Uma grande discussão veio à tona, após a divulgação dos dados do relatório do Conselho Federal de Medicina, o qual afirma que sete em cada dez cidades não têm estrutura para receber cursos de medicina no Brasil. A lei do Mais Médicos tem como objetivo central interiorizar mais profissionais em microrregiões de saúde. As faculdades que vão se estabelecer nesses locais devem dar contrapartidas ao Sistema Único de Saúde (SUS) um programa no qual se considere a mão de obra e aprimoramento de recursos de infraestrutura. Somente se salvam estes “lugares” de um SUS escasso por meio de iniciativas do governo, o qual vem seguindo de forma deficitária o seu planejamento, nos últimos anos, ou com parceiros da iniciativa privada, como uma faculdade de medicina.


Esclarecido o primeiro ponto, é primordial reforçar que a qualidade da formação médica no Brasil precisa ser prioridade, em toda e qualquer discussão acerca dos cursos de medicina no país. Mas precisamos olhar e enfrentar este problema, submetendo-nos a um panorama mais amplo de reflexão sobre o tema.


Vejamos o ponto de vista da legislação: a lei do Mais Médicos busca interiorizar os médicos no Brasil para que os espaços de vazios assistenciais sejam ocupados e a população possa ser assistida por profissionais da medicina. De acordo com essa regulamentação, existe uma série de contrapartidas para que este curso exista. Há uma preferência pela chegada destas graduações em arrabaldes distantes, justamente para fixação de mão de obra em municípios que ficam longe dos centros urbanos. Portanto, a maioria destes evidentemente não vai ter uma infraestrutura do SUS previamente adequada para implantar o curso.


A ida do curso de medicina para municípios que ainda não possuem estrutura é fundamental sob os seguintes aspectos: primeiro, para contribuir com a construção deste alicerce do SUS, necessário à população; segundo, para levar àquela região mais mão de obra.


O próprio STF pacificou a implantação dos cursos de medicina. Especificamente, atentando-nos aos privados, o Supremo afirmou que é constitucional este instrumento e o próprio MEC também considera municípios pequenos do interior. Portanto, não há um sistema de saúde que atenda a todos os lugares do país.


Também será considerada a região de saúde onde este município se encontra. Olhar apenas pela perspectiva da cidade é analisar a legislação de maneira limitada. O mesmo ocorre com a estrutura prévia do SUS, abstraí-lo, tirando-o de contexto, é desconsiderar a lei do Mais Médicos e o próprio ministério (seja por via judicial, administrativa ou via edital de chamamento público). Desconsidera-se, assim, também, que este seja um dos intuitos do programa: levar as instituições de ensino para estas regiões e que com as contrapartidas ajudem a melhorar a oferta por este que é um dos direitos básicos da nossa Constituição.


Por fim, é necessário considerar que há um vazio existencial em diversas regiões do Brasil, sobretudo com municípios menores e mais distantes dos grandes centros urbanos e das regiões mais ricas. Porém é preciso ter médicos nessas regiões. Essas instituições cumprem esse papel, movimentando a economia, levando o desenvolvimento, arrecadando impostos para todos esses lugares e, obviamente, favorecendo o maior beneficiário que é a própria população fruidora do sistema de saúde na cidade, usando o atendimento dos médicos lá alocados. Este também pode se beneficiar com este avanço do desenvolvimento sócio-econômico e assistencial que as Instituições de Ensino Superior (IES) levam para estas localidades.


Volto ao início deste artigo e reforço que, em momento algum, a qualidade da formação médica não está em discussão. Em nenhum momento tenho a intenção de diminuí-la, depreciá-la, porém é importante entender que o SUS nestes lugares não chegou de forma satisfatória e provavelmente não chegará e que esta parceria com as IES privadas ou comunitárias (com ou sem fins lucrativos) é uma oportunidade de fixação de mão de obra. Resta lembrar que a legislação pretende considerar o desenvolvimento do SUS não apenas no município que receberá os cursos de medicina, mas também em toda a sua região de saúde.