O desafio das longas filas na saúde
101 hospitais privados e filantrópicos solicitaram a adesão ao programa federal, que corresponde 3% de 3,5 mil instituições de saúde que têm dívidas com União a
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Siga noLançado há pouco mais de 100 dias, no Palácio do Planalto, o programa Agora Tem Especialistas, do governo federal, não é exatamente a menina dos olhos do Ministério da Saúde. Foi criado com o intuito de reduzir o gargalo das filas de espera em postos de saúde, unidades de pronto-atendimento e hospitais da rede pública, além de ser uma tentativa de ampliar o acesso a consultas, exames e cirurgias especializadas no Sistema Único de Saúde (SUS), atuando em toda a rede – pública, filantrópica e privada.
Não há como negar que o esforço de implementar o programa é louvável, já que propõe o credenciamento de clínicas, hospitais filantrópicos e privados para atendimento especializado via SUS em diversas áreas, como oncologia, ginecologia, cardiologia, ortopedia, oftalmologia e otorrinolaringologia. A questão é que, até o início de agosto, após cerca de dois meses e meio de sua implementação, somente 101 hospitais privados e filantrópicos haviam solicitado a adesão ao programa federal, o que corresponde a 3% de 3,5 mil instituições de saúde que têm dívidas com a União.
A intenção é que as unidades particulares atendam pacientes da rede pública em troca de benefícios, como créditos financeiros ou abatimento dessas dívidas. Seria uma troca, já que o montante total de dívidas desses hospitais gira em torno de R$ 34,1 bilhões. Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o governo estabeleceu um teto de R$ 2 bilhões anuais para abatimento via programa. Mas será difícil cumprir a meta, diante da baixa procura. O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, nega o início desastroso da implantação do programa, considerando a adesão “positiva” e reiterando que o projeto tornou-se uma obsessão do presidente Lula.
Fato é que uma pesquisa divulgada pelo Instituto Locomotiva em fevereiro deste ano, chamada A Classe C e a Saúde: os desafios de acesso a exames e consultas, mostra que 94% da população brasileira (da referida classe) concordam com a frase “O tempo de espera para a marcação e realização de consultas e exames no SUS coloca em risco a vida de muitos brasileiros” e 63% afirmam que tiveram problemas de saúde agravados por demora na realização de consultas e exames na rede pública.
Iniciativas como um mutirão nacional, em julho último, envolveu 45 hospitais universitários federais, que realizaram 7.800 atendimentos, dos quais 1 mil cirurgias. Até o fim de 2026, 120 novos equipamentos de alta tecnologia para radioterapia serão entregues aos hospitais do SUS, visando a redução da espera por tratamentos oncológicos, mas ainda são iniciativas pontuais, embora honrosas, em se tratando de um país gigante, com perfis assistenciais totalmente diferentes entre os estados e municípios.
O desafio agora é investir na adesão efetiva de hospitais, além de converter o interesse inicial em serviços, contratos firmados e fluxos de atendimento para os pacientes do SUS. Só assim será possível falar em uma possível redução de filas com atendimento adequado a pacientes da rede pública.