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Avós, afeto e sustento

É por isso que o direito prestigia a relação, garantindo o direito de convivência sempre que ele for benéfico para os netos

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A relação de avosidade é um privilégio, em que duas gerações distantes têm a oportunidade de trocar vivências, experiências e olhares do mundo. Os avós são fontes de memórias afetivas preciosas, regalias e cuidado. Quem já observou a dinâmica de uma criança pequena com seus avós percebe a sinergia de quem ainda não conhece os percalços da vida com quem já sabe como enfrentá-los. É um encontro que não está no ritmo frenético de quem já ou ainda está matando um leão por dia.


As crianças se beneficiam muito desse contato, aprendem, sentem-se amadas. É por isso que o direito prestigia a relação, garantindo o direito de convivência sempre que ele for benéfico para os netos.


Dentro desse contexto de afetividade, tem-se também a composição do sustento. No Brasil é muito comum que os avós ajudem na manutenção dos netos. Nas classes mais pobres, essa ajuda é vital, compondo a renda familiar e permitindo o mínimo existencial. Nas classes mais abastadas, a participação financeira dos avós, em regra, permite uma ascensão no padrão de vida, permitindo, por exemplo, frequência a escolas mais caras, atividades extracurriculares, contratação de babá e viagens dispendiosas.


Mas essa construção de como as rendas se dividem e se conectam depende do cenário familiar.


Nas comunidades periféricas, a troca acontece, em regra, na coabitação. Em um mesmo terreno, moram vários núcleos familiares. Constrói-se no terreno da sogra, na laje do pai. Alguns saem para trabalhar e quem fica olha as crianças. Onde comem três, comem quatro. E, nessa toada, a renda dos avós são essenciais para a manutenção de seus netos.


Nas famílias de classe alta, essa oferta em relação aos netos pode depender da manutenção de relações de casamento ou da satisfação de exigências sociais. E aqui reside uma armadilha em que avós e netos podem se encontrar e que pode colocar em risco a leveza e a relevância dessa relação.


Não é raro que em meu escritório cheguem guardiães de crianças, em regra mães, precisando resolver a pensão alimentícia de seus filhos. Descrevem um padrão de vida elevado, com imóvel de alto luxo na região nobre da cidade, empregada doméstica, plano de saúde de cobertura ampla, escola cara, atividades extracurriculares e frequência no clube tradicional da cidade. As necessidades de uma criança nesse padrão de vida têm custo altíssimo. Elas estão preocupadas, com razão, com a manutenção da vida que os filhos estão habituados, especialmente com saúde e educação.


Ocorre que boa parte desses gastos é custeada pelos avós das crianças. Agora, em que os pais delas estão se separando, como que a gente faz para calcular a pensão?


O direito brasileiro reconhece o instituto dos alimentos avoengos. A expressão é estranha, mas nada mais é que uma pensão a ser paga pelos avós. Acontece que essa pensão é subsidiária e complementar. Ou seja, ela só será fixada em caso de impossibilidade de pensionamento por parte dos pais e de maneira a complementar o sustento dos netos.


Exige-se demonstração de um esgotamento de tentativa de sustento das crianças com as condições de seus próprios pais, o que demanda muito tempo. Enquanto isso, aquele padrão de vida que se pretendia manter já não existe mais. A realidade é que, ainda que exista pensão avoenga, ela não tem a mesma natureza e extensão da pensão dos pais, de maneira que não se pode exigir juridicamente que os avós partilhem com os netos o mesmo padrão de vida.


Por isso, se as crianças dependem do auxílio dos avós para manterem o nível de gastos, é muito importante que haja uma conversa franca dentro dessa família sobre o compromisso que eles têm de manter esse apoio. Eles estão comprometidos com isso ou é um mimo extraordinário? Essa ajuda se mantém mesmo em outras configurações familiares?


E, se você é um avô que ajuda no sustento dos netos, já refletiu sobre a relevância desse auxílio para o padrão de educação e saúde que seu neto desfruta? Esse é um apoio circunstancial ou seu neto pode mesmo contar com ela? Vale a pena ser explícito e honesto sobre isso.


Então, para este dia dos avós (26 de julho) eu desejo que as relações entre avós e netos sejam cada vez mais afetuosas, cuidadosas e recíprocas. Mas espero também que, se além do afeto houver sustento, que ele se dê em bases sólidas e transparentes.


Laura Brito
Advogada especialista em Direito de Família e das Sucessões

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