"A IA substituirá os humanos que se mantiverem resistentes a mudanças"
Evento de Inteligência Artificial realizado pela StartSe, que termina hoje (16/10), em São Paulo, recebe o 1º AI Festival do Brasil
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Empresários, ‘startupers’, especialistas e inovadores estão reunidos, desde ontem (15), no Espaço Pro Magno, em São Paulo, para o 1º AI Festival, promovido pela StartSe, uma escola internacional de negócios que prepara líderes para um mundo em constante disrupção. O foco é o impacto da inteligência artificial nos negócios no Brasil.
Junior Borneli, fundador e CEO da StartSe, abriu o evento com uma palestra inspiradora e, ao mesmo tempo, assustadora, mostrando não apenas as mudanças que o mundo atravessa, mas também a velocidade em que essa transformação ocorre. Para Borneli, a IA está “redefinindo tudo, mas estamos apenas no começo. O algoritmo vai ajudar você a comprar e está redefinindo o varejo online. A jornada de compra passou para 15 segundos”, comenta o empresário.
Borneli fez muitas provocações e reflexões sobre esse mundo transformado. Empresas perderão rapidamente sua relevância se não transformarem por completo seu modelo de negócio. “A IA está reescrevendo como fazemos marketing, relacionamento com os clientes e até como pedimos comida por delivery. O iFood lançou a Ailo, uma assistente de IA em que o usuário poderá descrever o tipo de comida que quer, suas restrições alimentares e a plataforma, com uma entrega das melhores opções de restaurantes. Não se trata apenas de um novo jeito de interagir com aplicativos, mas também reconfigura o modelo de negócio das empresas.”
Para o executivo, o letramento em inteligência artificial é a única alternativa para o futuro, sendo uma necessidade inadiável, e não uma escolha. A IA vai se tornar onipresente em pouco tempo: “A falta dessa alfabetização pode aumentar a distância do Brasil em relação a países mais desenvolvidos. Não é à toa que a IA é considerada um acelerador de oportunidades, capaz de aumentar a produtividade e a empregabilidade. Não fazer esse movimento afasta as pessoas dessas chances”, acrescenta.
A soberania do Brasil também é uma questão destacada por Borneli. Para ele, esse tema deve ser tratado como uma "questão de Estado" e de "soberania", e manter o controle dos dados da população e do país traz autonomia. “O Brasil tem potencial para ser um "paraíso dos data centers" (com recursos naturais favoráveis), mas é impedido por burocracia e insegurança jurídica. Desenvolver tecnologias locais fortalece o país, tornando-o "menos suscetível a interferências estrangeiras", relacionadas à cultura, dados e manipulações.
A IA vai substituir os humanos?
A IA pode substituir os humanos, mas especificamente substituirá os humanos que se mantiverem resistentes à mudança. Essa visão de Borneli ganha cada vez mais força no mundo do trabalho. Os profissionais que se mantêm relevantes são aqueles que entendem a lógica e conectam a tecnologia com os negócios.
“O mundo enfrenta a maior jornada de requalificação da história, sendo a substituição de humanos por máquinas um processo cíclico já visto em revoluções anteriores, como a industrial e a agrícola”, completa Junior Borneli, fundador e CEO da StartSe.
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Outro destaque do AI Festival é a apresentação da Manus AI, considerada uma das inteligências artificiais mais avançadas do mundo. É uma tecnologia desenvolvida na China, que amplia a concorrência no mercado dos modelos de IA dominado pelos Estados Unidos. As grandes corporações estão de olho na IA e, não por acaso, estão investindo, desenvolvendo e comprando startups que se destacam nessa nova área.
Um dos exemplos é a Zup, empresa do grupo Itaú Unibanco, que se uniu à StackSpot, plataforma de GenAI, para impulsionar grandes organizações. O evento reúne ainda grandes nomes do mercado corporativo como Luis Tonisi, presidente da Qualcomm para a América Latina, e Frangzhou Chen, Business & Strategy da Manus AI, entre outros. Além das palestras, o evento também é uma feira de negócios e workshops.
ENTREVISTA
Yes, nós temos uma IA para chamar de nossa
Nelson Leoni, CEO da Widelabs e idealizador da primeira IA brasileira, a Amazonia.IA
Nelson Leoni serviu no Exército Brasileiro, comandou a missão da ONU no Haiti e foi ferido em combate, o que o fez repensar a vida e seu propósito. Hoje, ele comanda um projeto arrojado e inovador para o Brasil: a Amazônia.IA (https://amazoniaia.com.br/), a primeira Inteligência artificial brasileira, sobre a qual ele tem orgulho de falar: “Somos o primeiro LLM soberano, desenvolvido por uma empresa brasileira, com ciência brasileira e que conhece realmente nossa língua, nossa cultura e nosso Brasil”. Em entrevista ao Estado de Minas, Nelson Leoni contou essa história.
Vocês lançaram o Amazônia.IA, a primeira IA brasileira. Como foi o desenvolvimento e há quanto tempo existe esse projeto?
A ideia da Amazônia surgiu em 2023, quando a Widelabs conversou com a NVIDIA e a Oracle. Falamos da nossa ambição de desenvolver um modelo grande de linguagem, de IA generativa, que conhecesse nossa costura e nossa língua, se atentando aos sotaques e soubesse da história do Brasil a partir de nossa ótica, não a ótica dos outros.
A Amazônia.IA foi lançada em julho do ano passado. Ele é um modelo fechado e não foi treinado baseado num único modelo, mas sim numa estratégia de mistura de expertises (a mesma metodologia utilizada, meses depois, pela DeepSeek). Eu sei que não conseguimos competir dentro de um campo de negócio com a OpenAI e com a Meta, porque elas são gigantes. Mas, ao mesmo tempo, a gente tem diferenciais competitivos que eles não conseguem entregar, que significa soberania, segurança de dados, tudo dentro do nosso mercado. A Amazônia.IA é um ecossistema com mais de 20 modelos de vários tipos, como visão computacional e transcrição de áudio. Além disso, somos uma fábrica de IA.
Quem são os clientes do Amazônia.IA?
Nossos clientes são do setor público. Conseguimos entregar a possibilidade de personalização dos modelos, algo que seja adequado às necessidades deles, desenvolvendo aplicações e soluções. A solução completa pode, inclusive, ficar hospedada na nuvem e até dentro do seu data center próprio, dando o nível máximo de soberania e 100% de controle da solução.
Como convencer as pessoas a utilizarem o Amazônia.IA?
Eu diria que o meu argumento ficou muito mais facilitado este ano porque a gente está vivendo um contexto político global um tanto diferente. O mundo está um pouco mais quente e fervilhante. E, por conta disso, a preocupação em relação à independência tecnológica passou a ser um ponto de discussão em qualquer país do mundo.
Essa IA sabe apenas sobre o Brasil?
O Amazônia.IA sabe tudo de tudo. Ele foi treinado e tem conhecimento bem amplo e abrangente sobre o conhecimento geral do mundo inteiro. Mas, claro, ele realmente tem um conhecimento mais aprofundado do Brasil.
As instituições públicas brasileiras são treinadas com dados do próprio governo. No Chile, por exemplo, a gente acabou de lançar o Patagônia, e o modelo tem que saber mais do Chile e não tanto do Brasil. Por que o Amazônia.IA não foi levado para o Chile? Porque ele é brasileiro. E essa questão da independência tecnológica é também independência cultural. Você ter contado a sua história, a sua cultura, a sua língua, sobre a ótica de alguém que não nasceu no seu país, que não conhece a sua cultura, eu acho isso até perigoso.
Você serviu no Exército Brasileiro; fazendo uma analogia, hoje a IA é a maior guerra que estamos enfrentando?
Eu não tenho dúvida nenhuma de que sim. Qual é o problema da inteligência artificial em relação a essa preocupação? A IA está avançando muito rápido, e o nosso grau de conhecimento e educação em relação à IA não está acompanhando essa velocidade. A gente é um pouco inocente às vezes quando usamos a IA. Estamos adotando muito rápido a tecnologia, mas não estamos aumentando nossa capacidade de conhecimento na mesma velocidade. Esse é um ponto. Agora, o outro ponto é a oportunidade que países em desenvolvimento e países mais pobres têm da implementação de IA para gerar resultado prático, rápido e com muito impacto nas instituições públicas e na população.