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Escritor Albert Camus se impressionou com os contrastes do Brasil

Autor do clássicos "O estrangeiro", "A peste" e "O mito de Sísifo" tem sua monumental biografia, finalmente, lançada no Brasil

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“Camus: uma vida”, a extensa biografia escrita pelo jornalista e escritor francês OlivierTodd, decepciona os leitores brasileiros quando fala da visita de Albert Camus ao país, em 1949. São três míseras páginas entre as 882 da biografia que tratam da viagem do escritor, num momento em que sofria mais intensamente com a tuberculose e não se adaptou ao clima “sufocante”.

Camus esteve duas vezes no continente americano na década de 1940, enviado pelo governo francês. Foi aos Estados Unidos e ao Canadá, entre março e junho de 1946, a convite do antropólogo Claude Lévis-Strauss, à época conselheiro cultural do Ministério do Exterior francês em Nova York.

Em 1949, Camus desceu para a América do Sul durante dois meses, foi recebido como celebridade e fez uma série de conferências. Saiu de Marselha a bordo do navio Campana, em 30 de junho, chegou ao Rio de Janeiro em 15 de julho, esteve no Recife, em Olinda, Salvador, São Paulo e Porto Alegre.

Depois, ainda foi à Argentina, ao Chile e ao Uruguai, entre 10 e 21 de agosto, retornou ao Rio e, em 31 de julho, tomou avião de volta para Paris. As duas viagens de Camus pela América estão relatadas em seus diários sobre as impressões que teve dos seis países e depois incluídas no livro “Diário de viagem”, lançado na França em 1978.

Se Olivier Todd desdenhou da aventura camusiana no Brasil, ela ganhou grande destaque no livro “Camus, o viajante – Antologia dos textos de Albert Camus no Brasil” (editora Record- 2019), organizada pelo jornalista e crítico literário Manuel da Costa Pinto. A obra reúne “O mar muito perto – Diário de bordo” (do livro “O verão”), a seção “América do Sul: Junho a agosto de 1949” (do “Diário de viagem) e o conto “A pedra que cresce” (do livro “O exílio e o reino”). E ainda a conferência “O tempo dos assassinos”, que Camus proferiu nas cidades brasileiras, em que faz contraponto entre o Brasil e a Europa daquela época, logo após a Segunda Guerra Mundial.

O livro ainda apresenta 13 fotos da passagem de Camus por Iguape, cidade do litoral de São Paulo, acompanhado pelo poeta e escritor modernista Oswald de Andrade (1890-1954). Entre 5 e 7 de agosto de 1949, ele foi a uma festa religiosa no Santuário do Senhor Bom Jesus de Iguape, padroeiro do município. Ficou hospedado num quarto do Hospital Feliz Lembrança, asilo hoje em ruínas, porque os hotéis estavam cheios.

Para ler Camus


“O ESTRANGEIRO” (1942) – Principal romance de Albert Camus, essa obra-prima traz o cerne da filosofia do absurdo, a indiferença de um homem diante da vida, da morte da mãe e da sua própria condenação à pena capital por um homicídio banal. Sem religião e sem ideologia, o protagonista Meursault tem a liberdade do seu destino nas mãos.


“A PESTE” (1947) – O mais popular romance de Camus é uma alegoria do nazismo. O médico Bernardo Rieux luta contra a peste bubônica que aniquila a população da cidade de Orã, na Argélia. A indiferença, o individualismo e o negacionismo das autoridades e dos moradores agravam a praga e aumentam as mortes.


“A QUEDA” (1956) – Último livro de ficção lançado por Albert Camus, é um romance-monólogo. O advogado francês Jean-Baptiste Clamence faz “confissão calculada” de sua consciência em um bar de marinheiros, em Amsterdã, na Holanda. Mais um romance filosófico sobre a condição humana. Clamence conta como foi sua vida, do sucesso ao fracasso.


“O mito de Sísifo” (1942) – Ensaio filosófico em que Camus dá interpretação moderna ao Mito de Sísifo, personagem da mitologia grega castigado e condenado por Zeus a empurrar, eternamente, uma pedra grande morro acima. Representa o ser humano em busca de um sentido para a vida sob a opressão de religião e ideologia. “Ou não somos livres e o responsável pelo mal é Deus todo-poderoso, ou somos livres e responsáveis, mas Deus não é todo-poderoso”, diz Camus.


“O HOMEM REVOLTADO” (1951) – Ensaio filosófico que causou banimento de Camus entre os intelectuais franceses, principalmente por Jean-Paul Sartre, por causa das críticas às prisões e aos assassinatos praticados por Stálin, que a esquerda tolerava. Camus tem postura humanista e defende a liberdade e a dignidade do indivíduo contra regimes de qualquer ideologia.


“REFLEXÕES SOBRE A GUILHOTINA” (1957) – Ensaio no qual Camus critica o uso da guilhotina como método de execução, usado na França entre o século 18 e 1977. Ele questiona o poder do Estado para matar e chega, inclusive, a apresentar testes do sofrimento do corpo horas após a execução. “Quando a morte se transforma numa questão estatística e administrativa, alguma coisa não vai bem”, alerta.


“ESTADO DE SÍTIO” (1948) – Uma das quatro peças teatrais de Camus. Trata-se de uma pequena cidade litorânea assolada pela peste e pelo medo. O protagonista, inclusive, se chama Peste. Mais uma alegoria do escritor sobre o totalitarismo vigente na Europa na primeira metade do século 20.


“CAMUS, O VIAJANTE – ANTOLOGIA DOS TEXTOS DE ALBERT CAMUS SOBRE O BRASIL” (2022) – Obra organizada pelo jornalista e crítico Manuel da Costa Pinto com impressões do autor sobre o Brasil a partir de sua visita ao país, em 1949, como palestrante enviado pelo governo francês. Inclui o ótimo conto “A pedra que cresce”, baseado na festa religiosa de Senhor Bom Jesus de Iguape (SP), que Camus presenciou. O conto está incluído no livro “O exílio e o reino” (1957).


“O PRIMEIRO HOMEM” (1994) – Obra póstuma. Manuscritos desse ensaio inacabado foram encontrados na valise de Camus no dia em que ele morreu em acidente de carro, em 4 de janeiro de 1960. Obra semiautobiográfica, fala sobre o menino Jacques Cormery e sua infância na Argélia, a morte do pai e a relação afetiva com a mãe.


“ESCREVA MUITO E SEM MEDO: UMA HISTÓRIA DE AMOR EM CARTAS (1949-1959)/ALBERT CAMUS, MARIA Casarès (2024) – Livro com 1.288 páginas reúne a correspondência entre Albert Camus e a atriz Maria Casarès. Eles foram amantes de longa data até a morte do escritor, em janeiro de 1960, mesmo ele sendo casado com Francine Faure. Nas cartas, Camus também relata suas impresssões da viagem ao Brasil.

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