José Adércio Leite Sampaio,  Doutor em Direito Procurador Regional da República

José Adércio Leite Sampaio, Doutor em Direito Procurador Regional da República

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O que há em comum entre as tragédias ambientais de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul? Aparentemente, pouca coisa.


O rompimento das barragens mineiras que matou pessoas e rios foi o resultado de, no mínimo, imprudência e imperícia de empresas de mineração.


A destruição de vidas, propriedades e ambiente gaúchos foi produto da combinação de fatores climáticos excepcionais, agravados pelas transformações que se abatem sobre clima do planeta.


As semelhanças são maiores do que parecem, todavia.


As tragédias estão unidas por formas de negacionismos. Nega-se à prudência sua capacidade de prevenir que desastres ocorram. Recusa-se ao ambiente a proteção devida.
Afastam-se da ação humana a causa, direta ou mesmo indireta, de as barragens se romperem e de os céus se desmancharem em água, vitimando pessoas, animais e destruindo patrimônios privados e públicos, materiais e imateriais.


O negacionismo em todos os seus jeitos e modos é a fórmula deliberada ou ingênua de apagar as responsabilidades. Aquelas dos agentes privados que exploram as riquezas da natureza; aquelas dos Estados por não lhes coibirem os excessos.


Há quem acredite apenas na capacidade redentora da autorregulação privada, embora não se saiba exatamente onde estivessem esses crédulos, quando as barragens e os céus se liquefizeram.


Os Estados possuem um papel relevante na definição de políticas públicas ambientais, equilibrando o desejo imediato e quase insano de riqueza material com os níveis de suporte dos ecossistemas.


Ao deixarem-nas frouxas, a conta chega em perdas que não se traduzem apenas em cifras e números nem somente ou sequer principalmente àqueles que lhe deram causa.
Antes até se dizia que a fatura ficaria para as próximas gerações. Bem se nota que já começamos todos a pagá-la com juros exorbitantes.


É hora de o Estado brasileiro assumir as suas responsabilidades com adoção de normas ambientais que sejam capazes de aparar os excessos dos intentos meramente econômicos.


O tempo não é de “flexibilizar” a regulação das áreas protegidas nem das licenças ambientais. Tampouco de deixar aos frangalhos os órgãos de fiscalização.


As duas tormentas, de lama e água, parecem gritar o grito dos desesperados. Daqueles que se foram e da natureza que se afogou. Não façamos ouvidos moucos!