editorial

Combate falido ao crime organizado

Uma cidade sitiada em plena luz do dia, com escolas e empresas fechadas e pessoas em pânico tentando voltar para casa, também padece com a insegurança

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Transformada, na manhã de ontem, em um necrotério a céu aberto, a Praça São Lucas, no Complexo da Penha, zona Oeste do Rio de Janeiro, é prova cabal de que está falida a forma como o Estado combate o crime organizado. O Brasil dormiu, na terça-feira, apreensivo com os registros da anunciada mais letal empreitada das forças de segurança em comunidades fluminenses – até então, eram 64 mortos em mais de 12 horas de confronto. Acordou na quarta-feira estarrecido com imagens irrefutáveis de guerra. Cadáveres enfileirados no asfalto – carregados por familiares que denunciam práticas de execução e tortura – revelaram que a chamada Operação Contenção é, na verdade, a mais letal do país, evidenciando que as urgências das ruas precisam se sobrepor aos embates políticos de palácios e escritórios.

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Espera-se que uma investigação isenta dê respostas à sociedade sobre a polêmica contenção, possibilitando punir culpados e reparar vítimas. Para agora, o Estado avançaria se abrisse mão de picuinhas eleitorais e mergulhasse, de fato, em uma ofensiva estratégica de resgate da segurança pública. Nesse sentido, o governador Cláudio Castro acerta ao reconhecer que o Rio é epicentro de um problema nacional, mas segue preso à lógica simplista do nós contra eles para lidar com a questão.


Senão, o que dizer da postura de delimitar as verdadeiras vítimas da operação? Uma cidade sitiada em plena luz do dia, com escolas e empresas fechadas e pessoas em pânico tentando voltar para casa, também padece com a insegurança. Apostar em pirotecnias declaratórias e desconsiderar perspectivas de outros especialistas, como fez Castro e sua equipe, parece não favorecer a estratégia de “foco em integração” defendida por eles.


Da mesma forma, a decisão da Polícia Federal de descartar a participação na operação precisa ser melhor explicada, e aliados do presidente também devem descer do palanque e se dedicar a medidas que combinem inteligência e eficácia às necessárias ações ostensivas. O PL Antifacção, por exemplo, ainda não foi enviado ao Congresso.


Enquanto políticos e autoridades batem cabeça e narrativas, facções criminosas arquitetam um poderio sem limites. Tratam-se de grupos com tentáculos em diversos setores da economia, com articulações, inclusive, no exterior, e que têm no tráfico de drogas apenas um campo de atuação, como revelou recentemente a bem-sucedida Operação Carbono Oculto – focada na asfixia financeira dessas indústrias do crime.


Em manifesto conjunto, a Fiocruz e dezenas de instituições públicas e entidades civis e comunitárias – entre elas, Instituto Fogo Cruzado, Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Movimento Popular de Favelas – criticaram o que classificam como um “fenômeno multidimensional que há muito adoece nossa cidade, cancela o sonho de estudantes, impede o tratamento de doentes, rouba a tranquilidade das famílias, tira o sustento dos trabalhadores”. A realidade se repete pelo país – levantamento recente do Fórum de Segurança Pública indica que dois em cada 10 brasileiros vivem em áreas com atuação de facções criminosas e milícias – e exige fórmulas atualizadas de enfrentamento.


Há quase 15 anos, ganhou o noticiário internacional a imagem de traficantes na mata fugindo de blindados da Marinha e agentes de segurança que adentravam também no Complexo da Penha para tomar a comunidade. O Estado não se manteve; o crime ganhou corpo, território, poder bélico e, sobretudo, empresarial. Não se pode tentar contê-lo agora com o que já não funcionou quando as facções pareciam menos profissionalizadas.

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