Leis simbólicas dividem espaço com temas centrais na Câmara de BH
Levantamento do EM mostra que, no primeiro semestre, de 65 leis sancionadas, 30% tratam de datas comemorativas e nomes de ruas
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Siga noO primeiro semestre de 2025 na Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) foi marcado por uma agenda legislativa que alternou projetos de grande impacto para a cidade e proposições de caráter eminentemente simbólico. Levantamento feito pelo Estado de Minas aponta que, de 65 leis sancionadas até 30 de junho, 20 delas, o equivalente a 30%, tratam exclusivamente da criação de datas comemorativas ou da nomeação de ruas, praças e viadutos.
Medidas desse tipo, de baixo custo e apelo local, costumam ser usadas por vereadores para cultivar apoio de suas bases, mas chamam atenção pela proporção frente a demandas de maior impacto para a população como transporte público, saúde, segurança e habitação, temas que, embora debatidos, avançaram menos no período.
A prática não é nova nem restrita à capital mineira. Projetos simbólicos são comuns em câmaras municipais e assembleias de todo o país por oferecerem retorno político, sem afetar o orçamento nem gerar grandes resistências. Há exceções, como o caso da Lei nº 11.863/2025, que instituiu o “Dia Municipal dos Métodos Naturais”, a ser celebrado em 7 de julho, e mobilizou o plenário neste ano.
A proposta, criticada por parlamentares de esquerda, prevê a realização de eventos e palestras para divulgar formas de evitar a gravidez sem uso de medicamentos ou preservativos, como o método Billings e a chamada ‘tabelinha’. Para opositores, o texto desestimula o uso de contraceptivos modernos e pode favorecer o aumento de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs).
Apesar disso, propostas de homenagens e criação de datas comemorativas geralmente são aprovadas sem grandes obstáculos. É o caso da Lei nº 11.865/2025, que batiza de Sargento Roger Dias o viaduto na interseção das avenidas Waldomiro Lobo e Cristiano Machado, no bairro Guarani. O policial militar homenageado morreu em janeiro do ano passado durante uma operação na região Norte da capital.
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Propostas sociais e saúde equilibram
Por outro lado, um volume expressivo de leis voltadas para políticas sociais, saúde e inclusão indica uma tentativa dos vereadores de dar respostas mais diretas às demandas da população. Ainda segundo o levantamento, 14 normas (21,5%) buscam atender demandas sociais, por meio de programas, garantias de direitos e ações de assistência. Entre os exemplos estão leis que criam o Programa Jovem Atleta (Lei Nº 11827/2025), que busca incentivar a prática de esportes e a participação igualitária de alunos em eventos esportivos; e políticas de apoio a crianças com transtornos como Transtorno do Espectro Autista e Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (Lei Nº 11848/2025).
A produção legislativa revela ainda preocupação com urbanismo. 11 leis (16,9%) tratam de regras de edificações, alterações no Código de Posturas e desafetação de áreas públicas. A lista inclui normas para proteger áreas verdes, como a “Mata Lareira” (Lei Nº 11836/2025).
Outras seis leis (9,2%) formalizam o reconhecimento de manifestações culturais e religiosas, como o Carnaval (Lei Nº 11843/2025), e criam selos de incentivo, como o “Contabilista Amigo da Criança, do Adolescente e do Idoso” (Lei Nº 11819/2025). O mesmo número se repete em projetos relacionados à administração pública e finanças, incluindo revisões orçamentárias, estruturação do Executivo e reajustes de servidores.
Em menor número, mas de grande peso simbólico, aparecem propostas ligadas a cidadania e direitos fundamentais (4,6%), como a lei que proíbe discriminação por idade, o etarismo (Lei Nº 11812/2025); a que institui a Política de Enfrentamento da Violência Política contra a Mulher (Lei Nº 11818/2025) e a que veda a nomeação de condenados para cargos públicos (Lei Nº 11813/2025). Fecham a lista normas voltadas à economia local, com estímulo a startups, regras para o comércio de recicláveis e proteção a animais em pet shops.
Ao avaliar o semestre, o presidente da Câmara, vereador Juliano Lopes (Podemos), defendeu o saldo dos trabalhos. Segundo ele, os textos aprovados desde o início da legislatura, em janeiro, produzem resultados concretos na vida dos belo-horizontinos. “Longe de se limitarem a aspectos simbólicos, os projetos aprovados abordam questões estruturais e urgentes da cidade”, afirmou.
Datas comemorativas
No primeiro semestre, os vereadores de Belo Horizonte protocolaram 345 projetos de lei, enquanto o Executivo enviou outras 10 propostas para análise da Câmara Municipal. As pautas de caráter simbólico seguem como maioria, respondendo por 18,9% do total, 67 projetos voltados, principalmente, à criação de datas comemorativas, homenagens ou registros no calendário oficial.
Em seguida, a causa animal aparece como tema mais recorrente entre as propostas em tramitação, com 40 textos (11,3%). As iniciativas vão de medidas de proteção e punição a maus-tratos a restrições ao comércio de animais. A saúde pública também concentra uma fatia relevante da produção legislativa. São 38 projetos (10,7%) que abordam questões como gestão de unidades de atendimento, organização de filas do Sistema Único de Saúde, campanhas de prevenção, entre outros. Na área da educação, 22 projetos (6,2%) tratam de currículo escolar, infraestrutura, programas de apoio a estudantes e medidas de enfrentamento à violência nas escolas.
Outros destaques
Outro destaque do semestre é a presença de propostas de viés ideológico, que espelham a polarização nacional. Embora somem apenas 3,4% do total, costumam dominar debates e gerar embates no plenário. Entre elas estão o PL Nº 11/2025, que propõe restringir a presença de crianças em eventos com nudez ou “conteúdo inapropriado para menores”, mirando, sobretudo, paradas LGBTQIAPN+; o PL nº 41/2025, que proíbe o uso de símbolos cristãos em manifestações que os “ridicularizem”; e o PL nº 162/2025, que pretende impedir professores de emitir “juízo de valor” sobre regimes como comunismo ou fascismo. Projetos do tipo raramente avançam de forma célere, mas garantem visibilidade e mobilizam as bases eleitorais mais engajadas. Em meio a centenas de projetos, um texto em análise na Comissão de Administração Pública e Segurança Pública chama atenção por resgatar uma antiga bandeira dos movimentos populares, a proposta de “Tarifa Zero”. O PL nº 60/2025, assinado por vereadores de diferentes partidos, propõe a gratuidade total no transporte público de Belo Horizonte, tema de alto impacto fiscal, que vem ganhando força no debate popular, mas ainda deve enfrentar uma longa tramitação e discussão técnica na Câmara.
Vereadores criam frente contra projetos “caça-like”
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Em reação ao avanço de propostas de teor moral e ideológico que, segundo parlamentares, servem apenas para gerar engajamento nas redes, um grupo de nove vereadores formou a frente parlamentar “Voz de BH” como alternativa ao que chamaram de “desconexão entre o plenário e os problemas reais da capital”. Segundo os vereadores, o objetivo é fiscalizar mais de perto os gastos públicos, ouvir as demandas das comunidades e priorizar projetos com aplicação prática e impacto direto no cotidiano da população.
LEGISLAÇÃO MUNICIPAL
LEIS SANCIONADAS NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2025
Datas comemorativas e calendário oficial: 15 leis (23,1%)
Políticas sociais, inclusão e saúde: 14 leis (21,5%)
Urbanismo e legislação edilícia: 11 leis (16,9%)
Cultura e reconhecimento: 6 leis (9,2%)
Administração pública e finanças: 6 leis (9,2%)
Nomenclatura de logradouros (homenagens): 5 leis (7,7%)
Cidadania e direitos fundamentais: 3 leis (4,6%)
Economia e desenvolvimento: 3 leis (4,6%)
Outras: 2 leis (3,1%)
CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE
PROJETOS DE LEI APRESENTADOS NO PRIMEIRO SEMESTRE DE 2025
Datas comemorativas e homenagens: 67 projetos (18,9%)
Causa animal: 40 projetos (11,3%)
Saúde pública: 38 projetos (10,7%)
Direitos PCD e inclusão: 34 projetos (9,6%)
Educação: 22 projetos (6,2%)
Administração, orçamento e servidor: 21 projetos (5,9%)
Segurança pública e Guarda Municipal: 19 projetos (5,3%)
Urbanismo, mobilidade e meio ambiente: 18 projetos (5,1%)
Assistência social e população vulnerável: 17 projetos (4,8%)
Cultura e esportes: 14 projetos (3,9%)
Pautas ideológicas e de costume: 12 projetos (3,4%)
Outros: 53 projetos (14,9%)