Ironicamente, a alta dos juros esperada para esta semana é uma das medidas econômicas mais importantes para ajudar o governo Lula neste final de ano. E ela deverá vir sob o comando de Roberto Campos Neto, o ainda presidente do Banco Central, por quem Lula nutre uma antipatia pessoal.
A poucas semanas de deixar o cargo para Gabriel Galípolo, pupilo do presidente já aprovado pelo Congresso, Campos Neto conduzirá a última reunião do ano do comitê que define o tamanho da taxa de juros no país, o Copom. Ele, Galípolo e os demais diretores do BC que integram o comitê terão o desafio de dar uma resposta à altura para tentar reverter a deterioração das expectativas provocadas justamente por Lula.
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A estratégia definida pelo presidente da República de anunciar, no mesmo pacote fiscal, propostas de controle de gastos públicos com a isenção de imposto de renda para a classe média e a alta na tributação dos mais ricos fizeram o dólar disparar, minaram a força do ministro Fernando Haddad (Fazenda) como influenciador interno no governo e, de quebra, ainda trouxeram para a posição de fiel da balança um outro mediador que pode sair caro para o presidente: o Congresso Nacional.
Ao lado de Campos Neto, os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco, também deixarão seus reinados pouco após a virada de ano (eles saem na primeira semana de fevereiro) em grande estilo.
Se o BC terá que mostrar compromisso com o controle da inflação, elevando os juros e sinalizando um ciclo mais apertado na política monetária, Lira e Pacheco terão duas semanas para garantir a aprovação das medidas de controle de gastos que ajudarão a equipe econômica a respirar mais aliviada nas festas de réveillon.
Mas como tudo na vida tem um preço, já foi aberta nos bastidores do poder, em Brasília, a temporada de barganha. Na mira dessas negociações estão: i) liberação de dinheiro do orçamento para emendas parlamentares; ii) a identificação dos autores das emendas de comissão e de bancada, medida que divide o poder de influência no Congresso dos líderes da casa com o Palácio do Planalto e iii) cargos na Esplanada dos Ministérios, diante de uma provável reforma ministerial.
Na semana passada, o governo sinalizou que irá liberar algo próximo a R$ 10 bilhões em emendas parlamentares na tentativa de contornar o mau-humor dos congressistas.
No lado econômico, entre a última reunião do Copom, realizada nos primeiros dias de novembro, e a próxima terça-feira, 10, quando os diretores do BC vão reavaliar o cenário, muita coisa mudou. Entre os analistas financeiros, já há quem projete uma alta de 0,75 ponto percentual na taxa Selic nesta semana, em vez de 0,5. Se isso se confirmar, os juros chegarão a 12% ao ano.
O aperto mais forte na taxa Selic é necessário, de acordo com o mercado financeiro, diante da deterioração das expectativas desde o anúncio do pacote fiscal há cerca de duas semanas. A inflação já está rodando acima do teto da meta de 4,5% para o ano e aponta que há altas generalizadas em vários segmentos. As expectativas para 2025 e 2026 também subiram (4,3% e 3,8%, respectivamente).
A disparada da cotação do dólar que, agora, ronda os R$ 6 deve acentuar ainda as pressões inflacionárias porque leva a aumento de produtos negociados no exterior em moeda estrangeira, como o trigo e insumos agrícolas. Há cerca de um mês, a equipe econômica acreditava que seria possível fechar 2024 com taxa de câmbio mais próxima de R$ 5.
Nesse cenário, até dados positivos tornam-se fonte de preocupação para o Banco Central. A economia está mais aquecida e a taxa de desemprego na mínima histórica (6,2%). Na prática, a combinação de mais renda nas mãos das famílias e produção acelerada é um prato cheio para reajustes de preços.
Um dos setores que têm puxado o desempenho da economia é justamente o de serviços, onde é mais difícil haver substituição e os repasses para os preços são chancelados pelos consumidores com mais facilidade do que os produtos que têm substitutos diretos.
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Por tudo isso, a definição dos diretores do BC neste final de ano será mais desafiadora e analisada com lupa pelo mercado financeiro. A dúvida é se, diante da ausência de um ajuste fiscal mais significativo, o BC usará o instrumento que lhe sobra para sinalizar os rumos do governo Lula nos dois últimos anos de mandato do presidente: os juros. E ainda será Campos Neto, que em junho deste ano Lula classificou como "adversário político e ideológico" do seu modelo de governar, quem estará no comando do gerenciamento dessas expectativas.