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Apostas e tributos: o risco de o Estado perder o próprio jogo

A tributação deve ser calibrada, previsível e constitucionalmente segura

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De: VIVIAN MARIA CAXAMBU GRAMINHO - Advogada, mestra e doutora em direito

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As apostas de quota fixa se consolidaram como um dos setores mais dinâmicos da economia digital. O mercado global já movimenta mais de US$ 100 bilhões e pode ultrapassar US$ 280 bilhões até 2035. No Brasil, o avanço foi acelerado pela regulamentação da Lei 14.790/2023, que instituiu regras de compliance, integridade e proteção ao consumidor. Apenas no primeiro semestre deste ano, o setor arrecadou R$ 3,8 bilhões aos cofres públicos.


Mais do que números, esses recursos têm destino concreto e impacto social. Parte significativa da arrecadação é direcionada a políticas públicas essenciais – como o fomento ao esporte, turismo, seguridade social e segurança pública. Em 2025, por exemplo, cerca de R$ 2,1 bilhões oriundos das apostas foram repassados a essas áreas, fortalecendo programas sociais e contribuindo para a manutenção de serviços que chegam diretamente à população. Ou seja, o setor de apostas não representa apenas uma nova frente econômica: ele já atua como um aliado na melhoria de políticas públicas e na geração de benefícios concretos à sociedade brasileira.


Menos de dois anos da promulgação da lei, porém, já está instalada a discussão de elevação das alíquotas, criação de novas contribuições e até de possível cobrança retroativa de tributos de empresas que operavam antes da regulamentação. O movimento acende um sinal de alerta. Sob o argumento da “necessidade fiscal”, o risco é transformar um marco regulatório moderno em um terreno instável, minando a confiança de investidores e o potencial de arrecadação futura.


O aumento da tributação de 12% para 18% sobre a receita bruta – somado à possível criação da CIDE-Bets – ameaça a viabilidade de um setor que ainda busca equilíbrio. Mais grave é a proposta de cobrança retroativa, estimada em R$ 12 bilhões. Além de juridicamente indefensável, ela viola princípios constitucionais da anterioridade e da segurança jurídica. Em um país que historicamente sofre com instabilidade regulatória, tal medida sinaliza incerteza e desestimula investimentos.


A experiência internacional confirma o risco. Países que adotaram políticas fiscais agressivas – como Holanda, Suécia e Alemanha – enfrentaram queda na arrecadação e aumento da participação do mercado ilegal. No Reino Unido, 28% dos apostadores afirmaram que migrariam para plataformas não reguladas caso os impostos subissem. O recado é claro: tributar mal pode significar arrecadar menos.


No Brasil, o setor já convive com uma carga tributária efetiva próxima de 42%. O acréscimo de novos encargos tornaria o ambiente de negócios quase inviável, comprometendo empregos, patrocínios esportivos e investimentos em inovação e segurança. O efeito confiscatório é real: quando o tributo ultrapassa o limite da razoabilidade, destrói a base que deveria sustentar.


É preciso compreender que o desafio não está em arrecadar mais, mas em arrecadar melhor. A tributação deve ser calibrada, previsível e constitucionalmente segura, capaz de incentivar a permanência das empresas no mercado regulado e de garantir receitas estáveis ao Estado.


O Brasil tem diante de si uma escolha decisiva. Pode consolidar um setor legal, competitivo e capaz de financiar políticas públicas – ou repetir o erro de outros países, sufocando o mercado formal e fortalecendo o ilegal. A ânsia arrecadatória pode ser, paradoxalmente, a jogada que faz o Estado perder o próprio jogo.

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