próximo do céu

O que leva tanta gente a querer visitar o deserto do Atacama?

No extremo Norte do Chile, destino é um oásis no local mais seco do mundo. Toda a contradição entre os climas gera paisagens tão lindas quanto inesperadas

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A pura e simples menção a um oásis já carrega em si conceitos que remetem ao paradoxo e às diferenças mais bruscas. No caso de San Pedro de Atacama, pequena cidade situada no deserto mais alto e seco do planeta, essas ideias são extrapoladas a uma variedade de paisagens e experiências tão amplas que se torna difícil acreditar que seja possível divisar em um raio de poucos quilômetros imagens com pradarias verdejantes, paredões rochosos, dunas de areia fina e escura, lagos azuis, montanhas com picos nevados, vulcões exuberantes, e por aí vai…

 

O centro urbano de San Pedro de Atacama se resume a uma avenida central com pequenas ruas que lhe alimentam. O centro histórico e cultural se desenvolve a partir da igreja da cidade, fundada no século 17 ainda no período colonial. A vocação turística da cidadezinha é escancarada: bastam alguns minutos para perceber que as atividades oferecidas pela população local, que não ultrapassa as cinco mil pessoas na área do povoado, são dominadas pela venda de artesanato, restaurantes e por agências de viagens às dezenas.

A reportagem do Estado de Minas esteve em San Pedro a convite da Latam, companhia aérea que oferece o trajeto entre Belo Horizonte e o deserto do Atacama, e visitou parte dos destinos turísticos que estampam os folhetos, placas e cartazes espalhados pelo vilarejo. Destaque para a palavra “parte”, já que seria necessária uma vida de viagens periódicas ao local para completar o catálogo de experiências possíveis.

Nesta matéria, listamos o que vimos do grande deserto Sul-americano que em nada se adequa à definição da palavra que a associa a um espaço monótono, vazio e sem atrações.


Quebrada del Diablo

 No passeio de bike para observar o pôr do Sol na quebrada del Diablo, é preciso ter muito preparo físico
No passeio de bike para observar o pôr do Sol na quebrada del Diablo, é preciso ter muito preparo físico Bernardo Estillac/EM

A quebrada del Diablo, ou “quebrada del chulakao” (como indica a placa na entrada do local, no idioma original da região), é um dos passeios que pode ser feito em bicicletas. São cerca de 15 quilômetros desde o povoado de San Pedro até a trilha que nos leva por dentro de um vale rochoso até atingir um pico com mais de três mil metros de altitude.

O passeio se dá no meio da cordilheira do sal, uma das cadeias montanhosas da região e a que permite ao visitante uma experiência próxima do que se pode esperar estereotipicamente de um deserto. O caminho é inteiramente tingido pelos tons terrosos do Atacama, variando entre um laranja queimado e o marrom desde a trilha tortuosa até o topo das formações rochosas.

Apesar da paisagem tipicamente desértica, o trajeto lhe recorda das incongruências típicas de um oásis. Em certo momento, por exemplo, é preciso forçar a pedalada para atravessar um pequeno rio que corta a paisagem. O caminho d’água, porém, não alivia o calor durante o dia e muito menos o quão seco é o ar na região.

Após cerca de uma hora de força no pedal morro acima, se chega ao sopé da colina mais alta da Quebrada del Diablo, de onde se contempla a vastidão da cordilheira de sal no interior da cadeia montanhosa. Com esforço, se divisa na linha do horizonte a Cordilheira dos Andes e o Licancabur, vulcão com cerca de seis mil metros de altura na fronteira entre o Chile e a Bolívia que se faz visível em quase todos os passeios nos arredores de San Pedro de Atacama.

Como se trata de um passeio longo, o turista precisa estar atento à relação com o clima, um aspecto importante em qualquer momento no Atacama. Ao iniciar a jornada nas primeiras horas do dia ou finalizar com o sol poente, se enfrenta o momento mais quente do dia sob o sol inclemente do deserto. No inverno, a variação de temperatura dica entre zero e 20°.

No pôr do Sol, por exemplo, em questão de minutos a sensação de calor ampliada pelo trajeto de bicicleta na altitude e a alta exposição aos raios solares dá espaço ao frio intenso provocado, em partes, pelo mesmo fator da alta elevação em relação ao nível do mar.

Para amenizar o efeito da amplitude térmica a receita é simples e deve acompanhar o viajante durante toda a estadia no Atacama: o tradicional ‘tira casaco, coloca casaco’. A dica dos guias é levar várias peças de roupa, o que possibilita variar o nível de proteção contra o frio em diferentes níveis.

É possível alugar uma bicicleta na cidade e os preços variam entre R$ 50 e 100 pela diária. A entrada na comunidade gira em torno dos R$ 20 e é possível negociar os valores ao fechar pacotes com guias nas agências de turismo de San Pedro de Atacama. Via de regra, os valores sempre variam de acordo com o negociado no vilarejo.


Lagunas Cejar e Piedra

Visualmente, poucos passeios na região de San Pedro de Atacama são tão interessantes para desfrutar da combinação de paisagens conflitantes do oásis quanto as lagoas Cejar e Piedra. No caminho até os espelhos d’água, se cruza uma área estereotipicamente desértica: árida e sem vegetação. Até que se chega ao destino final onde a água quebra as cores terrosas com um azul vivo e as bordas brancas de sal cristalizado.

As duas lagoas são abastecidas por águas subterrâneas que emergiram após anos de ocupação dos povos atacamenhos. A população local cavava valas para aumentar as áreas úmidas do oásis e permitia a irrigação. O resultado, além de uma paisagem exuberante, foi a possibilidade da existência de diversas espécies de répteis, insetos e aves na região, incluindo os flamingos, símbolo da Comunidad Atacameña de Solor, responsável pela gestão e preservação da área.

É possível se banhar nas águas da Laguna Cejar. Se banhar, mas não mergulhar. Ao menos não por muito tempo. A alta concentração de sal no lago impede que se afunde independentemente da profundidade. Mesmo para se manter na vertical nas diáfanas águas da lagoa é preciso se esforçar, já que a posição natural para o corpo seria boiar na horizontal.

Laguna Miscanti

Aventure-se por passeios no deserto com a observação das vicunhas
Aventure-se por passeios no deserto com a observação das vicunhas Tierra Atacama/Divulgação

Entre os passeios mais distantes da cidade de San Pedro, um dos mais belos tanto pelo destino como pelo trajeto é a Laguna Miscanti. A viagem dura cerca de duas horas desde o vilarejo, mas a estrada até lá é uma atração à parte. Com longas retas cortando um planalto desértico ladeado pelas montanhas nevadas da Cordilheiras dos Andes, a estrada cruza o Trópico de Capricórnio.

A linha imaginária cartográfica é sinalizada por placas lotadas de adesivos que denotam como a região é destino de viajantes de todo o mundo, mas também indicam referências locais. É possível, por exemplo, ver uma gravura com o rosto de Salvador Allende, presidente chileno assassinado durante o golpe militar em 11 de setembro de 1973. Há ainda inscrições de frases que pedem uma saída do mar para a Bolívia, indicando as influências multiétnicas e nacionalistas da região de Antofagasta, disputada entre o Chile e os bolivianos, mas também muito próxima da fronteira com a Argentina.

O caminho segue até a lagoa com variações de paisagens que chegam a contar com longas pradarias de vegetação rasteira, mas esverdeada, e grupos de dezenas de vicunhas, uma espécie de prima das lhamas, tão simpáticas quanto suas parentes mais famosas e com uma lã ainda mais valiosa.

O lago está situado na Reserva Nacional Los Flamencos, no altiplano Norte dos Andes e fica a 4,2 mil metros acima do nível do mar. Os números da elevação são sentidos no cansaço ao caminhar pequenas distâncias ou ao realizar movimentos ligeiramente mais bruscos. Esse efeito, no entanto, é aliviado ao longo do tempo.

Estar tão alto alimenta outra interessante dicotomia do turismo no Atacama. A região do Lago Miscanti, especialmente no inverno, é gélida e o vento exige que as roupas sejam não apenas termicamente confortáveis, mas que evitem a entrada de correntes de ar. Ao mesmo tempo, tão indispensável quanto gorros, luvas, cachecóis e casacos é o protetor solar. A proximidade com o sol na atmosfera rarefeita a ausência de nuvens torna os raios solares castigantes, por mais que não se sinta exatamente seu calor.

Dito tudo isso, a Laguna Miscanti oferece paisagens inacreditavelmente maravilhosas. O lago tem origem vulcânica e é cercado por montanhas como os vulcões Cerro Miscanti e o Cerro Miñiques. Este último leva o nome do dedo mínimo, ou o mindinho, em espanhol. O apelido não se justifica por seu tamanho, já que a formação é gigantesca, mas por sua localização, que aparenta ser o último elemento de uma mão colossal que envolve a lagoa de águas azuis com bordas brancas salinizadas.

As variações entre as formações rochosas vulcânicas negras, o branco do sal, o azul da água é quebrada cromaticamente pelas aves brancas, negras e os flamingos rosados. O mesmo acontece no lago Miñiques, localizado logo ao lado.

Assim como em outros pontos turísticos do Atacama, o controle de visitantes aos lagos Miscanti e Miñiques é feito pela população local. No caso, a comunidade indígena de Socaire, vilarejo mais próximo e ponto de parada nos trajetos até os espelhos d’água e Piedras Rojas, que serão descritas logo mais nesta mesma matéria.

 Em Piedras Rojas e no caminho até o local é possível também avistar parte da fauna bastante específica do Atacama
Em Piedras Rojas e no caminho até o local é possível também avistar parte da fauna bastante específica do Atacama Bernardo Estillac/EM

Piedras Rojas

O mesmo caminho que leva até o Lago Miscanti permite a chega a Piedras Rojas. Os mesmos mais de 4 mil metros de altitude são sentidos com mais rigor aqui, já que o passeio envolve uma caminhada mais longa, mas tão ou mais recompensadora que no passeio descrito anteriormente.

O nome do local é sugestivo, significa ‘pedras vermelhas’ em espanhol e se refere às formações rochosas por onde se pisa. A coloração não se repete, no entanto, por onde os olhos passeiam. O local fica próximo do Salar de Aguas Calientes, na fronteira com a Argentina e, embora o rubro das formações geológicas batizem o ponto turístico, a variação de cores proporcionada pelas águas azuis dos lagos existentes na região e o reflexo do sol nos diferentes momentos do dia são um diferencial do passeio.

Em Piedras Rojas e no caminho até o local é possível também avistar parte da fauna bastante específica do Atacama. Além dos já citados flamingos e vicunhas, o turista mais atento pode encontrar vizcachas camufladas nas rochas, um roedor semelhante a um coelho, mas maior e com uma longa cauda felpuda. Nos lagos também se avistam as taguas gigantes, ave semelhante a uma galinha de penugem inteiramente preta e patas vermelhas.

Valle de La Luna

 No Valle de la luna se experimenta o silêncio absoluto proporcionado pela ausência completa de vida animal e pela aridez.
No Valle de la luna se experimenta o silêncio absoluto proporcionado pela ausência completa de vida animal e pela aridez. Bernardo Estillac/EM

O Valle de La Luna reserva outra experiência tipicamente desértica. Bem próximo do centro de San Pedro de Atacama e nos arredores da Cordilheira do Sal, o local recebe o nome a partir do satélite natural que orbita a Terra por oferecer ao turista uma paisagem semelhante à da superfície lunar, com formações rochosas pontiagudas intercaladas por paredões e dunas de uma areia fina e escura. O relevo do local alterna formações desgastadas por milhares de anos de erosão com estruturas geologicamente jovens oriundas do choque entre as placas tectônicas de Nazca e a Sul-Americana.

No Valle de La Luna se experimenta o silêncio absoluto proporcionado pela ausência completa de vida animal e pela aridez. O melhor momento para a visita é durante o entardecer, quando se pode aproveitar a junção cromática das formações rochosas avermelhadas com o alaranjado pôr do sol. A entrada no parque custa cerca de R$ 60, a depender da variação do câmbio com o peso chileno.

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