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Clamor dos pobres

O clamor dos pobres é um grito que precisa ser ouvido para produzir sabedoria no coração de quem crê

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A Exortação Apostólica Dilexi Te (Eu te amei), publicação do papa Leão XIV neste Ano Jubilar, é convocação à escuta do clamor dos pobres – remédio para um mundo adoecido, indiferente em relação aos vulneráveis. Considerar o clamor dos pobres permite encontrar respostas para os dilemas da sociedade mundial. Um exercício que pode abrir caminhos novos na configuração do tecido sociopolítico. A sensibilidade diante do clamor dos pobres tem força para reverter a indiferença que adoece e constitui capítulo fundamental para a vivência autêntica da fé. Papa Leão, com seus argumentos e a retomada de lições da Doutrina Social da Igreja desenha caminhos para enfrentar as muitas ousadias escandalosas que maculam cenários da sociedade. O Pontífice ajuda o mundo contemporâneo a se aproximar dos ensinamentos da Igreja capazes de inspirar sempre mais autenticidade e vigor à vivência da fé cristã e ao exercício da cidadania civil.

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Leão XIV evoca a referência exemplar de São Francisco de Assis que provocou um renascimento evangélico dos cristãos e na sociedade do seu tempo, abandonando riquezas e presunções. Um abandono essencial para deixar-se interpelar pela realidade dos que estão à margem da sociedade. Contundente é a afirmação do papa: a opção preferencial pelos pobres gera uma renovação extraordinária tanto na Igreja como na sociedade, na medida em que liberta o ser humano da autorreferencialidade. Escutar o clamor dos pobres é fonte de sabedoria para os cristãos, luz para que a sociedade enxergue a saída da exclusão social. É importante reconhecer que primeiro Deus livra o ser humano da opressão da escravidão, conforme ensina a Bíblia. Deus viu o sofrimento de seu povo e enviou Moisés para libertá-lo, possibilitando a conquista de um novo tempo para todos. Inicialmente Moisés hesitou, mas deixou-se mover pela solicitude de Deus que se compadeceu diante do sofrimento humano. A lição é que não se pode permanecer indiferente ao pobre. Essa indiferença representa um deliberado afastamento do coração de Deus.


O clamor dos pobres é um grito que precisa ser ouvido para produzir sabedoria no coração de quem crê e sensibilidade social para um adequado exercício da cidadania, com aprofundado senso de justiça. Essa sabedoria interpela sociedades, sistemas políticos e econômicos a conhecer os inúmeros rostos dos pobres e da pobreza: desde aqueles que não têm meios de subsistência material, incluindo os marginalizados socialmente, sem voz para fazer valer a sua dignidade. Importa também reconhecer aqueles que sofrem com a pobreza moral, espiritual e cultural. O caminho de erradicação da pobreza que fere a dignidade humana é longo, uma escalada desafiadora, pois as pobrezas vão se multiplicando, com o surgimento de situações ainda mais desafiadoras, conforme alerta o papa Leão XIV. A realidade contemporânea pede ainda mais o reconhecimento de que o compromisso com os pobres é vetor de mudança das mentalidades, com incidências culturais e morais, constituindo um remédio para extirpar a corrupção e tantos outros males que impedem a igualdade social e o respeito à dignidade humana.


O papa Leão adverte sobre uma ilusão comum àqueles que buscam somente uma vida confortável: acreditam que a existência pode ser centrada simplesmente na acumulação de riquezas e no sucesso social a todo custo, mesmo por meio da exploração do semelhante, aproveitando ideais sociais e sistemas sociopolíticos injustos, favoráveis aos mais fortes. O papa, na Exortação Apostólica, lembra que, no atual contexto, onde os pobres são cada vez mais numerosos, paradoxalmente cresce o enriquecimento de elites, que vivem em uma “bolha”, usufruindo de condições demasiadamente confortáveis e luxuosas, quase em um mundo à parte. Nessa “bolha”, os mais ricos permanecem indiferentes em relação aos que sofrem. Uma nova lógica de solidariedade poderá brotar na medida em que o cidadão se deixar incomodar com as pobrezas, sentidas na própria pele pelo caminho da compaixão. Não se pode deixar de ter diante dos próprios olhos os que vivem sem alimento e sem água potável, para não se perder a sensibilidade cidadã e sentir-se responsabilizado pela arquitetura de uma nova ordem social. Não se conseguirá combater a desigualdade social sem a escuta do clamor dos pobres.


Tem razão a Doutrina Social da Igreja ao constatar que regras econômicas foram eficazes para o crescimento, mas não suficientes para o desenvolvimento humano integral. Os planos estratégicos técnicos e políticos não podem prescindir da prática da escuta do clamor dos pobres. A consequência desse distanciamento é a perda da sensibilidade que dá lugar à globalização da indiferença, alimentando a ganância e a mesquinhez. Ora, quando aumentam as riquezas, mas a equidade fica comprometida, surgem novas pobrezas. Na riqueza da interpelação da Exortação Apostólica, ampla e contundente, é preciso ter presente, o tempo todo, que os pobres não existem por acaso ou por um cego e amargo destino. Muito menos é uma escolha daqueles que enfrentam a pobreza. Ouvir o clamor dos pobres é alimentar uma autêntica espiritualidade cristã e fecundar uma cidadania que pode qualificar a sociedade, a partir de solidariedades. Trata-se de um convite para vencer ousadias escandalosas, adotando um remédio que vence a corrupção.


Sensibilizar-se diante do clamor dos pobres não custa somas altas. Pede, simplesmente, a disponibilidade humilde de ouvir esse clamor que está sempre às portas, nas ruas, na própria casa e em todo lugar, apontando um novo caminho, de mais respeito à dignidade humana. O papa Leão XIV orienta: “Se não quisermos sair da corrente viva da Igreja que brota do Evangelho e fecunda cada momento histórico, não podemos esquecer os pobres”. Para fazer brotar a justiça, a sociedade possa escutar sempre e cada vez mais o clamor dos pobres.

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