a introdução de óleos essenciais, que atuam na redução dessa população de bactérias. “Os óleos essenciais podem alterar a composição e a atividade das bactérias no rúmen, resultando em uma menor produção de metano. Certos óleos essenciais podem inibir diretamente as bactérias produtoras de metano, reduzindo a sua população no rúmen”, explicou a coordenadora da Epamig. O estudo também vai testar a eficiência de alguns produtos desenvolvidos por outras empresas que também prometem diminuir a produção de metano entérico.
Por enquanto, esses óleos essenciais e produtos estão tendo sua eficácia testada in vitro, dentro do laboratório. O próximo passo é administrar essas dietas em animais confinados, junto a grandes produtores. O amendoim forrageiro está sendo implantado no Campo Experimental Getúlio Vargas da Epamig de Uberaba, no Triângulo Mineiro. Já existem informações de que o uso de leguminosas tais como o amendoim forrageiro reduz em até 30% as emissões de metano.
Os resultados dessa pesquisa serão validados em uma fazenda localizada em Uberaba, uma parceria entre a Epamig e o Grupo Agronelli, empresa mineira que tem como uma das principais atividades a produção de leite. “Como eles possuem fazendas de grande porte, os resultados poderão ser avaliados em larga escala. É um exemplo de pesquisa aplicada, sendo executado em um ambiente produtivo real, o que possibilita os demais produtores de leite observarem os efeitos da adequação da dieta in loco”, explica Edilane.
“Estamos buscando soluções para uma produção mais equilibrada e sustentável. Juntos, vamos contribuir para um balanço de emissões mais favorável e demonstrar que é possível produzir com responsabilidade ambiental”, explica José Bellote, diretor agroindustrial do Grupo Agronelli, pontuando a importância da pesquisa para desassociar a imagem da agropecuária como vilã das mudanças climáticas. A ideia é que esse projeto seja difundido entre os produtores rurais com apoio de instituições parceiras do governo estadual.
Além de buscar alternativas para reduzir a emissão de metano entérico na bovinocultura, o estudo quer associar essa nova dieta ao sequestro de carbono por meio de sistemas integrados. Nesta prática, na mesma área em que se planta uma lavoura, como o milho, para produzir silagem, planta-se também sementes de capim. Após a colheita do milho, os bovinos entram nessa área para consumir o capim, que aproveitou os nutrientes da lavoura para crescer. “É um capim mais nutritivo e com melhor digestibilidade para o animal”, explica a pesquisadora da Epamig. Edilane acrescenta que esse sistema ainda pode ser integrado com o plantio de eucalipto, que também vai sequestrar carbono da atmosfera.
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